sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Salvar o euro e esquecer a Grécia


Por Philip Stephens - FT Valor 07/10

É hora de deixar a Grécia partir. Não proponho pisar nos dedos do governo de Atenas num momento em que ele se agarra à beira do precipício, mas chegamos ao ponto em que esperar o melhor convida a calamidade. A Europa necessita um plano para administrar a tragédia grega.

A zona do euro tem dois conjuntos de problemas. O primeiro gira em torno da insolvência da Grécia, da fragilidade de Portugal, Espanha e Itália, e das tensões nos bancos da Europa. O segundo é a extrema fragilidade fiscal e competitiva das economias fora do núcleo. Enfrentar o primeiro, por si só, não resolverá o segundo. Mas é um ponto de partida necessário.

A decisão premente é sobre o momento e os termos da moratória grega. É possível que os políticos ainda tenham uma escolha entre reestruturação ordeira e um colapso caótico que rapidamente engolfaria todos os outros. Possível, mas não garantido. Quanto mais os governos ficarem discutindo sobre como blindar outras economias periféricas e isolar o sistema bancário, mais as chamas se alastrarão descontroladamente pelo continente.

A Grécia deveria receber a próxima parcela de sua atual linha de socorro financeiro. O governo de Atenas vem demonstrando sua longamente aguardada determinação em reduzir seu déficit. Mas no longo prazo os números não batem e a política grega, como vimos, em vista da greve geral nesta semana, não está melhorando. A zona do euro tem algumas semanas - talvez alguns meses - para produzir o que os políticos eufemisticamente denominam programa de reestruturação.

O leitor ainda pode encontrar autoridades econômicas europeias que defendem o contrário. Em sua maioria, estão em Berlim. Angela Merkel diz que não tomará decisões pressionada pelos mercados. Considere o saneamento das contas públicas da Bélgica na década de 1990, acrescentam assessores de Merkel. Consideremos o progresso notável da Irlanda na estabilização de sua posição. Com margem para respirar e vontade política, a Grécia poderia fazer o mesmo.

Não creio que eles realmente acreditem nisso. Tendo em vista seu endividamento, orçamento e déficits em conta corrente, e sua lamentável ausência de competitividade, a Grécia não tem como escapar da armadilha da dívida. Austeridade em cima de austeridade simplesmente matará o paciente.

Até agora, a estratégia tácita da zona do euro, se é que há algo que mereça essa designação, tem sido adiar o dia do juízo final. Mantenhamos a Grécia à tona por alguns anos e o resto da zona do euro estará suficientemente robusto para resistir ao choque de um default.

Se aliviarmos as condições para Atenas, agora, continuam advertindo as autoridades alemãs, Portugal e a Espanha acreditarão que serão poupados do pior. Depois, há a Itália, tão politicamente disfuncional quanto economicamente conturbada. Negociar com Silvio Berlusconi é impossível nos melhores momentos. Este não é o momento para dar a ele desculpas para inação.

Evitar o risco moral é um bom princípio. Mas também pode ser perigoso. O Banco Central Europeu (BCE) é zeloso de sua credibilidade e de sua missão. Jean-Claude Trichet, o presidente do BCE, disse novamente, nesta semana, que os governos devem assumir a responsabilidade pela crise em vez de jogá-la no colo do BCE. Em tese, ele provavelmente está certo. Mas regras devem, às vezes, ser desrespeitadas. A credibilidade do BCE não valerá grande coisa, caso se torne o epitáfio do euro.

O Plano A baseou-se na premissa de que a Grécia pode, com segurança, ser posta em quarentena. Crescimento econômico, um sistema bancário recapitalizado e melhorias tangíveis nas finanças públicas de outros países periféricos trariam a zona do euro de volta a boas condições de saúde. Só então poderíamos permitir um default grego.

Tendo em vista a evolução dos acontecimentos, a dinâmica não poderia ter sido mais distinta. A incapacidade de lidar com a Grécia enfraqueceu o restante da zona do euro, viu o contágio se alastrar até a Itália e expôs a fragilidade dos bancos franceses e alemães.

O resultado é o que se pode denominar loop reverso. A crise da dívida soberana nasceu da crise bancária. E agora está alimentando uma segunda crise bancária. O rebaixamento, nesta semana, da classificação de crédito italiana, e os problemas no Dexia, um banco franco-belga, foram apenas os mais recentes capítulos.

O gerenciamento de uma moratória não será fácil nem isento de riscos. Os políticos vivem com o pesadelo do colapso do Lehman Brothers. Com razão. Não pode haver garantia de que o efeito de um desconto contábil de, digamos, 50% ou 60% na dívida da Grécia possa ser perfeitamente contido. O que é certo, porém, é que um calote desordenado provocará caos econômico e financeiro. Às vezes, como costumava dizer um primeiro-ministro britânico sobre duras decisões econômicas, não há alternativa.

Nada há de misterioso sobre o que precisa ser feito para atenuar os riscos. Primeiro, é necessária uma recapitalização coordenada dos bancos e uma quadruplicação, para cerca de € 2 trilhões, do poder de fogo do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira. Isso exige uma disposição, por parte do BCE, de aceitar que a salvação do euro é mais importante do que manter sua missão de controlar a inflação.

Os mercados precisam ser persuadidos de duas coisas: a zona do euro dispõe dos recursos para enfrentar qualquer eventualidade, e, mais importante, os governos irão mobilizar esses recursos. O gerenciamento de um default grego precisa ser apresentado como uma medida da vontade política da Europa de fazer tudo o que for preciso para sustentar a moeda única.

E então, a pergunta: deve a Grécia permanecer no euro? A resposta é sim - por ora. Na Espanha e em Portugal, a Europa tem sido vista como o caminho para a modernidade. A Grécia não fez o esforço. A moratória não absolverá a Grécia da necessidade de reformar suas instituições e de modernizar sua economia. Se os gregos não o fizerem, mais cedo ou mais tarde serão forçados a abandonar o euro. Mas essa seria, então, uma escolha da Grécia. (Tradução Sergio Blum)

Philip Stephens é editor e comentarista político do FT.

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