quarta-feira, 30 de novembro de 2011

O fundamental


Por Antonio Delfim Netto

Grupos não pequenos de estudiosos insistem em atribuir a crise a uma organização social misteriosa à qual dão o nome genérico de "capitalismo", codinome da organização da atividade econômica em torno dos "mercados", instituição que os homens "descobriram" para coordenar a atividade de consumir bens e serviços e, ao mesmo tempo, estimulá-los a produzir de forma relativamente eficiente e com maior liberdade individual.

É preciso reconhecer que: 1) os mercados são meros instrumentos alocativos que tentam compatibilizar os interesses dos indivíduos no seu duplo papel; 2) obviamente, não há simetria de poder entre esses papéis; e 3) eles (os mercados) não podem funcionar (ou mesmo existir!) sem um Estado para regulá-los.

Essa economia de mercado não foi inventada. Há claras evidências de que os mercados existem desde a velha Mesopotâmia (500 anos antes de Cristo). Foi sendo "descoberta" pelos próprios homens na sua atividade prática de buscar instituições que lhes permitissem facilitar a sobrevivência material e a possibilidade de combiná-la com sua eterna busca de liberdade de iniciativa. Ela não é nem perfeita nem imortal. A grande esperança é que a ação do Estado que garante a sua funcionalidade, possa minorar seus defeitos com as políticas econômica (a flutuação) e social (a desigualdade).

A ideia que os mercados têm a capacidade de autocorrigir-se e que os resultados da distribuição de seus benefícios são "justos" ou "merecidos" - e que, portanto, dispensam a ação do Estado - é absurda. Tão absurda quanto a ideia que os problemas que estamos vivendo se devem apenas a eles, sem nenhuma cumplicidade do Estado.

Já passou da hora de os economistas livrarem-se de umas ingenuidades. A primeira é que Deus foi bom com eles deixando-lhes como objeto de estudo um mundo, cuja ordem poderia ser descoberta, como, por exemplo, o movimento dos astros. A segunda é o reconhecimento que, por mais importante que seja o papel do Estado, o poder incumbente está longe de ser onisciente e, logo, não precisa ser onipresente e, muito menos, pretender a onipotência!

A história nos ensinou, e a experiência atual confirma, que o Estado precisa ser fiscalmente responsável! Não é preciso ser economista para entender tal "conta de padaria". A receita pública não pode ser, permanentemente, maior do que a despesa pública, não importa a "qualidade" ou a "necessidade" do gasto.

Se ele é imperioso e permanente, só há três formas de atendê-lo: 1) aumentando a eficiência do governo; 2) cortando despesa menos prioritária; ou 3) aumentando os impostos. É uma maldição aritmética desagradável que a relação dívida pública/PIB só possa ser estabilizada num nível cujo financiamento possa ser feito, permanentemente, com uma taxa de juros real menor do que a taxa de crescimento real do PIB.

Parece razoável concluir, portanto, que o que precisa ser superado é a irresponsabilidade fiscal dos Estados e a sua incompetência regulatória. Vivemos, basicamente, uma manifestação de Estados pouco cuidadosos fiscalmente e impotentes diante do poder econômico dos interesses financeiros. A crise de 2007/09, que se recusa a terminar, é a testemunha da tendência do setor financeiro de servir-se do setor real e de sua capacidade de apropriar-se do poder incumbente.

Os "indignados" sugerem trazer de volta ideias de cérebros peregrinos, que "inventaram" outros mecanismos de organização social. Os mesmos que rechearam de tragédias o século XX. É preciso insistir que, até agora, o mercado como instrumento alocativo relativamente eficiente não encontrou nenhum substituto, como mostram o fracasso soviético e o sucesso chinês.

A crise americana é menos grave do que a da Eurolândia, mas tem pouca probabilidade de terminar antes da eleição de novembro de 2012. E depois? Depois, valha-nos Deus se os intelectuais republicanos vencerem a batalha eleitoral! É uma pena. Os EUA têm tudo para sair mais depressa da crise. Faltam-lhes apenas uma liderança que reconstrua a confiança da sociedade.

Na Eurolândia, a questão é mais complicada. Ela tem, na verdade, quatro problemas: 1) um desalinhamento das moedas dentro do euro, que causa resultados assimétricos nos balanços de pagamentos; 2) um descontrole dos déficits públicos; 3) uma perspectiva de crise bancária; e 4) falta-lhe um Banco Central autônomo, que seja, de fato, o emprestador de última instância e possa organizar as dívidas dos países.

O jogo dialético civilizatório (apoiado no sufrágio universal) entre o mercado e a urna não é uma linha reta: pode sofrer graves e custosos desvios. O fato fundamental é que ele não resiste à irresponsabilidade fiscal. Quando essa leva as lideranças políticas à completa predominância do curto prazo sobre o longo, aproveitando-se de situações econômicas passageiras favoráveis para permanecer no poder, o mercado (isso é, a realidade fática) acaba cobrando o seu preço.

O Brasil pagou tal preço no passado. A presidente deve ser fortemente apoiada quando corta na carne o Executivo e pede moderação ao Legislativo, ao Judiciário e aos sindicatos. Nunca a solidez fiscal foi tão necessária para proteger-nos da crise mundial, que está longe de terminar. É por isso que a DRU deve ser aprovada.

Antonio Delfim Netto é professor emérito da FEA-USP, ex-ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento.

Indicadores de endividamento soberano: para onde olhar?


Por Frederico Pechir e Vinicius Ratton Brandi - Valor 30/11

O momento é de grande expectativa e volatilidade nos mercados internacionais. A atenção do planeta concentra-se na zona do euro e desdobramentos da profunda crise que afeta a região. Embora ainda seja um desafio desvendar os mecanismos responsáveis pelo fenômeno, um dos fatores-chave para sua explicação é o alto endividamento de alguns países europeus.

A capacidade de endividamento é essencial para que um governo possa desempenhar atividades que demandem recursos superiores a sua capacidade de arrecadação ou em situações que envolvam um mero descasamento de prazos entre receita e despesa governamental. No entanto, o aumento contínuo do endividamento não deve ser entendido como possibilidade sustentável. É preciso encontrar um equilíbrio entre as necessidades do país e a capacidade para honrar suas obrigações.

Ao tratarmos da situação brasileira, normalmente nos referimos à relação entre dívida e produto, analisando aspectos como o seu nível e trajetória. Trata-se do indicador de solvência mais usual de um país. Uma interpretação simples e direta nos diria que determinada nação com relação dívida/Produto Interno Bruto (PIB) pouco abaixo de 40%, caso do Brasil, tem mais probabilidade de conseguir honrar suas obrigações do que um país com relação na casa dos 120%, caso da Itália.

Essa conclusão, porém, está longe de ser precisa. Em primeiro lugar, devemos saber que é praticamente impossível construir um indicador suficiente para se mensurar a capacidade de pagamento de um país. A relação dívida/PIB utiliza a informação relativa ao montante da dívida, mas ignora seu prazo médio e a magnitude dos seus serviços, por exemplo, que são igualmente importantes para se avaliar os riscos correspondentes.

Além disso, há que se levar em consideração se a comparação se baseia nos mesmos indicadores. A relação dívida/PIB do Brasil refere-se, mais comumente, ao quociente entre a dívida líquida do setor público e o produto interno bruto do país. Já no caso da Itália, como em diversos outros países, o dado utilizado é geralmente o de endividamento bruto. Portanto, as relações citadas anteriormente para ambos os países referem-se a conceitos distintos. Enquanto o endividamento bruto se refere ao estoque de dívida do governo, o conceito líquido é obtido pela diferença entre a dívida bruta e os ativos financeiros que o governo detém.

Diante disso, algumas questões se impõem no debate: afinal, qual dos dois indicadores deve ser utilizado? Essa distinção é de fato relevante?

Começando pela segunda pergunta, vale observar o que ocorreu no Brasil entre janeiro de 2007 e junho de 2011, período no qual a relação dívida líquida/PIB caiu 12,4% (5,7 pontos percentuais), enquanto a dívida bruta/PIB foi reduzida em apenas 1,9% (1,1 ponto percentual). A depender do indicador observado, pode-se interpretar uma melhora significativa na situação fiscal brasileira ou que ela se manteve praticamente estável. Fica evidente, portanto, a relevância da diferenciação entre os indicadores, fato que muitas vezes é negligenciado em análises mais superficiais.

Resta saber, agora, qual deles é o mais apropriado para se avaliar o endividamento público.

Quando governos possuem montantes significativos de ativos, é de se esperar que estes sejam considerados em contrapartida ao saldo da dívida. No entanto, há que se questionar quais ativos devem entrar na avaliação e por qual preço. O risco associado aos ativos pode ser elevado e nem sempre isso é considerado. Outro ponto relevante diz respeito à correlação entre esses ativos e a capacidade de pagamento do país. Os ativos que contribuem de fato para a redução do risco de inadimplência são aqueles com baixa correlação, que não se desvalorizarão em um eventual momento de dificuldade financeira do país.

Por outro lado, vale lembrar que as necessidades de refinanciamento do governo, de rolagem da dívida, têm por base a dívida bruta. Assim, em termos de fluxo de caixa, o que importa é o conceito bruto, uma vez que os pagamentos devidos estão referenciados no montante total do passivo, sem qualquer dedução associada aos ativos.

No caso brasileiro, a diferença de indicadores tem se situado entre 15 e 20 pontos percentuais. Trata-se de uma diferença considerável e que pode ser explicada, basicamente, pelo expressivo crescimento de nossas reservas internacionais e pelos empréstimos concedidos pelo Tesouro Nacional ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) nos últimos três anos.

As reservas internacionais do Brasil podem ser consideradas como ativo de elevadas qualidade e liquidez, haja vista a política conservadora de aplicação por parte do Banco Central. No caso do BNDES, cremos que a avaliação se torna mais complexa. Os empréstimos concedidos pelo Tesouro, da ordem de R$ 207 bilhões somente entre 2008 e 2010, considerando recursos já repassados, devem ser pagos pela instituição de fomento, com base, principalmente, na performance de sua carteira de empréstimos. Nesse caso, é importante que a análise se estenda para o acompanhamento das finanças do próprio BNDES. Alguns podem dizer que o risco atual é baixo, mas jamais podem negligenciá-lo.

