sexta-feira, 30 de setembro de 2011
O mercado está condenado
'Em 12 meses, milhões vão sumir.
Isso é só o começo.
O pior risco é não fazer nada. Proteja seus ativos'
Por BARBARA GANCIA FSP 30/09
REPERCUTIU ATÉ no dogão da dona Maria o show que um operador de mercado deu na BBC nesta semana. Chamado a opinar sobre a crise, ele foi tão contundente que fez a entrevistadora admitir:
"O senhor acaba de derrubar o queixo de todos no estúdio".
De fato, o quadro pintado pelo zé-mané foi aterrorizante, um desalento para quem tem ainda alguma ilusão quanto a democracia e o capitalismo. O seu emprego, meu dileto leitor, sua poupança, sua reles existência, aparentemente, nada disso interessa ao sistema financeiro globalizado. Ninguém quer saber, inclusive, do seu voto ou impostos.
Estamos cansados de ouvir essa verdade ser contada pela boca de filósofos como Slavoj Zizek, que vivem de detonar o sistema. Mas quando a crítica vem de dentro apavora um tico a mais.
O operador independente Alessio Rastani (apelido "Ratfuck") foi tão rústico em sua análise sobre a crise na Europa que lembrou Roberto Jefferson quando o deputado apontou o dedo para o então ministro José Dirceu.
O vídeo está aqui, mas não precisa sair correndo para assistir que eu conto tudo. Antes, porém, algumas considerações sobre a motivação do senhor Rastani.
A mim realmente não importa se o operador é ex-funcionário de algum grande fundo, se tomou um chute no fiofó da Goldman Sachs, se agiu movido por ressentimento ou se expôs os fatos em toda a crueza porque a mulher passou a noite com dor de cabeça.
Tem gente dizendo que se trata de mercenário ou impostor. Ora, será que é tão difícil assim aceitar que até um "trader" possa ter alma? Em vez de insultá-lo, eu lhe daria um troféu. Nunca vi usar de tamanha objetividade para descrever situação tão complexa.
Se você também consegue pressentir que os pacotes foram insuficientes, que falta regulamentação, que nada do que estava errado foi corrigido e que poucos controlam toda a flutuação, também saberá apreciar o que ele disse.
Ele abre sentenciando que "O mercado está condenado". A entrevistadora pergunta o que se deve fazer. "Veja, não tenho esse tipo de preocupação", diz. "Sou um operador de mercado, se enxergo uma oportunidade de ganhar dinheiro, corro atrás. Não é problema meu como vão sanear a economia. Pessoalmente, venho sonhando com esta crise há três anos. Vou confessar uma coisa: eu vou para a cama toda noite sonhando com uma nova recessão, com um momento como este".
Não é de morder uma pessoa capaz desta candura elevada? Rastani continua: "Muita gente ganhou com a crise de 29 e isso não é só para uma pequena elite, é para todos. Quando o mercado despenca, quem planejou pode ganhar com estratégias de 'hedging' e investindo em títulos do governo. Daqui a 12 meses, a poupança de milhões de pessoas irá desaparecer. E isso é só o começo. O pior risco que você pode correr hoje é não tomar providências. Proteja seus ativos. Esta crise é como um câncer. Não se deve esperar que o governo resolva. Prepare-se.
Governos não mandam no mundo, quem manda é a Goldman Sachs". E viva a volatilidade! Amigo meu, mestre do universo em pé de igualdade com Gordon Gekko e Sherman McCoy, só ficou decepcionado com essa última parte da fala.
"Teria preferido vê-lo desprezar a Goldman Sachs, não é tudo isso, não", disse-me. "De resto, porém, o camarada não errou". Bora andar de montanha-russa, então!
barbara@uol.com.br
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