sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Pesquisa indica expectativa de uma freada forte da China


Valor 30/09

A maioria dos investidores pelo mundo prevê que o crescimento da China vai desacelerar para menos de metade do ritmo mantido desde que o governo começou a desmantelar a economia comunista de Mao Tsé-tung, três décadas atrás. É o que revela uma pesquisa da agência de notícias Bloomberg.

Entre os entrevistados, 59% disseram que o Produto Interno Bruto (PIB) da China, que cresceu 9,5% no trimestre passado, estará avançando menos de 5% em torno de 2016. Para 42% dos consultados, essa desaceleração ocorrerá dentro de um ano; já 47% afirmaram que esse esfriamento da economia chinesa acontecerá em dois a cinco anos, segundo a sondagem trimestral Bloomberg Global Poll com investidores, analistas e traders em todo o mundo que são assinantes da Bloomberg.

A China, que em meio à crise mundial em 2008-09 registrou a maior queda em suas exportações desde pelo menos 1979, pode não ser capaz de contar com seu comércio exterior em meio a um queda prolongado da demanda na Europa e nos EUA, que agora estão lutando para evitar uma recaída recessiva. O gerenciamento de um declínio econômico deverá recair sobre os próximos líderes do Partido Comunista, pois o presidente, Hu Jintao, e o premiê, Wen Jiabao, iniciarão no ano que vem a transição para a transferência do poder no país.

Se não estivermos comprando coisas, eles não as estarão produzindo", disse Charles Doraine, executivo-chefe da Doraine Wealth Management, do Texas, um dos entrevistados na pesquisa que ouviu 1.031 investidores, analistas e traders em 26 de setembro. A margem de erro de pesquisa é de 3,1 pontos, para mais ou para menos.

Jerome Selle, diretor de investimentos da MW Gestion, de Paris, citou uma potencial bolha imobiliária chinesa e inflação elevada, juntamente com o enfraquecimento das economias americana e europeia, como sinais de alerta para os chineses.

Mesmo assim, para muitos investidores, a perspectiva de curto prazo permanece positiva. Instados a identificar o mercado que oferece os melhores retornos nos próximos 12 meses, 23% escolheram a China, que perdeu apenas para os 30% que escolheram os EUA. O índice Shanghai Composite de ações está em baixa de 16%, neste ano, em comparação com quedas de 8,5% no índice Standard & Poors 500 e de 12,2% no índice MSCI World. O Shanghai Composite recuou 1,1%, hoje.

Desde que Deng Xiaoping iniciou a transição para políticas de livre mercado, em 1979, a China vem crescendo a uma taxa média anual de 10%. Essa transformação econômica tirou mais de 600 milhões de pessoas da pobreza, fez da China o maior exportador do mundo e consolidou a hegemonia do Partido Comunista no poder.

Agora, quatro anos após o início de uma crise financeira desencadeada pelo colapso de títulos lastreados no mercado habitacional americano, alguns investidores estão começando a duvidar da capacidade de resistência da China. Investidores disseram que a economia chinesa está se "deteriorando", em vez de "melhorando", segundo uma proporção de quase três para um: 38% contra 13%. Mas 47% dos entrevistados consideraram a economia chinesa como "estável".

As expectativas dos investidores para a segunda maior economia do mundo divergem da visão de economistas chineses, inclusive de profissionais da HSBC Holdings, Nomura Holdings, Capital Economics e do Conselho de Estado, equivalente a um gabinete ministerial. Lu Zhongyuan, vice-diretor do Centro de Pesquisas de Desenvolvimento do Conselho de Estado, disse em entrevista coletiva ontem, em Pequim que o crescimento nos próximos cinco anos provavelmente superará 8%.

Os estatísticos chineses publicam dados trimestrais de PIB antes das agências correspondentes em outros países, como EUA, Alemanha e Japão, e alguns analistas têm questionado sua precisão. Um candidato à sucessão de Wen, o vice-premiê Li Keqiang, considera que os números do PIB não são confiáveis, segundo um despacho diplomático americano de 2007 vazado pelo site Wikileaks.