Concluindo, não há como decidir por um critério excluindo-se o outro. Ambos revelam informações distintas e que devem ser consideradas em qualquer análise mais rigorosa sobre a sustentabilidade de uma dívida soberana. O que se deve ressaltar é que a análise da dívida líquida não pode se dissociar de uma avaliação complementar sobre os ativos responsáveis por sua redução em comparação com o indicador bruto.

Frederico Pechir Gomes é economista e professor de Finanças.

Vinicius Ratton Brandi é professor de Finanças do Ibmec

A miséria do "novo desenvolvimentismo"




Por José Luís Fiori - Valor 30/11

O capitalismo só triunfa quando se identifica com o estado, quando é o estado". Fernand Braudel, "O Tempo do Mundo", Editora Martins Fontes, SP, p: 34.

O "debate desenvolvimentista" latino-americano não teria nenhuma especificidade se tivesse se reduzido à uma discussão macroeconômica entre "ortodoxos", neo-clássicos ou liberais, e "heterodoxos", keynesianos ou estruturalistas. Na verdade, ele não teria existido se não fosse por causa do Estado, e da discussão sobre a eficácia ou não da intervenção estatal para acelerar o crescimento econômico, por cima das "leis do mercado". Até porque, na América Latina como na Ásia, os governos desenvolvimentistas sempre utilizaram políticas ortodoxas, segundo a ocasião e as circunstâncias, e o inverso também se pode dizer de muitos governos europeus ou norte-americanos ultra-liberais ou conservadores que utilizaram em muitos casos, políticas econômicas de corte keynesiano ou heterodoxo. O pivô de toda a discussão e o grande pomo da discórdia sempre foi o Estado e a definição do seu papel no processo do desenvolvimento econômico.

Apesar disto, depois de mais de meio século de discussão, o balanço teórico é decepcionante. De uma forma ou outra a "questão do Estado" sempre esteve presente, nos dois lados desta disputa, que acabou sendo mais ideológica do que teórica. Mas o seu conceito foi sempre impreciso, atemporal e ahistórico, uma espécie de "ente" lógico e funcional criado intelectualmente para resolver problemas de crescimento ou de regulação econômica. Desenvolvimentistas e liberais sempre compartilharam a crença no poder demiúrgico do Estado, como criador ou destruidor da boa ordem econômica, mas atuando em todos os casos, como um agente externo à atividade econômica.

Um agente racional, funcional e homogêneo, capaz de construir instituições e formular planos de curto e longo prazo orientados por uma idealização do modelo dos "capitalismos tardios" ou do estado e desenvolvimento anglo-saxão. E todos olhavam negativamente para os processos de monopolização e de associação do poder com o capital, que eram vistos como desvios graves de um "tipo ideal" de mercado competitivo que estava por trás da visão teórico dos desenvolvimentistas tanto quanto dos liberais. Além disso, todos trataram os Estados latino-americanos como se fossem iguais e não fizessem parte de um sistema regional e internacional único, desigual, hierarquizado, competitivo e em permanente processo de transformação. E mesmo quando os desenvolvimentistas falaram de Estados centrais e periféricos, e de Estados dependentes, falavam sobretudo de sistema econômico mundial que tinha um formato bipolar relativamente estático, onde as lutas de poder entre os Estados e as nações ocupavam um lugar bastante secundário.

No fim do século XX, a agenda neoliberal reforçou um viés da discussão que já vinha crescendo desde o período desenvolvimentista: o deslocamento do debate para o campo da macroeconomia. Como volta a acontecer com o chamado "neo-desenvolvimentismo" que se propõe inovar e construir uma terceira via (uma vez mais), "entre o populismo e a ortodoxia". Como se tratasse de uma gangorra que ora aponta para o fortalecimento do mercado, ora para o fortalecimento do Estado.

Na prática, o "neo-desenvolvimentista" acaba repetindo os mesmos erros teóricos do passado e propondo um conjunto de medidas ainda mais vagas e gelatinosas do que já havia sido a ideologia nacional-desenvolvimentista dos anos 50. Passado a limpo, trata-se de um pastiche de propostas macroeconômicas absolutamente ecléticas, e que se propõem fortalecer, simultaneamente, o Estado e o mercado; a centralização e a descentralização; a concorrência e os grandes "campeões nacionais"; o público e o privado; a política industrial e a abertura; e uma política fiscal e monetária, que seja ao mesmo tempo ativa e austera. E finalmente, com relação ao papel do estado, o "neo-desenvolvimentismo" propõe que ele seja recuperado e fortalecido mas não esclarece em nome de quem, para quem e para quê, deixando de lado a questão central do poder, e dos interesses contraditórios das classes e das nações.

Neste sentido, fica ainda mais claro que o desenvolvimentismo latino-americano sempre teve um parentesco maior com o keynesianismo e com "economia do desenvolvimento" anglo-saxônica, do que com o nacionalismo econômico e o anti-imperialismo, que são a mola mestra do desenvolvimento asiático. E que, além disto, os desenvolvimentistas latino-americanos sempre compartilharam com os liberais a concepção econômica do Estado do paradigma comum da economia política clássica, marxista e neo-clássica. Esse paradoxo explica, aliás, a facilidade teórica com que se pode passar de um lado para o outro, dentro do paradigma líbero-desenvolvimentista, sem que de fato se tenha saído do mesmo lugar..

José Luís Fiori é professor titular do Programa de Pós-Graduação em Economia Política Internacional da UFRJ, e autor do livro "O Poder Global", da Editora Boitempo, 2007.

O que o FMI deveria dizer à Europa


Por Martin Wolf - Valor 30/11

O Fundo Monetário Internacional (FMI) pode salvar a região do euro? Não, mas pode ajudar. O mundo, cujos interesses são representados pelo FMI, tem interesses em jogo e isso dá ao fundo o direito de agir. A questão é como.

O mundo chegou a um estágio novo e potencialmente ainda mais devastador que a crise que emergiu nos países avançados no verão setentrional de 2007. Seu epicentro é a região do euro. Os líderes da região, pouco dispostos a concentrar-se no paciente gravemente doente à sua frente, gastam seu tempo elaborando um regime de exercícios para que ele nunca volte a ter outro ataque cardíaco. É uma atividade inócua.

Na visão de muitas autoridades fora de região, "eles simplesmente não estão entendendo". Seus membros, principalmente a Alemanha, o agente mais importante, parecem paralisados pela política doméstica. Isso não é surpreendente, já que a política continua sendo algo nacional. Também sugere, no entanto, que o projeto, na melhor hipótese, foi prematuro e, na pior, impraticável. O panorama econômico mais recente da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) traça um quadro sombrio. Mesmo se o pior for evitado, prevê-se que a economia da região ficará estagnada em 2012. A organização, contudo, avisa que "persistem sérios riscos de queda". Além disso, "um grande evento negativo (...) muito provavelmente jogaria a área da OCDE como um todo em uma recessão, com declínios acentuados nos EUA e Japão e recessão profunda e prolongada na área do euro". Até os mercados emergentes sofreriam.

Até que ponto a situação pode ficar ruim? A OCDE explora um cenário negativo que se inicia a partir de um calote soberano desordenado na região do euro. Os resultados de tal evento são imprevisíveis, mas o calote de um país significativamente avançado provavelmente seria um fortíssimo golpe à confiança. Os efeitos adversos seriam sentidos diretamente - e por meio de contágio - tanto na esfera soberana como nos mercados e nas instituições financeiras. Outros países poderiam ser afetados, diretamente, pela necessidade de resgate de seus bancos. À medida que as economias se enfraquecessem, as posições fiscais ficariam sob pressão ainda maior em todos os lugares Poderia surgir uma espiral negativa viciosa na confiança e atividade, com resultados que iriam bem além da própria região do euro.

Um calote soberano não seria necessariamente seguido por uma saída da região do euro, mas tal resultado não poderia ser descartado. A OCDE vale-se de linguagem apocalíptica: "[A] repercussão política seria dramática e as pressões para uma saída da região do euro poderiam ser intensas [...] Tais turbulências na Europa, com destruição maciça de riqueza, falências e o colapso da confiança na integração e cooperação europeia muito provavelmente resultariam em uma depressão profunda tanto nos países que saíssem como nos que ficassem na área do euro, assim como na economia mundial."

Então, o que fazer?

Primeiro, precisa-se de um compromisso confiável de interrupção do contágio, para países, bancos e mercados. Uma possibilidade seria garantir financiamento para a rolagem de dívidas públicas e déficits fiscais da Itália, Espanha e Bélgica para 2012 e 2013. Isso custaria até €1 trilhão, embora mesmo essa quantia pudesse ser insuficiente para interromper o contágio, dada sua atual extensão. Os recursos necessários poderiam vir da alavancagem do Fundo Europeu de Estabilização Financeira (EFSF, na sigla em inglês) ou vir do Banco Central Europeu (BCE) ou de ambos, com o primeiro assumindo o risco de prejuízo e a autoridade monetária oferecendo liquidez. No longo prazo, um eurobônus condicional poderia ser uma resposta viável, como John Muelbauer, do Nuffield College, Oxford, argumentou.

Segundo, a região do euro precisa ter políticas de ajuste e de crescimento econômico. Além disso, elas não podem ser baseadas apenas no lado da oferta. A região do euro sofre hoje, claramente, de demanda agregada deficiente. E, além disso, os países mais vulneráveis serão incapazes de recuperar-se sem restaurar sua competitividade externa. Sem isso, estão destinados a uma espiral descendente de austeridade fiscal, enfraquecimento da demanda, aumento no desemprego, resultados fiscais fracos e, então, mais austeridade fiscal. Nos anos anteriores à crise, os superávits financeiros das famílias da região do euro foram absorvidos pelos déficits não financeiros das empresas e, em menor grau, pelos governos. Depois da crise, os déficits das empresas desapareceram, deixando sobre os governos o fardo de sustentar a demanda. Para que os déficits fiscais desapareçam, as famílias e empresas precisam gastar mais. A política econômica precisa contribuir para que isso ocorra.

Terceiro, a região do euro também precisa de reformas de longo prazo para resolver seu verdadeiro ponto fraco, mas isso fracassará se a Alemanha insistir que a disciplina fiscal é tudo o que importa. Não foi a indisciplina fiscal o que causou a crise. A indisciplina dos setores privado e financeiro, incluindo as instituições de crédito dos países centrais, foi ainda mais relevante. A confiança retornaria, se a região do euro adotasse reformas para funcionar bem melhor no futuro, em vez de continuar como se fosse uma máquina de gerar insolvências financeiras e fiscais nos países mais enfraquecidos.

