terça-feira, 27 de setembro de 2011

Dilma na Europa. Antes que acabe


Clovis Rossi - FSP 27/09

SINAL DOS tempos: na segunda-feira, quando a presidente Dilma Rousseff sentar-se para jantar com a cúpula europeia, em Bruxelas, o complexo de vira-lata, que era uma característica do brasileiro, segundo o teatrólogo Nelson Rodrigues, estará do lado europeu da mesa, tantas são as críticas e exortações ao velho continente para que ponha sob controle sua crise.
Um negociador brasileiro de larga experiência relembra, a respeito, que, em muitos momentos anteriores, os brasileiros tinham muita dificuldade em expor seus pontos de vista, porque eram sempre cobrados para pôr a casa em ordem.
Agora, em recente reunião de um dos mais de 20 diálogos setoriais que mantêm Brasil e União Europeia, foram os brasileiros que sugeriram aos europeus mecanismos de estímulo ao crescimento, visto que a obsessão com os ajustes fiscais está minando as economias de quase toda a Europa.
Pelo que disse na ONU, é razoável supor que a presidente Dilma Rousseff insistirá nesse ponto durante o jantar de segunda-feira, que abre ritualmente o encontro de cúpula entre os dois "parceiros estratégicos", rótulo que se está usando com muita prodigalidade na diplomacia global, mas que, no caso, corresponde, sim, aos fatos.
Na terça, dá-se o encontro propriamente dito, após o que a presidente inaugura o Europália, festival anualmente promovido pela Bélgica que, neste ano, homenageia o Brasil. Trata-se de ampla coleção de eventos culturais, a se desenvolver de outubro a março de 2012.
A visita a Bruxelas, capital informal da Europa, não deixa de ser simbólica a respeito das prioridades da diplomacia brasileira no atual governo: Dilma recebeu o presidente dos Estados Unidos, visitou a China e agora vai à União Europeia. Não por acaso, as três grandes potências globais.
É verdade que, antes de tudo, viajou a Buenos Aires, mas dá a sensação de que foi mais o que os argentinos chamam de "saludo a la bandera". Ou seja, a atenção formal ao vizinho, mas com a certeza de que o Brasil hoje joga em outra divisão. A viagem a Bruxelas quase pode ser enquadrada na categoria "visite a Europa antes que acabe".
É sintomático do mal-estar europeu o título de capa do suplemento econômico do "Monde" ontem: "Schuman, desperte, eles ficaram loucos", apelo desesperado a Robert Schuman, considerado um dos pais da unificação europeia. Continua o título: "A explosão da zona euro não é mais um tabu".
Reforça Andreu Misseu, correspondente de "El País" em Bruxelas: "A falta de solidariedade está apagando a ideia de Europa". Nesse cenário, até um suposto plano grandioso de resgate, anunciado ontem pela BBC, acaba embaçado. A emissora britânica informou que a Europa pretende quadruplicar os recursos para seu fundo de resgate, levando-os a impressionantes € 2 trilhões (um Brasil inteiro), além de permitir que a Grécia dê um calote em metade de sua dívida.
Se esse plano existe de fato e se sobreviver até o início da próxima semana, certamente terá o apoio de Dilma, que não esconde que sua grande preocupação do momento é com a crise cujo epicentro está na Europa, sua próxima escala global.

crossi@uol.com.br

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