quarta-feira, 1 de agosto de 2012

A China e a desaceleração



Por Yu Yongding - Valor 01/08

O crescimento anual do Produto Interno Bruto (PIB) da China desacelerou-se de 8,1% no primeiro trimestre para 7,6% no segundo, a menor expansão desde o mesmo período de 2009. Os dados recém-divulgados sobre a expansão podem ter dissipado os temores de uma aterrissagem forçada da China, mas mesmo assim levaram muitos a argumentar que a China precisa estimular mais sua economia para garantir um crescimento anual de 8%.

Desde o início de 2010, o governo chinês apertou sua política monetária para conter a inflação e evitar bolhas nos preços das propriedades. Como resultado, a inflação caiu para 2,2% em junho, menor patamar em 29 meses, e os preços residenciais, cujos dados oficiais a Agência Nacional de Estatísticas infelizmente deixou de divulgar, parecem estar se estabilizando e podem até ter recuado, ainda que de forma moderada.

A desaceleração do índice de crescimento da China é, até certo ponto, reflexo do sucesso dos esforços do governo para domar a bolha do setor imobiliário, assim como de outras políticas voltadas ao reequilíbrio da economia. O crescimento dos investimentos em projetos imobiliários, que representam diretamente mais de 10% do PIB, caiu 16,3 pontos percentuais no primeiro semestre de 2012 em comparação com o mesmo período do ano anterior. Isso levou a uma desaceleração nos investimentos em muitos setores relacionados como os de materiais de construção, móveis e eletrodomésticos, o que, por sua vez, levou a expansão anual nos investimentos em ativos fixos a cair de 25,6% para 20,4%.

A tendência de consumo das famílias está menos clara. Muitos economistas, entretanto, encontraram evidências de que o crescimento no consumo das famílias no primeiro semestre foi maior do que mostraram os dados oficiais.

A desaceleração da economia em 2012 deveria ter sido antecipada em 2011 pelo governo. No início de 2012, em seu discurso na abertura da sessão anual do Congresso Nacional do Povo, o governo explicou por que a meta indicativa de expansão econômica do governo em 2012 era de 7,5%, destacando que o objetivo era "guiar as pessoas de todos os setores a focar seu trabalho na aceleração da transformação do padrão de desenvolvimento econômico e tornar o desenvolvimento econômico mais sustentável e eficiente".

Na verdade, para poder criar uma margem de espaço adequada para mudar o padrão de crescimento centrado no PIB, o 12º Plano Quinquenal da China fixou uma meta de crescimento anual de 7% do PIB para o período entre 2010 e 2015.
A taxa de investimentos na China está em cerca de 50% do PIB, contando os 10% de investimentos do setor imobiliário. Tendo em vista o predomínio de construções que se duplicam e o desperdício generalizado, a eficiência dos investimentos vem se deteriorando rapidamente. Com um índice de crescimento anual de 10%, ter uma taxa de investimentos de 50% implica um quociente de cinco entre capital e produção, o que é extraordinariamente alto em relação a outros países.
A taxa de consumo na China é de 36%. Embora os dados do governo não sejam inteiramente confiáveis, esse número é simplesmente muito baixo. Enquanto volumes imensos de dinheiro vêm sendo despejados na infraestrutura física, os gastos públicos em capital humano e segurança social estão abaixo da média mundial. Mais recursos deveriam ser realocados da formação de capital físico para a formação de capital humano.

Graças aos persistentes superávits em conta corrente e conta de capital obtidos por 20 anos, a China acumulou US$ 3,2 trilhões em reservas internacionais. A China, no entanto, com seus gigantescos ativos líquidos internacionais, possui déficit na conta de renda de investimentos. Desde 2008, o superávit em conta corrente caiu de forma significativa. Ainda assim, o país exibe esses superávits "gêmeos" e há as dúvidas persistentes se a queda é estrutural ou cíclica.

De fato, a China precisa acelerar seu ajuste econômico, mesmo que à custa do crescimento. De outra forma, terá de pagar um custo ainda maior com um ajuste no futuro.

Por muitos, anos, o governo manteve uma meta implícita de crescimento mínimo de 8% por ano, o que era considerado necessário para criar dez milhões de empregos anuais. Variações demográficas e outras mudanças estruturais, contudo, podem ter alterado as condições do mercado de trabalho: até agora, apesar do crescimento inferior a 8%, parece haver poucos sinais de problemas.

A questão agora é se o governo se deixará inquietar pelo desempenho trimestral mais fraco dos últimos três anos e lançará algum grande pacote de estímulo, com as consequências que a China experimenta quando tais medidas são adotadas.

"Deveríamos continuar adotando políticas fiscais pró-ativas e uma política monetária prudente, enquanto damos maior prioridade à manutenção do crescimento", disse o primeiro-ministro Wen Jiabao recentemente. Além disso, nos últimos meses, o governo aprovou alguns grandes projetos siderúrgicos e energéticos, e mais anúncios do tipo devem estar por vir.

Sem dúvida, é acertado que governos respondam a mudanças nas circunstâncias no momento oportuno. A desaceleração no crescimento anual para 7,8% no primeiro semestre de 2012, no entanto, não justifica uma mudança da direção das políticas econômicas. A China precisa escolher entre um crescimento maior ou um ajuste estrutural mais rápido. Não pode ter os dois ao mesmo tempo. Diante da atual desaceleração, a China pode dar-se ao luxo, ao menos por enquanto, de manter o rumo. (Tradução de Sabino Ahumada).



Yu Yongding é ex-membro do comitê de política monetária do Banco do Povo da China e ex-diretor do Instituto de Economia e Política Mundial, da Academia Chinesa de Ciências. Copyright: Project Syndicate, 2012.



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