Que papel o FMI pode desempenhar? Nada muito grande. Carece do poder de fogo necessário: seus recursos disponíveis totais não comprometidos são de apenas US$ 440 bilhões. Certamente, poderia levantar mais dinheiro de países externos interessados. Não pode ter a esperança, entretanto, de ter como compensar a relutância dos principais atores na região do euro em fornecer o apoio necessário. Mesmo se tivesse os recursos, programas voltados a países individualmente certamente fracassariam. O único programa que faria sentido seria um para toda a região do euro, já que os programas para países problemáticos teriam de incluir perspectivas razoáveis de maior demanda agregada na região do euro. Sem isso, há poucas chances de sucesso, por exemplo, na Itália ou Espanha. A Irlanda, por ser uma economia pequena e aberta, poderia ajustar-se deslocando a produção comercializável para outros lugares, quando necessário. Se a Itália e Espanha tentassem fazer isso, estariam empenhando-se em esforços custosos e provavelmente infrutíferos de "empobrecer os vizinhos": custosos, porque a principal forma de fazê-lo seria derrubar os salários por meio de desemprego ainda maior; e infrutífero, porque a vantagem competitiva da Alemanha é muito forte.

Então, como o FMI poderia ajudar? Chegou a impiedosa hora de contar a verdade, como a chamou John Maynard Keynes. E qual é a verdade? É que a região do euro tem de escolher entre a alternativa ruim e a calamitosa. A ruim é adotar políticas radicais para promover ajustes, enquanto impede uma onda de reestruturações de dívidas soberanas, crises financeiras e verdadeiras depressões. A calamitosa é essa depressão, paralela ao desmembramento do projeto do euro. O FMI poderia falar em nome dos interesses do mundo no cenário menos ruim. Só a região do euro pode fazer a escolha. (Tradução de Sabino Ahumada)

Martin Wolf é editor e principal comentarista econômico do FT.

Cenários de contágio da crise no Brasil



Por Cristiano Romero - Valor 30/11

Há pelo menos dois canais de transmissão que, diante de um agravamento da crise financeira internacional, poderão afetar a economia brasileira com mais força: a reversão dos fluxos de capitais, com impacto negativo na oferta de crédito; e a piora dos termos de troca, isto é, da relação entre os preços das exportações e os das importações. Tendo sido um dos maiores beneficiários tanto da liquidez internacional quanto do comércio exterior nos anos recentes, o Brasil tende a ser fortemente afetado pela crise que se anuncia.

Se por um lado apresenta vulnerabilidades, por outro o Brasil tem amplo espaço para reagir. Dispõe de posição fiscal confortável; colchão de liquidez (volume de depósitos compulsórios no Banco Central) superior a R$ 400 bilhões; reservas cambiais de US$ 350 bilhões; espaço para reduzir juros.

O economista Tony Volpon, da Nomura Securities, identifica dois tipos possíveis de choque: um em forma de V, em que a situação piora, mas melhora rapidamente devido a uma reação agressiva por parte do governo; e outro em forma de L, em que, por causa de fatores estruturais (por exemplo: restrição fiscal ou monetária), não há melhora imediata nos fatores exógenos que impulsionam a crise.

Volpon batizou o primeiro tipo de choque de "quick and short" (rápido e curto) e o segundo, de "slow burn" (queima lenta). Para estimar seus efeitos, ele desenvolveu uma versão do modelo semiestrutural da economia brasileira, recentemente publicado pelo Banco Central (BC), modificando-o para introduzir variáveis exógenas.

As variáveis escolhidas foram: o VIX, índice de volatilidade do indicador S&P 500, também conhecido como "índice do medo" ou "medidor do medo", por refletir expectativas do mercado de ações para os 30 dias seguintes; os índices CRB metal e CRB alimentos, que refletem a variação dos preços de commodities; o índice S&P 500; e o nível dos CDS (Credit Default Swap) de cinco anos do Brasil. Os indicadores permitem simular os efeitos de quaisquer choques globais e capturar os mecanismos de transmissão (comércio, finanças, confiança dos empresários) que eles podem ter sobre o PIB brasileiro.

O economista da Nomura está entre os que acreditam que o BC, ao começar a reduzir a taxa básica de juros (Selic) em agosto, com as expectativas de inflação acima da meta de 4,5%, mudou o regime. Ele aposta que o governo Dilma trabalha com uma meta de crescimento. Por isso, no modelo de estimativa do impacto da crise, Volpon trabalha com a ideia de que o BC reduzirá a Selic para maximizar o crescimento do PIB, ainda que mantendo a inflação, ao fim do período (2013), abaixo de 6%.

Rodado o modelo, Volpon concluiu que, se o choque de 2012 for 100% equivalente ao de 2008, o Brasil crescerá 1,9% em 2012 e apenas 0,6% em 2013. Na hipótese de o choque ter impacto equivalente a 25% do que teve o de 2008, cenário considerado pelo BC, a economia crescerá 3,3% no ano que vem e 3% no ano seguinte. Tudo isso ocorreria sob um choque do tipo "queima lenta", sem a ocorrência de recessão.

Na hipótese de um choque "curto e rápido", haveria recessão em 2012, com contração de 0,9% do PIB, seguido de uma forte recuperação em 2013 (alta do PIB de 5,2%). Nesse caso, a taxa de investimento cairia 21,5%, em termos anualizados, no terceiro trimestre de 2012. No cenário anterior ("queima lenta"), o investimento sofreria redução crescente e consecutiva até 2013.

Em todas as simulações, as exportações brasileiras sofreriam impactos preocupantes. Já o real sofreria forte desvalorização - o dólar iria, no segundo trimestre de 2012, a R$ 2,43, mas se recuperaria e chegaria a R$ 1,68 no fim de 2013. No cenário de "queima lenta", chegaria ao fim daquele ano em R$ 2,37, na hipótese de a crise repetir integralmente os efeitos de 2008.

No caso dos juros, a Selic cairia, num choque "curto e rápido", a 6% ao ano, mas retornaria a 9,5% no fim de 2013, com a economia em plena recuperação. Num choque de "queima lenta", a Selic cairia, até 2013, a 4% (se a crise fosse idêntica à de 2008) ou a 6%, se a encrenca se restringisse a 25% do efeito ocorrido há três anos.

Por fim, diante de um choque do tipo "queima lenta", a inflação iria a 5,18% no segundo trimestre de 2012 (no caso de um impacto de 25% de 2008) e depois começaria a subir. Se o choque fosse a 100% de 2008, o IPCA cairia a 5,02% e, então, aumentaria a partir daí. Num choque "curto e rápido", a inflação seria reduzida à meta de 4,5% no terceiro trimestre do ano que vem. Em todos os casos, as simulações mostram IPCA em torno de 5,25% ao fim de 2013.

Volpon conclui que, se o choque atual tomar a forma de uma persistente "queima lenta", o contágio da crise será enorme, mesmo com o BC adotando uma política monetária agressiva. "Dado onde a economia brasileira está neste momento, o resultado mais provável seria uma estagflação, resultado de um crescimento positivo, mas baixo, e inflação acima da meta", diz ele. Como o próprio Volpon reconhece, as simulações estão sujeitas a inúmeras ressalvas. Ainda assim, indicam que a crise não será um passeio no parque. O impacto será forte, seja qual for o cenário considerado.

Cristiano Romero é editor-executivo


IGP-M sobe menos em novembro

Por Arícia Martins De São Paulo
A forte alta dos produtos agropecuários entre outubro e novembro foi concentrada em poucos itens e não deve tirar dos eixos a inflação de alimentos para o consumidor neste final de ano, avaliam economistas consultados pelo Valor. Ainda há um risco, no entanto, para os preços no atacado: caso o real continue perdendo valor ante o dólar — cenário que não é considerado o mais provável — e os preços das commodities se estabilizarem no mercado externo, o saldo será inflacionário no Índice Geral de Preços — Mercado (IGP-M), tal como ocorreu em setembro e outubro.

Como esperado pelo mercado, o IGP-M desacelerou em novembro, ao registrar alta de 0,50%, abaixo dos 0,53% verificados no mês anterior. O Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA) foi o responsável pelo movimento, recuando de 0,68% para 0,52%, com uma reversão em seus componentes. O IPA industrial deixou elevação de 0,91% para avanço de 0,49%, ao passo que o agropecuário subiu de 0,04% para 0,60%.

Segundo o coordenador de análises econômicas da Fundação Getulio Vargas (FGV), Salomão Quadros, os produtos industriais estão retornando a seu patamar após dois meses de intensa alta do dólar, ao passo que, nos agropecuários, poucos itens explicam a subida. “Isso significa que o movimento de alta não deve ser tão duradouro”, afirmou, durante apresentação do indicador de novembro.

Quadros destacou que, assim como no varejo, os alimentos in natura subiram com força no atacado ao deixarem deflação de 1,39% para elevação de 1,92%, movimento que deve ter um alívio em dezembro. As carnes bovinas também tiveram aceleração expressiva ao avançarem de 0,65% para 5,26%, enquanto as aves saíram de queda de 1,08% para alta de 2%. “São esses três itens que já estão repercutindo nos preços ao consumidor. Não temos uma pressão de vários alimentos acontecendo, ao contrário do que ocorreu no final do ano passado”, concluiu.

O economista Thiago Curado, da Tendências Consultoria, acredita que a ascensão no atacado será rapidamente repassada ao varejo, mas ressalta que suas coletas indicam aceleração “relativamente tranquila”, sem grandes preocupações que façam o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ultrapassar em larga medida o teto da meta estipulado pelo governo, de 6,5%. “Não será a influência externa que irá acelerar os alimentos e garantir o descumprimento da meta, mas também há certa resistência desse grupo que não permitirá um indicador muito abaixo do teto”.

Há uma ressalva, no entanto, do lado do câmbio, afirma Fabio Ramos, da Quest Investimentos. O economista espera “certa normalização” do cenário externo, o que trará o câmbio de volta a um patamar entre R$ 1,70 e R$ 1,80. Uma taxa mais próxima de R$ 1,90 mantida por mais tempo, porém, seria inflacionária, com impacto direto via commodities. Em seu cenário base, o analista projeta que o IGP-M tenha alta de 0,50% em dezembro, mesma taxa verificada em outubro, estimativa feita tendo como base uma estabilização dos preços das matérias-primas.

De acordo com Curado, o IGP-M deve desacelerar para 0,38% em dezembro. “Há espaço para a parte industrial acelerar em dezembro e os preços agropecuários devem se manter em patamar elevado, mas são movimentos que, mesmo com a questão cambial, não têm fôlego para aceleração intensa”.

