segunda-feira, 2 de abril de 2012

Competitividade passa pela queda do preço da energia



Por Paulo Pedrosa - Valor 02/04

Vivemos nas últimas semanas com a sensação de que a crise de competitividade da indústria brasileira se instalou de repente, por problemas de câmbio ou de juros, ou até mesmo por causa das quebradeiras na Europa, e que prontamente o governo federal tratou de buscar medidas para resolvê-la e proteger o país. Esse sentimento causado pelos números do Produto Interno Bruto (PIB) só reflete, entretanto, uma situação que vem se estruturando há alguns anos.

Por mais que possam ser necessárias (em alguns casos, de produtos que chegam a nosso mercado com preços subsidiados), não será respondendo com proteções que o país vai concorrer de igual para igual no comércio mundial de forma sustentável, pois todos sabem que esses mecanismos têm efeitos colaterais importantes e são insustentáveis no longo prazo. O que a indústria quer é condição permanente de competição, suportada por ganhos contínuos de produtividade e condições favoráveis na infraestrutura nacional, o que passa necessariamente por uma redução nos custos da energia, seja elétrica ou gás natural.

A grande indústria brasileira, que alimenta cadeias econômicas inteiras e gera empregos de qualidade em todo o país, tem esses insumos entre seus maiores custos de produção. A conta de energia chega a representar mais de 50% do que algumas indústrias gastam para produzir. Tanto o governo federal como lideranças importantes no Congresso dão sinais de ter percebido essa realidade, mas é necessária atenção na forma de como conduzir o processo para se chegar à efetiva modicidade dos custos da energia.

No caso da energia elétrica, integrantes do poder executivo têm dito que é preciso um novo pacto entre Estados para a redução do ICMS. É fato, o imposto estadual tem uma alíquota de 25%, em média, sobre as contas de energia. Mas não podemos jogar o problema para uma questão que precisa de unanimidade entre todos os governadores da federação, por meio do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) e que tomará tempo para ser equacionada. Além disso, sob o ângulo da competitividade, boa parte da indústria se credita desse imposto e, portanto, reduzi-lo não trará estímulos imediatos para a retomada da produção. É só uma questão de fluxo de caixa.

Por outro lado, se a solução passasse pela redução dos encargos, que são verdadeiros penduricalhos de políticas públicas embutidos no custo da energia, e pela condução adequada da questão do vencimento das concessões, o custo da eletricidade poderia cair aproximadamente 20% e beneficiar todos os consumidores, dos residenciais à indústria, sem qualquer tipo de protecionismo ou subsídio. Além disso, automaticamente se pagaria menos ICMS, sendo este um percentual sobre as tarifas.

Um discurso recorrente de alguns membros do governo federal é que os encargos não oneram a energia elétrica. Poderia ser verdade, se o consumidor pagasse apenas o encargo de Pesquisa & Desenvolvimento e Eficiência Energética, por exemplo, que representa 1% das contas. Ou se pagasse apenas a Reserva Geral de Reversão (RGR), que soma mais 2%. Ou se pagássemos apenas a Conta de Consumo de Combustível (CCC), que representa 5%, ou somente a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), que seria 3%. Mas pagamos todos eles e, se somarmos esses exemplos, já estamos falando de 11% que o consumidor poderia pagar a menos.

E vale a pergunta: afinal, o que se faz com os recursos arrecadados por esses encargos? Essa questão deveria ser respondida com mais transparência, acompanhada de uma avaliação clara de benefícios e custos de cada uma das iniciativas incorporadas nas contas de energia.

De grande significado para evidenciar as distorções que encarecem a energia está o pagamento, pelos consumidores, de compensações aos governos dos Estados recentemente interligados à malha energética nacional pela perda do ICMS - que arrecadavam com a venda de combustível a termelétricas ineficientes. Outro bom exemplo está no contingenciamento dos recursos da Taxa de Fiscalização da Aneel - que, na prática, embute nas contas de energia uma "contribuição ao equilíbrio fiscal".

Todos os encargos foram criados com propósitos específicos, que, na maioria dos casos, se desviaram no meio do caminho. O investimento obrigatório em P&D, com o dinheiro do consumidor, não tem se refletido em ganhos que correspondam aos seus custos na cadeia do setor de energia. Com a CCC e CDE, hoje se faz política social e de desenvolvimento regional, ações que deveriam ser bancadas pelo Tesouro Nacional, portanto pelo contribuinte e não pelo consumidor. A RGR, por sua vez, foi criada para pagar a reversão de concessões. Se elas vão ser renovadas, como já indicou o governo, o encargo não tem mais razão de existir e os quase R$ 20 bilhões desse fundo deveriam voltar para os consumidores. Além disso, o tratamento das concessões que vencem poderia reduzir em até 10% o custo da energia.

E o que se dizer do Encargo de Serviços do Sistema, para pagar o combustível de quando se aciona algumas termelétricas, e do Encargo da Energia de Reserva? Os dois servem para dar segurança ao sistema, mas não consideram alternativas mais eficientes de equilibrar oferta e demanda. Além disso, seus custos são distribuídos a todos os consumidores - inclusive aos que já pagaram pela segurança em contratos de longo prazo -, enquanto seus benefícios se concentram em alguns agentes do mercado, justamente aqueles cujo comportamento pode estar colocando o sistema em risco.

Obviamente a indústria quer uma reforma tributária que envolva a redução do ICMS da energia. Mas precisa sobreviver para poder participar dessa discussão.


Paulo Pedrosa é presidente-executivo da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace).

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