segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

Economia pede horizonte, não uma adição de pacotes


Valor Editorial 5/12

Sobressalto e balcão de favores parecem ser instrumentos consolidados da política econômica, como demonstrou o mais recente pacote de medidas do governo, anunciado na última quinta-feira, com estímulo ao crédito e a investimentos estrangeiros, somados a medidas desenhadas para o figurino de alguns privilegiados setores econômicos. Reduções de imposto válidas por curto prazo, pequeno estímulo ao crédito e benefícios a setores escolhidos sem transparência assumiram o papel de sinalizar ao setor privado a intenção expressa do governo de garantir um crescimento de 4% a 5% em 2012.

Medidas excepcionais são admissíveis e mesmo necessárias em situações excepcionais. Bom exemplo foi a reviravolta na cobrança de IOF sobre aplicações financeiras. Decidida quando o ingresso especulativo de moeda estrangeira ameaçava valorizar perigosamente a moeda nacional e sabotar a competitividade das empresas com custos em reais, tornou-se indesejável neste cenário de escassez de financiamento.

A retirada do imposto para aplicações de estrangeiros em bolsa e em títulos privados com prazo superior a quatro anos é positiva, ao tornar mais atrativo o investimento de mais longo prazo no país. Especialistas preveem que o ingresso de investimentos poderá aumentar entre US$ 5 bilhões a US$ 10 bilhões com a medida.

O pacote saiu embrulhado, porém, como medida emergencial, com correções necessárias e remendos provisórios no papel que deveria ser reservado a políticas mais claras e consistentes de estímulo ao investimento e à produção.

Em lugar de um programa profundo de revisão e desoneração de impostos, por exemplo, o já complexo, pesado e inconveniente sistema tributário ganha uma redução provisória aqui e outra ali. Produtores de trigo, pão e massas, e os fabricantes de geladeiras, fogões e outros eletrodomésticos da linha branca são presenteados com a eliminação temporária de impostos, e o governo já organiza a fila no balcão de favores avisando que os próximos poderão ser as empresas têxteis. E por que não os calçados? Ou os fabricantes de material escolar?

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, durante a entrevista de quinta-feira gracejou anunciando que, com as medidas, os brasileiros poderão comprar casas populares mais baratas, instalar nelas um fogão com menos imposto e cozinhar uma massa sem IPI. Seria o caso, então, de permitir que o contribuinte tenha confortavelmente essa refeição em móveis com isenção de tributos.

Qual, afinal, o critério do governo para proteger alguns setores e escalar a fila de candidatos a benefícios?

Seria importante ter claro que tipo de crescimento se busca com essa política. A julgar pelas declarações de autoridades, analistas e empresários favorecidos pelas medidas pontuais, o efeito real da redução de 0,5 ponto percentual do IOF sobre crédito ao consumo, por exemplo, será pequeno; sua função, no leque de medidas é "psicológica" - fazer frente ao desânimo provocado pela acumulação de más notícias neste fim de ano. O anúncio imediato de descontos de 10% nas compras à vista, por parte de empresas de varejo, parece confirmar essa tese: esse costuma ser o desconto que consumidores bons de negociação já arrancam nas lojas ao dispensar o parcelamento no pagamento das compras.

É louvável todo e qualquer esforço para estimular os ânimos dos investidores produtivos; apenas é bom ter em mente que o parque produtivo nacional, em desaceleração e carente de investimentos, necessita de economia, e não de psicanálise. Em um mundo hostil a quem deseja estabilidade e previsibilidade, a sucessão de medidas pontuais e de anúncios concluídos precipitadamente em nada contribui para traçar uma política clara de crescimento e desenvolvimento, e não estimula o desejável planejamento de longo prazo no setor privado.

O impulso ao consumo e ao crédito teve seu efeito no governo Lula, ao sinalizar para as empresas a viabilidade de investir na ampliação da produção e na aposta em mercadorias para a emergente classe média.

No cenário atual, com o perigo de uma profunda convulsão nos mercados maduros e encolhimento da economia chinesa - grande consumidora das commodities que sustentaram os resultados positivos do comércio exterior brasileiro -, o desafio da política econômica é bem maior.

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