quinta-feira, 3 de novembro de 2011
Uma bomba-relógio "made in China"
Por Eduardo Campos - Valor 03/11
As atenções estão voltadas ao encontro do G-20 e como lidar com a Grécia e suas peripécias. Mas, se ampliarmos um pouco mais o foco, há coisas acontecendo do outro lado do mundo com potencial destrutivo que, por ora, parece subavaliado.
Os últimos indicadores de atividade confirmam uma redução no ritmo de crescimento da China. Mas enquanto os economistas discutem se o monstro asiático terá um "pouso suave" ou "pouso forçado" eventos bastante interessantes passam quase despercebidos.
Entre eles, os alertas sobre um possível colapso do "shadow banking" chinês. Em recente relatório, economistas do Credit Suisse falaram sobre a possibilidade de problemas nesse obscuro mercado de empréstimos informal que funciona por lá e movimenta mais de US$ 620 bilhões.
Esse mercado de empréstimo paralelo tem diversas fontes, como "trade finance", a criação de "trusts" e até mesmo estatais com acesso a crédito barato, que funcionam como intermediários de empréstimos em um mercado que tenta burlar os limites na concessão de crédito impostos pelo Banco da China no mercado oficial.
Recente reportagem do "Financial Times" também chamou atenção para a questão, mostrando que empresas com excesso de caixa, como PetroChina e ChinaMobile possuem braços financeiros e apontou que mais de 64 empresas não financeiras emitiram empréstimos em 2011 até o fim de agosto (levantamento do diário China Economic Daily).
Não que o BC chinês não tenha conhecimento disso. De fato, algumas medidas para conter o crescimento desse mercado foram anunciadas recentemente. Mas para os analistas do Credit Suisse, o "shadow banking" chinês é uma bomba-relógio, com potencial destrutivo superior ao da crise de endividamento soberano europeu.
A questão fica mais complexa ao sabermos que mais da metade dos fundos gerados nesse sistema paralelo vai para o mercado imobiliário, onde poucos refutam a existência de uma bolha.
O mercado imobiliário tem cara de mania na China, país que nunca passou por um período de expansão imobiliária de tais proporções. A ideia que sempre alimenta as bolhas é que os preços vão subir para sempre (miopia do desastre). Mas os fatos começam a desafiar essa visão turva da realidade.
Os preços começaram a cair em algumas localidades e os compradores estão protestando. Isso mesmo. Semana passada centenas de mutuários protestaram contra a queda de preço de imóveis em Shanghai e outros lugares.
Segundo o China Business News, a redução da demanda leva a corte de preços de 20% em alguns empreendimentos.
O Shanghai Daily deu um exemplo bom do que está acontecendo e porque centenas de chineses estão invadindo empresas e stands de venda e exigindo restituições. Um empreendimento que custou cerca de US$ 2.600 o metro quadrado um ano atrás estava sendo vendido por 30% menos neste ano. Quem pagou preço cheio não está nada contente.
Isso sem falar nas notícias de gigantescos empreendimentos vazios e a existência de "cidades fantasma" em algumas regiões.
Fora do setor imobiliário, há a questão do endividamento das províncias, que também se refestelaram nessa farra de crédito intensificada após a crise de 2008, quando o BC chinês afrouxou seus controles.
Toda a exuberância chinesa dos últimos anos sustentou e ainda sustenta boa parte da economia mundial. Brasil inclusive, via explosivos preços de commodities (ganho nos termos de troca) e produtos de consumo barato (amenizando descompasso entre oferta e demanda).
Agora, o que aconteceria caso a China dobrasse sob o próprio peso? Como o Partido Comunista reagirá a uma típica explosão de bolha de crédito capitalista? Melhor nem pensar.
Para refrescar a memória depois do feriado: na terça-feira, o dólar teve novo pregão de firme alta. No mercado à vista o preço subiu 1,93%, para R$ 1,737. Em dois pregões a moeda americana já ganhou 3,15%.
No mercado de juros, as taxas fecharam praticamente estáveis. Falta incentivo para o investidor ampliar as apostas de corte na Selic. Por ora, os contratos sugerem três reduções de meio ponto percentual como "preço justo".
Eduardo Campos é repórter
E-mail eduardo.campos@valor.com.br
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