Os analistas ouvidos concordam que o IGP-M deve encerrar 2011 com alta acumulada abaixo de 6%, quase metade da taxa de 2010, que ficou em 11,3%. Para Curado, a elevação será de 5,6%, enquanto Ramos, da Quest, estima taxa 0,1 ponto percentual maior.

Com o resultado apurado em novembro, a alta do índice em 12 meses desacelerou de 6,95% para 5,95%, movimento que, segundo Quadros, deve ter continuidade ao menos no primeiro trimestre de 2012. “Mesmo que haja uma pressão de sazonalidade não há nada que nos reaproxime do cenário do ano passado. Se não chegarmos aos 5,7% em dezembro, há mais dois meses à frente com espaço para recuo”.

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

O resgate de uma antiga mas excelente ideia


Por Alexandre Espirito Santo - Valor 25/11

Em meados de 2005, o ex-ministro, e então deputado Delfim Netto, propôs uma discussão bastante interessante: a meta de superávit nominal zero para o governo brasileiro. Esquecida, como tantas outras boas ideias que surgem em nosso país, seria de bom tom resgatar esse debate, sobretudo nesse momento, quando o governo Dilma Rousseff indica flexibilizar a política econômica vigente.

Primeiro, seria importante discutir se há efetivamente uma mudança em curso na política atual, consubstanciada em âncora monetária - com metas de inflação -, câmbio flutuante e superávit primário. A despeito de o governo afirmar que não, estou convencido de que o artigo da presidente no "Financial Times", em setembro, aponta para essa correção de rota na condução da economia. Ademais, a guinada nos juros patrocinada pelo Comitê de Política Monetária (Copom), no fim de agosto, além do IPI sobre automóveis importados, parece retirar eventuais dúvidas sobre esse novo arranjo macroeconômico.

O governo está se aproveitando - inteligentemente - de uma recaída da crise global para redimensionar as estratégias na economia. Na medida em que, na avaliação do Banco Central, haverá um viés deflacionário mundial, "a oportunidade é agora". E a base dessa mudança é focar no que seria o principal problema: reduzir os juros estratosféricos.

Os efeitos perversos dos absurdos patamares de taxas de juros reais praticadas no Brasil são as diminutas taxas históricas de investimento e de crescimento da nossa nação. É o investimento que garante a um país o crescimento sustentável, com a expansão da oferta de bens e serviços e o aumento do Produto Interno Bruto (PIB) potencial. A teoria comprova que a chave para a sustentabilidade de uma economia é o progresso tecnológico, que, em geral, demanda inversões de prazo de maturação mais longo.

Uma das mais significativas identidades da macroeconomia explicita que o ato de produzir bens de capital exige, por definição, uma poupança no mesmo montante. Em outras palavras, ex-post ambas se igualam. Portanto, seja ela doméstica - agentes privados e governo - ou externa - por meio de investimentos de não residentes no país - o fato é que o país precisa aumentar o seu nível de poupança. Vários são os estudos que demonstram que a melhor forma de se instaurar uma política pública visando o aumento do nível de poupança é por meio de uma gestão austera e eficiente dos gastos.

Uma questão fundamental quando se trata desse assunto é saber se a política fiscal brasileira atrapalhou o país na corrida pelo crescimento econômico? A resposta é afirmativa. Isso ocorre porque o aumento dos gastos públicos acentua o "crowding out" dos investimentos privados, eleva a carga tributária e as taxas reais de juros. Ademais, devido ao alto custo da dívida brasileira, o governo precisa se financiar com a emissão de nova dívida, disputando espaço com o setor privado pela poupança e criando um círculo vicioso.

Vários são os especialistas em contas públicas que demonstram que a eficiência do gasto governamental brasileiro pode ser considerada muito baixa, além de ser de má qualidade. Apesar da limitação imposta pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e do aumento anual da folha de pessoal ficar restrito ao IPCA mais 1,5%, só no pagamentos de servidores públicos, o governo aloca um percentual expressivo - em torno de 12% - do PIB, enquanto os investimentos não chegam nem a 10% desse total. Na área de saúde e educação, bens considerados meritórios, a situação também não é nada confortável. Pesquisa do Ipea revela que são os investimentos nessas áreas que mais revertem para o crescimento, face ao elevado efeito multiplicador dos mesmos.

A consequência funesta do descontrole de gastos foi nos vermos obrigados a aumentar a carga tributária para um nível considerado de primeiro mundo. A sociedade brasileira recolhe aos cofres públicos mais de 35% do PIB em tributos. E ainda assim, rotineiramente, ventilam-se novos impostos ou a recriação de "zumbis", caso da CPMF.

Deve-se assinalar, igualmente, outro ponto fundamental: pelo atual regime, o Banco Central possui uma autonomia relativa - de fato, mas não de direito - para conduzir a política monetária, visando o combate contra a inflação. No momento em que a política monetária passa a contribuir para o resultado fiscal, a credibilidade da autoridade monetária tende a ser questionada.

Em outras palavras, o Banco Central poderia ser "induzido" pelo poder executivo a conduzir as taxas de juros visando uma meta fiscal e não mais ao combate contra a inflação. Portanto, é condição imperativa para a implantação dessa nova política fiscal a independência da autoridade monetária, reforçando que o sistema de metas de inflação não foi "jogado para escanteio".

Dentro dessa linha de raciocínio, apesar dos dogmas petistas, o governo da presidente deveria retomar a agenda de privatizações de estatais para acelerar a trajetória de queda da dívida mobiliária, sobretudo em setores essenciais, como é o caso de aeroportos (a variação da dívida líquida do setor público é também afetada pelo resultado de privatizações de ativos pertencentes ao Estado e por outras variações patrimoniais). O governo deveria, igualmente, insistir nas reformas, sobretudo da previdência e tributária.

O mais relevante de relançar tal proposta de superávit nominal zero é fazer com que a maioria do governo, além da sociedade como um todo, atine para a premência de se melhorar os componentes e a qualidade dos gastos públicos. Representaria, sem dúvida, uma evolução em termos de discussões sobre políticas fiscais em nosso país. Independentemente, entretanto, de qual meta será estabelecida, cria a mensagem da importância de se aprofundar o esforço fiscal, que parece ser a âncora que a presidente mira programar agora. Sendo assim, o objetivo de redução significativa da taxa de juros real, para padrões internacionais, seria facilitada e o Banco Central administraria com maior grau de liberdade a política monetária e a própria taxa de câmbio.

Alexandre Espirito Santo é economista da WAY Investimentos e professor do IBMEC-RJ. E-mail: aesanto@wayinvestimentos.com.br.

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CLASSE MÉDIA VAI PAGAR R$ 100 BILHÕES EM JUROS 25/11/2011 - 01:17:00 TEMPO: 00:02:51
Um levantamento feito pelo Governo Federal chegou a uma conclusão amarga: a classe média vai pagar, este ano, R$ 100 bilhões em juros. A nova classe média, que já é mais da metade da população e move a economia, vai gastar R$ 100 bilhões em juros este ano, mas acredita que vai pagar só R$ 3 bilhões.

TV: TV GLOBO DF PROGRAMA: JORNAL GLOBO APRESENTADOR: WILLIAM WAACK

ANALISTAS DEBATEM SOBRE A CRISE ECONÔMICA NA EUROPA E NOS EUA – PARTE 1 24/11/2011 - 21:45:00 TEMPO: 00:12:12
Em entrevista ao Espaço Aberto, o professor do Departamento de Economia da PUC/RIO, Márcio Garcia, e o professor e coordenador do Programa de Estudos Europeus da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Frankilin Trein, falaram sobre a crise econômica internacional e seu impacto sobre a política dos países europeus. SONORA

*FRANKILIN TREIN, professor e coordenador do Programa de Estudos Europeus da Universidade Federal do Rio de janeiro

*MÁRCIO GARCIA, professor do Departamento de Economia da PUC/RIO

TV: GLOBO NEWS | PROGRAMA: ESPAÇO ABERTO | APRESENTADOR: MIRIAM LEITÃO

ANALISTAS DEBATEM SOBRE A CRISE ECONÔMICA NA EUROPA E NOS EUA – PARTE 2 24/11/2011 - 22:00:00 TEMPO: 00:10:18
Em entrevista ao Espaço Aberto, o professor do Departamento de Economia da PUC/RIO, Márcio Garcia, e o professor e coordenador do Programa de Estudos Europeus da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Frankilin Trein, falaram sobre a crise econômica internacional e seu impacto sobre a política dos países europeus.
SONORA
*FRANKILIN TREIN, professor e coordenador do Programa de Estudos Europeus da Universidade Federal do Rio de janeiro
*MÁRCIO GARCIA, professor do Departamento de Economia da PUC/RIO

TV: GLOBO NEWS | PROGRAMA: ESPAÇO ABERTO | APRESENTADOR: MIRIAM LEITÃO

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Estoques altos podem comprometer atividade industrial no início de 2012


Valor 25/11
Os estoques voltaram a crescer na indústria em outubro, apesar dos esforços do setor para escoar a produção. Esse movimento deve resultar em uma atividade industrial mais fraca no começo de 2012. Na sondagem industrial da Confederação Nacional da Indústria (CNI) de outubro, 13 setores entre 25 analisados aumentaram a produção acumulada sobre o que havia sido planejado. E esse número está aumentando. Em setembro, eram dez setores.

Os resultados do varejo nos últimos dois meses do ano serão decisivos para definir o nível da produção no setor de móveis, cujo estoque está bem acima do planejado. "Houve uma queda forte nas vendas nos últimos dois meses e o comércio segurou as encomendas. No setor, o aumento do estoque nas fábricas é resultado do comportamento na ponta", diz Lipel Custódio, diretor da Associação Brasileira das Indústrias do Mobiliário (Abimóvel).

Na sondagem da CNI, a produção do setor passou de 50 pontos em setembro para 52,1 pontos, em uma escala que vai de 0 a 100, sendo que números acima de 50 representam produção acima do esperado. Ou seja, a atividade na indústria de mobiliário foi positiva, o que, somado às vendas mais baixas no varejo, contribuiu para que o estoque disparasse, passando de 53,6 para 57,1 pontos, bem acima do planejado para outubro. "E se não houver um ajuste no Natal, a queda na produção em janeiro ficará acima do normal", diz Custódio.

