sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Os 100 anos da China moderna


Por Jean-Pierre Lehmann e Turpin Dominique
Ninguém no planeta Terra poderia ter imaginado em seus sonhos mais tresloucados a trajetória que a China traçou. O foco estava em outro lugar quando nós dois concluímos nosso PhD no Japão. Eu, Jean-Pierre, no fim dos anos 60, quando o "milagre econômico" japonês estava em plena floração, o Japão tinha ultrapassado o PIB alemão e a China estava no estertores da Revolução Cultural; Dominique, no início dos anos 80, quando a economia japonesa parecia estar operando sob a influência de esteróides anabolizantes, os investimentos japoneses vertidos no exterior para comprar o Rockefeller Centre ou a Columbia Studios, enquanto o programa reformista inicial da China estava em andamento.

Diferentemente da Índia, da maior parte do Sudeste Asiático (com exceção unicamente da Tailândia), da maior parte da África e do Oriente Médio, a China - em sentido estrito - não tinha sido colonizada. Nas palavras de Sun Yat-Sen, líder da revolução republicana chinesa de 1911, cujo centenário se comemorou no dia 10, a China havia se tornado uma "policolônia". Em outras palavras, não havia um senhor colonial direto e único, como na Indonésia (holandeses), Indochina (franceses), Índia (britânicos), Filipinas (americanos), mas todas as potências imperialistas, grandes e pequenas, exerciam poder de exploração colonial indireto sobre a China.

À medida que o mundo foi mudando, a corte imperial em Pequim recusou-se a mudar. Em flagrante contraste com o Japão, a modernização e as reformas foram basicamente rejeitadas. No fim do Século XIX e início do Século XX, quando a China continuou sofrendo humilhação após humilhação, alguns intelectuais chineses com visão de futuro, Sun Yat-Sen entre eles, reconheceu que a China tinha de mudar, tinha de se adaptar a esse mundo dominado pelo Ocidente, tinha de absorver e adotar suas instituições econômicas, científicas e políticas. Esse era um imperativo para sobrevivência, e não um luxo! A primeira revolução moderna chinesa data de 10 de outubro de 1911, quando foi derrubada a velha ordem imperial que tinha existido durante milênios.

As coisas, porém, não avançaram sem problemas, para dizer o mínimo. Entre 1911 a 1º de outubro de 1949 - data em que Mao Tse Tung "libertou" a China, concretizando, assim, a segunda revolução da China moderna - o país foi abalado por guerras com outros países, invasões japonesas, guerras civis, pobreza generalizada, corrupção endêmica, hiperinflação e colapso governamental. Sob o comando de Mao (1949-1976) a China recuperou sua soberania, mas permaneceu isolada da economia internacional. Foi enquanto Dominique fazia seu doutorado e o mundo político, empresarial e econômico estava focado no (obcecado pelo?) Japão que ocorreu uma tranquila terceira revolução moderna chinesa, embora pouco notada naquele momento. Isso foi em 1978, quando sob a liderança de Deng Xiaoping a China embarcou naquela que foi provavelmente a mais profunda e dramática revolução econômica desde a revolução industrial. Um século mais tarde, os sonhos dos modernizadores chineses - pelo menos no campo econômico - foram muito mais do que concretizados. A China é um ativo ator mundial - em grande estilo!

Segundo um artigo anterior (www.imd.org/research/challenges/TC057-11.cfm), a China tem cada vez mais poder na hierarquia mundial. Não é a mais importante potência do planeta, o primeiro posto ainda é ocupado pelos EUA e provavelmente assim será por algum tempo, mas sua influência mundial se estende a praticamente todos os recantos - nas economias tanto do mundo desenvolvido como em desenvolvimento.

Isso não quer dizer que nas próximas décadas o voo será em céu de brigadeiro. A China defronta-se com muitos problemas sociais, econômicos, ambientais e políticos. Além disso, embora seu poderio econômico seja visto cada vez mais como hercúleo, seu poder de influência geral é fraco. Embora os laços comerciais sejam fortes, há poucos países com os quais a China tem relações políticas cordiais. Os vizinhos temem que agora que a China modernizou-se inteiramente, possa reverter a seus costumes tradicional, em particular ao sistema de "Estado tributário" - uma espécie de arranjo feudal em que os governantes de todos os países vizinhos devam fidelidade e reverência ao governante chinês.

Evidentemente, é difícil prever o que vai acontecer. Mas precisamos ter uma visão. Nossa visão é de que o processo de reforma continuará. Os líderes chineses, inclusive os membros mais antigos do Partido Comunista Chinês, admitem que novas reformas econômicas não terão sucesso se não vierem acompanhadas de reformas políticas e sociais. Eles compreendem que a ascenção especialmente da classe média chinesa urbana - as pessoas que mais se beneficiaram e contribuíram para a terceira revolução - exige mais responsabilidade e transparência. Na frente política externa, os chineses sabem muito bem que no passado as potências econômicas emergentes mundiais tornaram-se imperialistas e travaram guerras. Mas, argumentam os chineses, não apenas essas potências eram ricas, com também o eram seus povos. A China é o primeiro caso de uma potência econômica mundial com uma população ainda pobre. A China é a segunda maior potência econômica mundial em termos de PIB agregado, e, de acordo com o FMI, em breve (2016) assumirá a primeira posição, mas ocupa a 98ª posição em termos de PIB per capita! Assim, afirma a liderança chinesa, a China está engajada em desenvolvimento pacífico, pois terá de continuar a construir sua economia nacional e sua sociedade.

Os chineses continuam muito interessados em aprender, como vemos no IMD, e prova disso são os executivos chineses que vêm estudar aqui. No ano passado, o número de executivos chineses estudando no IMD ultrapassou o número de japoneses. Enquanto o número de alunos japoneses diminuiu, o número de participantes chineses está crescendo. Por essas razões, como escola de negócios, estamos também convencidos de que a China será um fator chave não só no terreno mundial dos negócios como em inovação empresarial. A estratégia do IMD é engajar-se com a China diante do pano de fundo desses cenários e contribuir no que pudermos para o desenvolvimento pacífico e a prosperidade chinesas, o que por sua vez terá um grande impacto positivo no desenvolvimento pacífico e na prosperidade do mundo.

Hoje não apenas há muito a comemorar, como também, acreditamos, muito a esperar do futuro! (Tradução Sergio Blum)

Jean-Pierre Lehmann é professor de Economia Política Internacional no IMD, fundador do Evian Group @ IMD e pesquisador sênior no Instituto Global Fung, em Hong Kong.

Dominique Turpinn é professor e presidente da IMD

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