"Tentar avaliar a China é muito semelhante a tentar compreender o balanço de um grande banco, como o Citigroup", afirmou Andrew Paolillo, gerente de portfólio da Rocky Hill Advisors, de Massachusetts, nos EUA. "É uma caixa tão preta que, de fora, não existe maneira possível de você poder ver o que há realmente lá dentro".

O setor minerador de carvão chinês é um barômetro do acúmulo de sinais de esfriamento econômico, disse Michael Shamosh, diretor de investimentos da Capital Markets Corby, de Boston. As ações da Yanzhou Coal Mining, quarta maior produtora de combustíveis chinesa, caíram cerca de 46% desde o pico em 31 de maio, em negócios na bolsa de Hong Kong.

"Alguma coisa não está batendo", disse Shamosh. "Nada é mais importante para a China do que o carvão." Ele disse que um declínio no preço do cobre, em queda de quase 25% desde 1º de agosto, é outro indicador de desaceleração, porque a urbanização e o boom imobiliário local tornaram os chineses os maiores consumidores desse metal em todo o mundo.

Doraine concordou com a afirmação, dizendo: "O preço das matérias-primas está caindo. Significa a China não as está comprando".

As autoridades chinesas estão tentando mudar a economia, aproximando-a de um modelo mais centrado no consumo interno, depois que um congelamento do crédito mundial contribuiu para uma queda de cerca de US$ 230 bilhões em exportações do país em 2009, o maior desde que o Escritório Nacional de Estatísticas começou a compilar os dados, em 1979.

"O motor de crescimento econômico chinês necessita de uma regulagem", disse Robert Zoellick, o presidente do Banco Mundial, em coletiva de imprensa em Pequim, em 5 de setembro. "É difícil, para mim, acreditar que uma dependência contínua de crescimento puxado por exportações e investimentos dará certo para a China nos próximos 10 anos".

Os investidores americanos revelaram-se mais pessimistas quanto às perspectivas para a China do que seus colegas na Europa e na Ásia. Os EUA são a única região onde mais investidores descreveram a economia chinesa como "em deterioração" do que "estabilizada", e 21% dos americanos entrevistados disseram que a China oferecerá dos piores retornos a investimentos nos próximos 12 meses, perdendo apenas para a União Europeia.

Os entrevistados conservam, no entanto, a sua confiança na capacidade da liderança chinesa de enfrentar as crescentes dificuldades econômicas.

O sucessor do presidente Hu deverá ser escolhido durante o congresso de líderes do Partido Comunista no fim de 2012. Hu e Wen deixarão seus cargos de governo em março de 2013.

Todd Martin, estrategista de mercado acionário asiático no Societe Generale Asia, em Hong Kong, elogia o governo da China por sua disposição no combate à inflação e à bolha imobiliária. Os preços ao consumidor subiram 6,2% em agosto (no acumulado de doze meses), desacelerando em comparação ao aumento de 6,5% em julho.

"Enquanto a China estiver disposta a reformar-se e adaptar-se, seu padrão de vida e as oportunidades de investir e obter excelente retornos no país serão enormes", afirmou Martin.

Nos últimos 20 anos, a taxa de crescimento chinesa mais baixa foi de 6%, no quarto trimestre de 1999, em meio aos efeitos da crise financeira asiática de 1997-1998.

Um "pouso brusco", equivalente a menos de 5% de crescimento, do país mais populoso do mundo, seria "desastrosa" para a economia mundial, disse Qu Hongbin, economista do HSBC em Hong Kong. O país não seria capaz de criar empregos suficientes para as pessoas que chegam ao mercado de trabalho, o que causaria um "grave problema social", disse. "Eu preferiria apostar no fim do mundo para daqui a cinco anos do que arriscar que o crescimento chinês cairá para 5%."

Nem todos os economistas dizem que um crescimento de 5% é mau para a China. Uma transição bem sucedida para um crescimento econômico puxado por gastos domésticos reduziria a chance de aumento do desemprego e de endividamento excessivo para bancar investimentos, segundo Michael Pettis, professor de finanças da Universidade de Pequim.

"A China pode tolerar um crescimento bem menor, se mudar o seu modelo", disse Pettis.

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