Os números da CNI mostram que os estoques da indústria estão acima do planejado desde novembro de 2010. O indicador está cada vez mais distante dos 50 pontos, considerado o ponto de equilíbrio na pesquisa. O indicador ficou em 53,4 pontos em outubro, após fechar setembro em 52,9 pontos. A produção, no entanto, passa pelo movimento contrário. Outubro foi o segundo mês seguido em que a produção industrial ficou abaixo do planejado, registrando 48,8 pontos. Em outubro do ano passado, o indicador tinha registrado 53,6 pontos.

"A expectativa dos industriais para a demanda é positiva, mas esse otimismo está longe do que havia no mesmo período do ano passado. Se o ajuste do estoque não ocorrer pelo aumento da demanda, haverá novos cortes na produção", diz Marcelo Azevedo, economista da CNI. "A tendência é que o fim do ano contribua para esse ajuste e que um menor número de setores continue acumulando estoques, mas há a possibilidade das expectativas serem frustradas."

No setor têxtil, que apresentou maior descasamento entre o estoque efetivo e o planejado (61,9 pontos em outubro), as importações têm prejudicado a produção industrial e contribuem para o acúmulo dos estoques, na opinião de Aguinaldo Diniz Filho, presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit). "O déficit do setor caminha para US$ 5,2 bilhões em 2011. No ano passado, o déficit ficou em US$ 3,5 bilhões. Essa diferença significa que cerca de 200 mil empregos deixaram de ser criados no país", diz. Segundo a Abit, a produção têxtil caiu 16,7% na comparação entre os meses de setembro deste ano e o de 2010, mas as vendas no varejo cresceram 0,6%, representadas principalmente pelas confecções chinesas.

Uma saída para as empresas na tentativa de adequar os estoques é aumentar o tempo de férias coletivas. Para isso, elas devem enviar aos sindicatos trabalhistas um comunicado até 15 dias antes da saída das férias, o que ainda não ocorreu com os representantes dos principais sindicatos de trabalhadores metalúrgicos no Estado de São Paulo nem com os trabalhadores do setor de eletroeletrônicos de Manaus. Porém, a Utilização da Capacidade Instalada (UCI) medida pela CNI indica uma atividade abaixo do potencial. Há três meses, a UCI está em 76%. Esse não é um bom índice para outubro. "A utilização dos parques industriais no quarto trimestre costuma ser mais forte que no terceiro. Não é uma boa notícia ver que outubro repetiu os dados dos dois meses anteriores", afirma Azevedo.

De acordo com a CNI, a Sondagem aponta para "um cenário negativo" no setor. De acordo com Azevedo, se não houver melhora no consumo de bens manufaturados nacionais, a produção deve continuar caindo. "A indústria está com estoques acumulados e o custo disso é alto, especialmente para as pequenas empresas, por terem menos capital de giro para manter esse volume", afirmou.

Diante do cenário de produção abaixo do esperado e de aumento dos estoques, as expectativas dos empresários recuaram no período. O otimismo em relação à demanda registrado em outubro foi de 53,3 pontos - o menor desde 2009. Os índices de expectativa de compra de matérias-primas, de número de empregados e de quantidade exportada também recuaram e ficaram abaixo da linha dos 50 pontos. Além da demanda fraca, a importação também atrapalha diz Azevedo. "A entrada de produtos importados não deixa que o consumo seja totalmente canalizado para a indústria nacional", afirmou.

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

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BOVESPA OPERA EM ALTA DE 0,22% TEMPO: 00:02:00
A Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) opera em alta de 0,22%, com giro financeiro acima de R$ 1,9 bilhão. O dólar sobe 1,72%, negociado a R$ 1,89.

TV: GLOBO NEWS PROGRAMA: EDIÇÃO DAS 16 HORAS APRESENTADOR: LAIR RENNÓ

REPÓRTER NÚRIA SALDANHA TRAZ AS ÚLTIMAS INFORMAÇÕES DO MERCADO FINANCEIRO TEMPO: 00:04:30
Direto da BM&FBovespa, a repórter Núria Saldanha traz as últimas informações do mercado financeiro, com destaque para os mercados de câmbio.

TV: BAND NEWS | PROGRAMA: BAND NEWS TARDE | APRESENTADOR: CHRISTIANO BLOTA

PRODUÇÃO INDUSTRIAL E O USO DA CAPACIDADE INSTALADA RECUAM EM OUTUBRO, APURA CNI TEMPO: 00:01:00
Pesquisa realizada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) revelou que o uso da capacidade instalada recuou para 43,9 em outubro. A produção industrial somou 48,8 pontos no mês passado, leve alta se comparada com o mês anterior, quando fechou em 48,6 pontos.

TV: GLOBO NEWS | PROGRAMA: CONTA CORRENTE | APRESENTADOR: GUTO ABRANCHES

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Corte de salário gera nova onda de greves na China



Por Rahul Jacob Financial Times, de Hong Kong

A China está diante de sua pior onda de distúrbios trabalhistas desde uma série de greves desvinculadas de comando sindical em fábricas de automóveis japonesas no ano passado. Desta vez, uma queda nos pedidos de exportações levaram fábricas a reduzir os pagamentos dos trabalhadores.

Mais de 10 mil operários em Shenzhen e Dongguan, os principais centros produtores para exportação na província meridional de Guangdong, entraram em greve nos últimos sete dias. Os mais recentes protestos eclodiram na terça-feira numa fábrica taiwanesa de computadores em Shenzhen.

Essa intensificação na agitação trabalhista é provavelmente o ponto mais significativo no movimento desde o verão de 2010, disse Geoffrey Crothall, do China Labour Bulletin (CLB), um grupo de defesa de trabalhadores com sede em Hong Kong.

As greves acontecem em meio aos crescentes temores com a economia mundial, que está sofrendo com a crise da dívida soberana europeia e a fraca recuperação nos EUA. Os temores em relação a economia chinesa também cresceram ontem depois que um índice que reflete a atividade do setor industrial compilado pelo HSBC caiu para níveis não vistos desde março de 2009 (leia texto abaixo). O governador em exercício de Guangdong disse na semana passada que as exportações caíram 9% em outubro em relação ao mês anterior.

Líderes provinciais também estão sendo alvo de protestos generalizados por parte de agricultores devido à ocupação de terras.

Cerca de 5 mil residentes na cidade de Wukan marcharam até os escritórios do governo em protesto pacífico na segunda-feira.

As fábricas estão cortando horas extras de que os trabalhadores dependem para complementar seus modestos salários-base, depois da queda nas encomendas do exterior. Segundo o CLB, o salário-base médio dos trabalhadores no setor de eletrônicos é de cerca de 1.500 yuans (US$ 236) por mês, mas sobe para 2.500 yuans com as horas extras. O salário-base sozinho nunca é suficiente, disse Crothall.

Os protestos na terça vieram na esteira de uma manifestação de manifestação maior, na semana passada, numa fábrica de calçados em Dongguan fornecedora da Nike e da Adidas. Cerca de 7.000 trabalhadores da fábrica taiwanesa, de propriedade de Pou Chen, opuseram-se a um corte nas horas extras e à decisão da empresa de transferir parte da carga de trabalho para outras fábricas no interior da China e para o Vietnã, onde a mão de obra é mais barata.

"Fomos obrigados a retornar à fábrica", disse um operário. "Mas só ficamos sentados lá. Ninguém está operando as máquinas."

O trabalhador, que não quis ser identificado, disse que o governo local assumiu uma posição dura na negociação e tomou partido da gerência da fábrica.



Atividade industrial aponta para desaceleração



Por Agências internacionais
O setor industrial da China teve em novembro o pior desempenho desde março de 2009, de acordo com dados preliminares do Índice dos Gerentes de Compras. A freada na segunda maior economia do mundo teve impacto negativo nos mercados, deixando os investidores apreensivos com a possibilidade de uma nova recessão global.

O índice (PMI, na sigla em inglês), que é compilado pelo HSBC e funciona como um sinalizador do nível de atividade nos próximos meses, caiu de 51 pontos em outubro para 48 - números abaixo de 50 indicam contração. O resultado reflete um enfraquecimento da economia interna, com uma queda na produção e nas encomendas que não foi contrabalançada pelos novos contratos para exportação. Embora ainda esteja sujeito a revisão, o número aumenta a expectativa por um possível afrouxamento monetário no país.

"A queda do PMI implica mais desaceleração da produção industrial à frente", disse em comunicado o economista-chefe do HSBC para a China, Hongbin Qu. "Como a inflação deverá arrefecer a um ritmo mais rápido do que o esperado, isso deixará mais espaço para que Pequim ponha em prática medidas seletivas de afrouxamento".

Outros analistas expressaram maior pessimismo com relação ao dado. "Trata-se de mais uma confirmação de que a atividade não está apenas consolidando-se, mas contraindo-se continuamente", disse o economista-chefe do ING para a Ásia, Tim Condon. Ele acrescentou que Pequim pode ter de migrar de uma política de ajuste fino para um "afrouxamento claro".

Para o economista Zhou Hao, da ANZ, a China "pode ter de reduzir o compulsório bancário já no fim deste mês para facilitar as condições de liquidez". O país, segundo ele, precisa dar uma resposta rápida aos riscos de queda da atividade, já que suas exportações estão sentindo o efeito da deterioração da economia global.

Barbas de molho


Por Carlos Lessa - Valor 24/11

Sou de uma geração treinada em ler nas entrelinhas. Vivi as longas décadas de regimes ditatoriais latino-americanos e aprendi a pesquisar as intenções nos discursos oficiais. O dr. Ulysses Guimarães me ensinou que se deve prestar atenção aos silêncios nos discursos.

Percebo uma crescente preocupação da presidente Dilma com a China e suas pretensões geopolíticas e geoeconômicas. Na reunião do G-20, a presidente declarou sua preocupação com a ausência de compras chinesas de produtos industriais brasileiros (leia-se, nas entrelinhas, que o Brasil é exportador de alimentos e matérias-primas sem processamento: soja em grão, minério de ferro bruto, couro de vaca sem curtição etc). Em passado relativamente recente, exportamos geradores para a grande usina do Rio Amarelo; agora, estamos importando geradores da China. Vendemos aviões da Embraer. Bobamente, aceitamos instalar uma filial na China; os chineses clonaram a fábrica da Embraer e, hoje, competem com o avião brasileiro no mercado mundial. Esta semana, a presidência declarou sua preocupação com a tendência chinesa à aquisição de grandes glebas agrícolas no Brasil. A percepção presidencial não resolve o problema das relações Brasil-China, porém já é meio caminho andado que o poder executivo nacional tenha aquelas dimensões presentes.

