segunda-feira, 6 de agosto de 2012

O limitado poder de escolha dos EUA



Por Mohamed A. El-Erian - Valor 06/08

Acrença geral sobre as eleições presidenciais de novembro nos Estados Unidos está apenas em parte correta. Sim, as questões econômicas terão grande papel na determinação do resultado. O passo seguinte no argumento - de que o vencedor de uma disputa cada vez mais detestável poderá dar-se o luxo de buscar políticas significativamente diferentes do oponente - é, no entanto, muito mais duvidoso.

Quando o próximo mandato presidencial começar, em janeiro de 2013, ao contrário dos atuais discursos nas campanhas de Obama e Romney, o mandatário se verá com espaço limitado para manobrar a política econômica. De fato, as possíveis diferenças para os EUA estão em outros fatores e ainda precisam ser compreendidas pelos eleitores. Elas concentram-se nas políticas sociais que acompanharão um conjunto de medidas econômicas em grande medida similares; e, aqui, as diferenças entre os candidatos são cruciais.

Seja quem for o vencedor, se deparará com uma economia crescendo a um vagaroso ritmo de apenas 2%, ou menos, por ano, com o incômodo risco de completa estagnação. O desemprego ainda estará alto demais e quase metade disso será de difícil reversão, a chamada falta de emprego de longo prazo.

O aspecto financeiro da economia também será fonte de preocupação. O déficit fiscal continuará a flertar com a faixa dos 10% do Produto Interno Bruto (PIB), intensificando os receios quanto à dinâmica de médio prazo dos títulos de dívidas do país. O setor bancário ainda estará "livrando-se [de investimentos] de risco", limitando o fluxo de crédito para pequenas e médias empresas e afetando as contratações e investimentos em fábricas e equipamentos. E as famílias terão percorrido apenas em parte sua dolorosa fase de desalavancagem.

O front das políticas econômicas será igualmente inquietante. Depois ter brigado e hesitado por tempo demais, o Congresso dos EUA encontrará cada vez mais dificuldade para adiar medidas que enfrentem esses desafios. Enquanto isso, o incomum ativismo do Federal Reserve (Fed, autoridade monetária dos EUA), incluindo uma crescente lista de medidas experimentais, vai render poucos benefícios e acarretar riscos e custos cada vez maiores.

A economia dos EUA também estará operando em meio a um cenário internacional mais difícil. Nos próximos meses, a crise da dívida europeia, com muita probabilidade, se agravará. Com as economias emergentes (incluindo a China) em desaceleração e com a falta de ações adequadas de coordenação política multilateral estendendo-se por mais tempo, as pressões protecionistas vão crescer à medida que as principais potências do comércio exterior passarem a concorrer por um bolo que deixou de crescer.

Portanto, independentemente de o presidente Barack Obama ou Mitt Romney ganharem em novembro, o próximo presidente se verá limitado pelas necessidades "gêmeas" de estabilização econômica premente e de reformas de longo prazo. E, com os ventos contrários vindos da Europa e da desaceleração mundial sincronizada, os candidatos não terão escolha a não ser adotar, pelo menos de início, políticas econômicas similares para restaurar uma criação de empregos dinâmica e a estabilidade financeira.

Para encontrar o equilíbrio certo entre estímulos econômicos imediatos e sustentabilidade fiscal de médio prazo, a medida mais urgente será conter apropriadamente o chamado "abismo fiscal" - quando acabem as reduções temporárias de impostos e passem a valer automaticamente profundos cortes generalizados de gastos públicos - que se aproxima.


São necessárias reformas orçamentárias sérias no médio prazo para lidar com o legado dos sucessivos erros do Congresso. E, caso seja abastecido com números realistas, o próximo presidente logo perceberá que a combinação adequada de reformas nos impostos e nos gastos recai em uma faixa muito mais estreita de possibilidades do que os discursos políticos rivais da atualidade sugerem.

As reformas fiscais funcionam melhor em economias dinâmicas. Com essa ideia, Obama e Romney precisarão levantar os impedimentos ao crescimento e à criação de empregos.

Isso, no entanto, não significa que não há espaços para diferenças. Há; e elas refletem o fato de que as tendências econômicas gerais serão acompanhadas de dinâmicas com diferentes velocidades nas mais variadas esferas.

Depois de uma "era" de alavancagem excessiva, emissão de dívidas e facilidade de crédito que culminou com a crise financeira mundial de 2008, os EUA ainda se deparam com o complicado desafio de lidar com perdas acumulativas que inibem continuamente os investimentos, empregos e competitividade. Até agora, a excessiva polarização política no Congresso traduziu-se em uma abordagem que empurrou ainda mais os encargos do ajuste sobre aqueles que têm menos capacidade para suportá-lo.

Em um mundo ideal, o próximo presidente dos EUA rapidamente embarcaria em uma estratégia de dois passos para recuperar o dinamismo do emprego e a solidez financeira. Primeiro, elaboraria um conjunto abrangente de iniciativas de política econômica que sejam tanto desejáveis como viáveis - e, de novo, o espaço para diferenças substanciais aqui é limitado. Segundo, acompanharia isso com um conjunto explícito de políticas sociais que resolva a necessidade de compartilhar de forma equitativa os encargos.

Esta não é realmente uma eleição sobre temas polêmicos como transferência de produção ao exterior ou discussões acaloradas como aumento de impostos versus reformas nos benefícios sociais; controle da produção pelo governo versus atividade irrestrita do setor privado; ou criadores de empregos versus "aproveitadores" da ajuda do Estado. Trata-se muito mais dos conceitos que acompanham esses temas, como justiça social, benefícios sociais, igualdade e, sim, padrões de comportamento para uma sociedade rica e civilizada.

Esta é uma eleição sobre responsabilidade social - a obrigação da sociedade de ajudar aqueles que estão em dificuldade, por culpa de outros, a encontrar empregos e a ter o suficiente para suas despesas. É sobre a reforma de um sistema de ensino que não atende apropriadamente a juventude americana. Entre as várias questões de justiça e igualdade, esta é uma eleição sobre os ricos devolvendo algo ao sistema que lhes trouxe uma riqueza inimaginável.

É aqui que as diferenças entre Obama e Romney são importantes. Quanto antes os debates da campanha se voltarem a isso, maior a probabilidade de que os americanos venham a fazer uma escolha estando mais bem informados e, portanto, se envolvam no esforço coletivo necessário para acabar com as mazelas que afetam o país.



Mohamed A El-Erian executivo-chefe e codiretor-executivo de informações da PIMCO, é autor de "When Markets Collide" (quando mercados colidem, em inglês). Copyright: Project Syndicate, 2012.



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