O enigma chinês é fácil decifrar. O Brasil cresceu, de 1930 a 1980, 7% ao ano. Depois dessas décadas, mergulhamos na mediocridade e patinamos com uma taxa média ridícula de 2,5%. A China, nas últimas décadas, vem crescendo anualmente entre 9% e 10%. Entretanto, está em situação potencialmente pior que o Brasil. Hoje, mais de 80% da população brasileira está em áreas urbanas e 50% em metropolitanas e nem chegamos aos 200 milhões de habitantes. A China tem uma população de 1,34 bilhão, sendo que menos de 50% estão na área urbana. Como a renda média do chinês rural é um terço da do chinês urbano, é inexorável uma transferência equivalente a duas vezes a população brasileira para as cidades chinesas, nos próximos 20 anos. É fácil entender o sonho de urbanização do chinês rural. A periferia urbana das cidades chinesas já está "favelizada".

Sabemos que o Brasil tem uma péssima distribuição de renda e riqueza. Houve uma melhoria da participação dos salários na renda nacional, que evoluiu, desde 2000, de 34% para 39%. A elevação do poder de compra dos salários foi importante, entretanto o leque salarial se tornou mais desigual e houve pouca geração de empregos de boa qualidade. O salário médio brasileiro é muito baixo, entretanto é, por mês, igual ao limite de pobreza chinês ao ano (cerca de €150), isto é, o brasileiro pobre ganha 12 vezes mais que o chinês pobre. Nosso governo fala de uma "nova classe média" e esconde que o lucro real dos grandes bancos brasileiros cresceu 11% por ano no período FHC e 14% durante os dois mandatos do presidente Lula. Enquanto os colossais bancos chineses têm uma rentabilidade patrimonial inferior a 10%, os bancos brasileiros chegam a 20%.

É impensável o futuro demográfico chinês. No passado, cada família só podia ter um filho; agora, essa regra está sendo relaxada. A urbanização e a industrialização chinesas já comprometeram o lençol freático da China do Norte. Com restrições de água, e necessitando transferi-la cada vez mais para a sede da indústria e população urbana, a China não produzirá alimentos suficientes. Se o consumo interno da China crescer cada vez mais, haverá falta não só de água, mas também de energia fóssil e hidráulica, além de, obviamente, todo um elenco de matérias-primas.

O planejamento estratégico de longo prazo da China é para valer. O projeto geopolítico e a geoeconômico chinês está transformando a África e parte da Ásia do sudeste em fronteira fornecedora de alimentos e matérias-primas. Em busca de autossuficiência de minério de ferro, a China já está desenvolvendo as enormes reservas do Gabão. A petroleira chinesa já está nas reservas de petróleo de gás do coração da África e a ocupação econômica de Angola é prioridade diplomática e financeira da China. O extremo sul da América Latina é objeto de desejo expansionista chinês, que se propôs a fazer e operar uma nova ferrovia ligando Buenos Aires a Valparaíso, perfurando um túnel mais baixo na Cordilheira dos Andes. O Chile - com pretensão de se converter na "Singapura" do Pacífico Sul - e os interesses agro-exportadores argentinos adoram a ideia. Carne, soja, trigo, madeira, pescado e cobre estarão na periferia da China do futuro. A presidência argentina é relutante em relação a esse projeto, porém o Mercosul está sob o risco de se converter, dinamicamente, em pura retórica.

O Império do Meio, unificado pela dinastia Han (ainda antes de Cristo), atravessou séculos com Estado centralizado e burocracia profissional estruturada. No século XIX, a China balançou pela penetração da Inglaterra vitoriana; enfrentou a perfídia mercantil do ópio controlado pela Índia britânica. Sua república, no século XX, foi ameaçada pela expansão japonesa, e somente após a Segunda Guerra Mundial conseguiu, com o Partido Comunista Chinês (PCC) restaurar a centralidade.

Com um pragmatismo secularmente desenvolvido, a China combinou o Estado hipercontrolador com a "economia de mercado". "Casou" com os EUA e criou um G-2, aonde mais de 3 mil filiais americanas produzem na China e exportam para o mundo (70% das exportações de produtos industriais são de filiais americanas). O superávit comercial chinês é predominantemente aplicado em títulos do Tesouro. Esse é um sólido matrimônio, em que os cônjuges podem até brigar, mas não renegam a aliança mutuamente conveniente. Enquanto isso, a China repete a proposta da Inglaterra vitoriana para a periferia mundial: fonte de matérias-primas e alimentos, a periferia mundial é, progressivamente, endividada com os bancos chineses e seu espaço econômico é ocupado por filiais da China. A Revolução Meiji, que modernizou e industrializou o Japão, está em plena marcha na China, que procura ser a campeã mundial em ciência e tecnologia. A estratégia da China combina as chaves do sucesso da Inglaterra vitoriana com a prioridade científico-tecnológica japonesa.

Que a China faça o que quiser, porém o Brasil não deve se converter na "bola da vez" da periferia chinesa. País tropical, com enormes reservas de terra agriculturável, água e fontes de energia fóssil e hidrelétrica, imagine-se a prioridade estratégica para o planejamento chinês em sua marcha pela periferia.

O discurso da globalização, a fantasia da "integração competitiva", a ilusão de ser "celeiro do mundo" com brasileiros ainda famintos, e a atrofia da soberania nacional podem vir a ser um discurso de absorção da proposta neocolonizadora da China.

Leio, nas palavras da presidente, uma percepção do risco do "conto do vigário" chinês. Temo os vendilhões da pátria, entregando energia e alimentos para o neo-sonho imperial.

Carlos Lessa é professor emérito de economia brasileira e ex-reitor da UFRJ. Foi presidente do BNDES. E-mail: carlos-lessa@oi.com.br.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Euro-românticos maçantes e cruéis - Paul Krugman - Estadao.com.br



Na zona do euro, avanço ou ruína


Por Martin Wolf - Valor 23/11

Os investidores estão cada vez mais relutantes em confiar em papéis da dívida soberana de muitos países da zona do euro. Essa é a lição mais importante dos recentes acontecimentos. Muitos políticos europeus querem declarar guerra aos mercados. Eles precisam lembrar-se que desejam que as pessoas comprem títulos de suas dívidas.

Na segunda-feira, os spreads em relação aos Bunds alemães eram superiores a 60 pontos-base (0,6 ponto percentual) na Holanda e na Finlândia, 152 pontos na Áustria, 155 pontos na França, 292 pontos na Bélgica, 466 pontos na Espanha, 480 pontos na Itália, 650 pontos na Irlanda, 945 pontos em Portugal e 2.554 na Grécia. Para a maioria dos membros, esses spreads são administráveis. Mesmo a Itália e a Espanha poderiam conviver com os rendimentos atuais por algum tempo, embora não indefinidamente. O preocupante é a intensificação das tensões nos mercados de dívida pública na zona do euro: a Irlanda é o único membro que registrou um declínio significativo nos spreads, apesar de ainda estarem em um nível punitivo.

Existem três explicações para isso. A primeira é que os investidores percebem que uma série de países da zona euro vivem sob um risco de insolvência muito maior do que se pensava.

A segunda é que os países da zona do euro não dispõem de um verdadeiro emprestador de última instância. Eles são o que Charles Goodhart, da London School of Economics, denomina "soberanos subsidiários". Sua dívida embute um risco de inadimplência pura e simples e não de mera monetização. Temendo um calote, os investidores criam iliquidez, que se transforma em insolvência. Quanto maior a proporção de credores estrangeiros, mais plausível torna-se um default: os investidores sabem que os políticos mostram-se menos inclinados a dar um calote em seus próprios cidadãos do que em estrangeiros. Mas, em consequência da união monetária, estrangeiros detém uma proporção maior de dívida soberana do que antes: metade da dívida pública italiana foi contratada no exterior.

A terceira explicação é que há risco de ruptura. Nenhuma união monetária é irrevogável. Até mesmo países não sobrevivem para sempre. Mas uma união monetária entre os Estados discordantes é muito mais frágil do que um país.

A primeira explicação não funciona. A posição de endividamento e do déficit espanhol não é, obviamente, pior do que a do Reino Unido. No entanto, o Reino Unido está pagando apenas 2,2% em títulos de 10 anos, contra 6,6% no caso da Espanha. A explicação para esse abismo tem de ser os riscos de falta de liquidez e de ruptura. Esses riscos também estão inter-relacionadas: se iliquidez for a causa de um calote, os países poderão abandonar a moeda única. Isso não é inevitável. Mas é imaginável, tendo em vista o enorme choque resultante do calote de um país importante.

Então, o que deve ser feito? Na semana passada, moderei um debate sobre esse tema numa conferencia em homenagem a Paul de Grauwe, da Universidade de Leuven, na Bélgica. Concluí que a zona do euro enfrenta três desafios interligados. O primeiro é administrar a falta de liquidez nos mercados de dívida pública. A segunda é reverter a divergência de competitividade manifesta desde o lançamento do euro. A terceira é criar um regime capaz de garantir relações econômicas menos instáveis entre seus membros. Por trás dessa lista há uma questão simples: para que confiem no futuro do euro, as pessoas têm de acreditar que os países membros terão um futuro melhor com, do que sem, o euro. Examinemos cada um desses pontos.

Em primeiro lugar, os países vulneráveis simplesmente não podem, por si sós, eliminar o risco de iliquidez ou de ruptura. Promessas de austeridade que tendam a enfraquecer a economia minam a credibilidade, em vez de fortalecê-la. As taxas de juro têm de ser contidas em níveis administráveis. Como isso pode ser feito é uma questão de segunda ordem. Alguma combinação do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira (FEEF) com o Banco Central Europeu (BCE) parece um caminho lógico, como sugerem Peter Bofinger, da Universidade de Würzburg, e George Soros. Infelizmente, intervenções potentes são improváveis, devido a uma resistência ideológica equivocada. Soberanos vulneráveis serão deixados na corda bamba. Mas se os spreads forem limitados, embora não eliminados, os países continuarão a ter um forte incentivo para conter seus déficits e reduzir suas dívidas.

Em segundo lugar, grande parte da perda de competitividade dos países periféricos precisa ser revertida. Mas como a Alemanha deve saber, com base em sua experiência na década passada, isso seria muito mais fácil se a inflação fosse relativamente elevada nos países parceiros. O BCE deveria procurar assegurar uma demanda suficiente nos próximos anos para facilitar a melhoria da competitividade necessária nos países periféricos. Sob essa perspectiva, o BCE não foi bem-sucedido. O crescimento da massa monetária entrou em colapso e o Produto Interno Bruto, tanto real como nominal, tem se mostrado excessivamente fraco.

Agora que a austeridade fiscal é a regra, o BCE deveria estar praticando uma política monetária fortemente expansionista, em vez da mais restritiva política entre todos os grandes bancos centrais dos países avançados. Nas atuais circunstâncias, o mantra do BCE sobre estabilidade de preços a médio prazo cria o risco de tornar-se letal. Como disse-me uma autoridade em Bruxelas pouco tempo atrás, o BCE corre o risco de ser lembrado pelos historiadores como o magnificamente ortodoxo banco central de uma união monetária fracassada. É assim que os membros de seu conselho querem ser lembrados? Suspeito que não.

Infelizmente, o ajuste pode, em alguns casos, não dar certo. Nesse caso, a zona do euro teria de enfrentar uma de três alternativas terríveis: um membro permanente deprimido; um membro permanentemente numa UTI externa; ou a saída de um membro. Não conheço nenhuma maneira de tornar essas opções palatáveis.

Finalmente, consideremos o futuro regime político e econômico para a zona do euro. Parece-me que três lições se destacam em meio à crise. Primeiro: como salientou André Sapir, da Université Libre de Bruxelles, o setor financeiro da zona do euro deve ser fiscalizado por uma agência regulamentadora comum e apoiado por uma autoridade comum fiscal. Segundo: no mínimo, a zona do euro se beneficiaria enormemente de um mercado de títulos unificado que cobrisse uma grande parte da dívida dos países membros. Finalmente, é preciso haver disciplina mais efetiva sobre as políticas estruturais e fiscais dos países membros. Mas nenhuma dessas opções seria aceitável para as democracias sem uma substancial adoção de união política. Entretanto, tudo o que temos visto e ouvido recentemente sugere que esse desdobramento, descartado na década de 1990, seria ainda mais difícil agora.

Em suma, a zona do euro tem que avançar ou submeter-se aos riscos de uma desintegração. Em artigo que escrevi há 15 anos, argumentei que "não são apenas a ausência de uma cultura política compartilhada e de um processo político comum o obstáculo para o sucesso duradouro; a União Europeia também não dispõe das estruturas constitucionais para legitimar o exercício centralizado de poderes politicamente delicados". A zona do euro precisa agora provar que estou errado. (Tradução de Sergio Blum)

Martin Wolf é editor e principal comentarista econômico do FT.

Economists Statement in Support of OWS


Lista de economistas que apoiam o movimento já conta com mais de 170 nomes.

Statement on OWS « Econ4

terça-feira, 22 de novembro de 2011

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FMI ANUNCIA MECANISMO PARA EVITAR CONTAMINAÇÃO DE ECONOMIAS PELA CRISE TEMPO: 00:01:00
O Fundo Monetário Internacional (FMI) anunciou a criação de um novo mecanismo de financiamento para tentar evitar que uma crise em um país acabe contagiando outras economias. A medida - chamada de Linha Preventiva de Liquidez - coloca à disposição dos países do FMI um crédito a curto prazo para cobrir necessidades urgentes. Cada país pode pegar emprestado até 10 vezes o valor de sua contribuição ao fundo, mas deve cumprir com as exigências básicas da instituição.

TV: GLOBO NEWS | PROGRAMA: EDIÇÃO DAS 16 HORAS | APRESENTADOR: LAIR RENNÓ

BOVESPA OPERA EM QUEDA SUPERIOR A 1% TEMPO: 00:04:00
A Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) opera em queda superior a 1%. A desvalorização da Bovespa no mês está perto de 4%. O dólar sobe 0,16%, cotado a R$ 1,81. A valorização no mês já passa de 6%.

Em entrevista ao Conta Corrente, da Globo News, Eduardo Coutinho, da Platina Investimentos, falou sobre a queda de juros e do crescimento do Brasil.

TV: GLOBO NEWS | PROGRAMA: CONTA CORRENTE | APRESENTADOR: GUTO ABRANCHES

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Mercado imobiliário esfria na China e ameaça os bancos


Por Simon Rabinovitch | Financial Times, de Pequim

O número de transações nos mercados imobiliários nas maiores cidades chinesas caiu para níveis perigosamente baixos, segundo documentos de agências reguladoras obtidos pelo jornal britânico "Financial Times".

Segundo os documentos, no início deste ano a Comissão Reguladora para o Setor Bancário da China ordenou aos bancos domésticos que avaliassem o impacto de uma queda de 30% nas transações imobiliárias, em "testes de estresse", com o objetivo de verificar a saúde do sistema financeiro chinês.

Embora o governo venha tentando conter os altíssimos preços dos imóveis, um desaquecimento no mercado imobiliário chinês produziria um substancial efeito cascata na economia mundial. A construção civil foi responsável por mais de 13% da atividade econômica chinesa no ano passado.

Em abril, a CRSBC instruiu os bancos para que simulassem o impacto, nas suas carteiras de empréstimos, de uma queda de 50% nos preços (dos imóveis) e também de uma queda de 30% no volume de transações.

Mas em outubro as transações com imóveis caíram 39%, em relação a 2010, nas 15 maiores cidades chinesas, segundo dados governamentais. Em todo o país, as transações caíram 11,6%, numa aceleração iniciada com uma queda de 7% em setembro.

A queda nas transações afetou os fluxos de caixa das incorporadoras imobiliárias e, em alguns casos, também a capacidade delas de quitar empréstimos bancários. Uma crescente inadimplência, após a onda de concessões de empréstimos em 2009 e 2010, grande parte dos quais acabou alocada no setor imobiliário, foi citada pelo Fundo Monetário Internacional, neste mês, como um dos maiores riscos para o setor financeiro chinês.

A CRSBC não divulgou os resultados dos testes de estresse e recusou-se a comentá-los. Mas um analista que avaliou os documentos disse que eles não levaram em conta o impacto que menos transações e diminuição dos preços das propriedades teriam sobre as garantias oferecidas aos bancos.

"Se as incorporadoras não conseguirem vender propriedades e os governos locais não conseguirem vender terrenos, é difícil ver por que os bancos estariam em melhor situação para desempenhar quaisquer duas tarefas sob tais condições", disse o analista.

Reservadamente, as autoridades fiscalizadoras chinesas admitem que os testes precisam ser aperfeiçoados. Um alto funcionário disse que os bancos muitas vezes desconhecem que empréstimos concedidos a empresas estatais foram canalizados para subsidiárias atuantes no setor imobiliário e reconheceu que o impacto sobre as garantias dos empréstimos não foram integralmente levados em conta.

Os pontos fracos nos cenários chineses lembram os problemas com os testes de estresse realizados na União Europeia, quando as autoridades reguladoras subestimaram o possível impacto de uma crise de dívida soberana.

O temor é que o impacto do estouro de uma bolha imobiliária chinesa poderia produzir uma crise tão dramática quanto a que está em evolução na Europa.

Um esfriamento no mercado imobiliário é exatamente o que Pequim desejava quando lançou uma campanha de contenção para segurar a disparada dos preços. Mas a preocupação é que o governo tenha subestimado o impacto produzido por suas medidas.

As medidas, inclusive a exigência de pagamento de entradas maiores, levaram quase dois anos para se fazerem sentir. Mas há o temor de que o governo terá problemas para mudar de marcha rapidamente se for necessário reagir. A sensível queda no número de compradores também está pesando sobre o setor de construção, o que poderia representar um golpe desfavorável sobre a economia.

Os efeitos secundários mal foram analisados nos testes de estresse. Os bancos foram instruídos a catalogar uma série de empréstimos relacionados ao setor imobiliário: empréstimos a construtoras, financiadoras imobiliárias e a indústrias que suprem o setor - de fornecedoras de cimento a fabricantes de móveis. Mas a metodologia pressupõe que, embora os preços das casas caiam, o crescimento econômico em geral permanecerá mais ou menos intacto.

"Antes que os preços dos imóveis caiam 30%, é preciso considerar a queda nas vendas e, mais importante, a queda na atividade de construção. Isso não apenas impactará a siderurgia e a fabricação de cimento, como também significaria uma queda na produção industrial, no investimento e no emprego", disse um analista ao "Financial Times".

Outro analista disse que os testes de estresse não deram conta de analisar de que maneira uma queda repercutiria através do sistema bancário por resultar em queda nas vendas de terrenos e em seus preços e no valor das garantias bancárias. Mas as garantias oferecidas ao sistema bancário chinês são terrenos ou imóveis, e portanto uma queda poderia forçar baixas contábeis generalizadas.

Reservadamente, autoridades reguladoras chinesas admitem que os testes de estresse precisam ser melhorado e que não se sabe a verdadeira escala da exposição dos bancos a uma queda no setor imobiliário.

Preços de exportação recuam e devem cair mais até 2012


Por Sergio Lamucci De São Paulo - VALOR 22/11

Depois da alta forte e contínua iniciada em meados de 2009, os preços das exportações brasileiras inverteram a mão nos últimos dois meses, dando início a uma trajetória de queda que deve se estender ao longo de 2012. Em setembro e outubro, as cotações recuaram 1% em relação ao nível de agosto, segundo números da Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex). É uma baixa pouco expressiva, mas emblemática, dizem analistas. Nos últimos anos, o aumento de preços garantiu saldos comerciais robustos, sustentados especialmente pela disparada das commodities, a despeito do crescimento expressivo das importações. No acumulado do ano, contudo, a alta ainda é significativa, de 25,5% na comparação com o mesmo período de 2010.

As cotações das commodities, que dominam a pauta de exportações do Brasil, tendem a seguir em baixa daqui em diante, dadas as perspectivas de menor crescimento global, com provável recessão na Europa, uma economia americana ainda fraca e temores de alguma desaceleração da China. Especialistas apostam que os preços médios das vendas externas brasileiras em 2012 ficarão até 10% menores do que as deste ano. Como os preços da importação, que é concentrada em manufaturados, devem cair menos, os termos de troca vão piorar, levando a uma redução do superávit comercial.

Em outubro, houve queda dos preços de exportação de todas as categorias de produtos em relação ao mês anterior - de 0,3% dos básicos, 0,4% dos manufaturados e 2,4% dos semimanufaturados (a única das três em que as cotações haviam subido em setembro). Nessa última categoria, destacaram-se os recuos de 1,8% do óleo de soja em bruto e de 5,8% do alumínio. Como não têm um padrão sazonal definido, os preços de exportação de um mês podem ser comparados com o mês imediatamente anterior sem a necessidade de ajustes.

O economista-chefe da Funcex, Fernando Ribeiro, acredita que os preços de exportações devem de fato seguir em queda nos próximos meses, vendo os números de setembro e outubro como o início de uma tendência. Ele não espera, contudo, tombos acentuados. O baixo crescimento nos países desenvolvidos, com uma possível recessão na Europa, já estaria em alguma medida refletido na tendência dos preços, diz Ribeiro. Como a liquidez deve continuar elevada no mercado internacional e as economias emergentes, em especial a China, tendem a manter um ritmo de expansão ainda razoável, os preços dos produtos primários não vão despencar, avalia ele. Com base nesse cenário, que não contempla uma ruptura do porte da quebra do Lehman Brothers, ocorrida em setembro de 2008, o economista estima que os preços de exportação em 2012 podem ficar de zero a 5% menores do que a média de 2011.

Ribeiro destaca que os preços de exportação oscilam menos que as cotações das commodities nos mercados internacionais. Há contratos acertados com antecedência, e os exportadores tentam esperar momentos mais favoráveis para fechar negócios, nota ele. Não por acaso, os preços só caíram em setembro e outubro, reagindo com defasagem ao recuo dos produtos primários observado nos mercados. "A era de alta de preços internacionais chegou ao fim em abril de 2011. Faz sete meses que eles registram trajetória de declínio suave", como lembra o economista Fabio Silveira, sócio da RC Consultores. Segundo ele, a economia global está ajustando para baixo seus preços de equilíbrio, aos tempos de baixo crescimento que "conhecemos neste ano e vamos conhecer nos próximos".

O presidente em exercício da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, tem uma visão um pouco mais pessimista do que a de Ribeiro em relação aos preços de exportação. Segundo ele, o crescimento pouco animador nos EUA e muito fraco na Europa terá efeito não desprezível sobre os preços de commodities, que respondem por pouco mais de 70% da pauta de exportações do Brasil.

Para Castro, uma queda de 5% a 10% dos preços de exportações é factível, com a tendência de o recuo ser mais próximo de 10%. As cotações do minério de ferro e do complexo soja, que têm peso expressivo nas vendas externas, deverão ficar em níveis consideravelmente abaixo da média de 2011. "Os preços de praticamente todas as commodities atingiram o ápice neste ano", diz Castro. São níveis que não são mais sustentáveis no mundo de hoje.

Para Silveira, as cotações das exportações brasileiras "podem demorar muitos anos para retornar ao patamar do primeiro semestre de 2011", lembrando que eles também foram inflados por movimentos especulativos.

Saldo comercial pode diminuir até 50% no próximo ano

A esperada piora nos termos de troca (a relação entre preços de exportação e importação) vai derrubar o superávit comercial da casa de US$ 30 bilhões neste ano para US$ 15 bilhões a US$ 20 bilhões no ano que vem, acreditam especialistas em comércio exterior. Um recuo maior requer um tombo das commodities, que hoje não parece o cenário mais provável.

O economista Fabio Silveira, sócio da RC Consultores, acredita que os preços de exportação em 2012 ficarão 8% abaixo da média de 2011, enquanto o volume de vendas deve crescer 2%. Com isso, o valor das exportações cairia de US$ 255 bilhões para US$ 240 bilhões. As importações, por sua vez, devem ter queda menor, de US$ 225 bilhões para US$ 220 bilhões, com preços recuando 5% e os volumes aumentando 3%. Desse modo, o saldo comercial encolheria de US$ 30 bilhões em 2011 para US$ 20 bilhões em 2012.

Os preços de importação tendem a cair menos do que os de exportação, uma vez que o Brasil compra principalmente produtos manufaturados, bens cujas cotações costumam recuar com menos força que as commodities, por serem menos voláteis. Em 2009, sob o efeito do agravamento da crise do ano anterior, as cotações dos produtos básicos caíram 17,6% e as dos manufaturados, 5,9%.

O economista-chefe da Fundação Centro de Estudos de Comércio (Funcex), Fernando Ribeiro, acredita que, na média, os preços de importação podem ficar estáveis em relação aos deste ano. Nas suas contas, que incluem cotações de exportações estáveis ou com uma queda de até 5%, isso faria o superávit comercial encolher da casa de US$ 30 bilhões para US$ 20 bilhões ou um pouco menos, previsão muito próxima da de Silveira.

Com base em estimativas bastante preliminares, o presidente em exercício da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto Castro, considera possível um saldo comercial entre US$ 15 bilhões e US$ 20 bilhões no ano que vem - para este ano, projeta um superávit US$ 28 bilhões.

A possibilidade de um déficit comercial em 2012 parece pequena. Transformar um superávit de US$ 30 bilhões num ano num rombo exigiria um tombo muito forte das commodities, o que não pode ser descartado, especialmente dada as incertezas na Europa, mas é hoje visto como improvável. A concentração da pauta de exportações em produtos primários, porém, é um risco, como ressalta Castro. O país fica exposto às oscilações de preços fora do seu controle. Um tombo mais acentuado das commodities, em caso de agravamento do cenário externo, poderia derrubar o superávit para menos de US$ 10 bilhões, diz Ribeiro.

PIB nominal?


Por Antonio Delfim Netto - Valor 22/11

A última reunião do G-20 terminou de maneira decepcionante. Foi quase uma tertúlia lítero-musical. Terminou, como todas elas, com a convocação da próxima... A carência de ideias, o despreparo das propostas, a visível insegurança das principais lideranças internacionais e a aparente alienação dos EUA com relação ao problema da Eurolândia orquestraram um espetáculo no mínimo assustador.

O Brasil, na minha opinião, saiu bem na foto. Colocou de forma séria o enorme problema dos desequilíbrios comerciais gerados por políticas cambiais claramente protecionistas de alguns países. Mais do que isso. Discreta, mas firmemente, referiu-se às distorções adicionais produzidas pelas disparidades abissais entre as políticas civilizatórias de proteção ao trabalho que as acompanham em alguns deles. Isso transforma a teoria das vantagens comparativas, que recomenda a liberdade absoluta de comércio, de uma bela história da carochinha numa peça de horror...

No mesmo momento, numa batalha de sites, blogs e "tutti quanti", alguns economistas exumam parte de uma velha ideia, desenvolvida por um grupo de Cambridge (Inglaterra) coordenado pelo competente James Meade (1907-1995, Nobel de 1977), que durante toda a sua vida preocupou-se em como transformar o conhecimento da economia em eficientes receitas para a política econômica.

Trata-se, no fundo, de dar às políticas fiscal, monetária, salarial e cambial não uma meta de inflação, mas uma meta para o Produto Interno Bruto Nominal, de forma que a sua partição entre o crescimento do PIB real e o aumento dos preços dependa da eficiência com que o poder incumbente cria as facilidades para o crescimento físico da economia.

Ao Banco Central, cabe garantir a liquidez para o cumprimento da meta do PIB nominal (PIBN). Quem tiver interesse arqueológico pode consultar o livro "Macro-Economic Policy" (London, 1989), de Weale, M.; Blake, A.; Christodoulakis, N.; Mead J. e Vines, D..

A sugestão é interessante, mas não é isenta dos mesmos grandes problemas que enfrentamos com o sistema de metas inflacionárias e a sua nova ênfase: é preciso cuidado e flexibilidade para controlar a inflação, ao mesmo tempo em que se avaliam os custos sociais das flutuações do PIB e do nível de emprego. No keynesianismo ortodoxo, a função da política econômica era manter um alto e estável nível da demanda global. Quando isso pressionasse a taxa de inflação, seria preciso utilizar políticas de rendas (salários e preços) e providenciar mudanças estruturais para eliminá-las.

No Novo Keynesianismo (de 1977), propõe-se o contrário: utilizar as políticas monetária e fiscal para manter o PIB nominal (PIBN) numa taxa de crescimento estabelecida e deixar por conta do poder incumbente as reformas estruturais das políticas de salário e de preços, para garantir que, enquanto existirem fatores de produção disponíveis, os aumentos de demanda global (PIBN) levem a um aumento do PIB real e não dos preços e dos salários.

A proposta era muito mais sofisticada e impunha uma segunda condição à política econômica: garantir um nível de investimento que leve ao crescimento da capacidade produtiva, porque - como dizem os autores -, "os formuladores da política econômica têm a tentação de controlar a taxa de inflação com expedientes que elevam o padrão de vida presente em detrimento do futuro".

O programa proposto é muito rico e no velho estilo de modelos simples e próximos da realidade. É interessante para os que aprenderam a duvidar das virtudes dos equilíbrios produzidos pelas "leis naturais do mercado perfeito" e já perderam a esperança que os "policy makers" são oniscientes e, portanto, devem ser onipotentes...

Na sua nova encarnação, a ideia de propor meta para o PIB nominal parece um "surto epidêmico", particularmente nos blogs de importantes economistas. A ideia circulou, sem repercussão, no início dos anos 80 do século passado, devido ao grande economista monetário Bennett McCallum.

Mais recentemente, tornou-se uma espécie de cruzada, depois que Scott Summer, David Beckworth e Paul Krugman a abraçaram, em seus blogs. Entre nós, o excelente economista João Marcus Marinho Nunes a vem defendendo há algum tempo e tem navegado com sucesso entre eles.

Provavelmente, esse movimento é apenas uma reação à evidente falta de imaginação das autoridades monetárias, particularmente o Fed, comandado por Ben Bernanke, que não consegue o suporte necessário de seus pares. Lembremos que o presidente Obama não conseguiu aprovar no Senado, até agora, a indicação de dois diretores do Fed. A situação está ficando muito incômoda.

Num artigo de elegância maliciosa, Christina Romer (que foi defenestrada pelos assessores econômicos de Obama da função de presidente do Council of Economic Advisers da Casa Branca) recomendava a Ben Bernanke que assuma um programa de meta de PIB nominal ("Dear Ben: It´s Time for Your Volcker Moment", "The New York Times", Oct. 29).

E, por último, a Goldman Sachs, em dois excelentes documentos ("US Economics Analyst", Oct. 12, e "Global Economics Weekly", Oct. 26), colocou a pasta de dente fora do tubo. Vai ser difícil colocá-la de volta...

Antonio Delfim Netto é professor emérito da FEA-USP, ex-ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento.