quinta-feira, 27 de outubro de 2011

O impasse econômico americano


Por Martin Feldstein - Valor 27/10

Os EUA parecem aprisionados em perigoso impasse econômico. A recusa de republicanos e democratas em ceder terreno na questão do orçamento está impedindo o governo de enfrentar seu enorme déficit fiscal e rápido aumento da dívida nacional. De fato, projeções do Birô de Orçamento do Congresso sugerem que a dívida nacional poderá aumentar para 82% do PIB nos próximos dez anos - mais que o dobro da taxa de endividamento em 2008.

Essa previsão, além disso, é baseada em premissas bastante otimistas de forte crescimento econômico e juros baixos. Com crescimento mais lento e taxas de juro mais normais, a taxa de endividamento poderia facilmente ultrapassar 100% em 2021 e superar 150% em torno de 2030.

Uma importante razão para o crescimento acelerado da dívida pública é o rápido envelhecimento da população americana e o consequente aumento do custo de pensões universais e dos programas de saúde - Seguridade Social e Medicare. A maioria dos especialistas acredita que limitar o crescimento da dívida exigirá retardar o crescimento desses programas de "direitos sociais" e elevar os impostos como proporção do PIB.

Mas o presidente Barack Obama e os democratas no Congresso opõem-se a qualquer redução futura nos programas de direitos sociais, ao passo que os candidatos presidenciais republicanos e a bancada parlamentar do seu partido opõem-se a qualquer aumento das receitas tributárias. O resultado é o atual impasse em torno da redução do déficit fiscal e da reversão do crescimento da dívida nacional.

Os republicanos argumentam que o crescimento da dívida nacional deveria ser contido apenas cortando os gastos do governo. Embora alguns cortes nos gastos tradicionais devam fazer parte dos esforços para conter as despesas, essa abordagem deve ser complementada pela redução das renúncias tributárias - "despesas tributárias", ou provisões especiais do código tributário que subsidiam o sistema de saúde, financiamento habitacional, impostos de governos locais etc. Uma limitação das renúncias tributárias poderia reduzir o déficit anual em até 2% do PIB, reduzindo, assim, a relação dívida/PIB em 2021 em mais de 25 pontos percentuais.

Os republicanos geralmente rejeitam essa forma de redução de gastos, porque dela resultam receitas tributárias adicionais. Embora esse método de fato aumente a receita total, o efeito econômico de limitar as renúncias tributárias é igual ao previsto em qualquer outro método de corte de gastos nesses programas. Mas a oposição dos republicanos a qualquer medida que amplie a receita significa que essa chave para o rompimento do impasse em torno do orçamento não será implementada.

O custo orçamentário das pensões de Seguridade Social poderia ser reduzido gradualmente substituindo parte dos atuais benefícios financiados por impostos por anuidades geradas por contas de aposentadoria pessoais baseadas em investimentos. Porém, apesar de esse tipo de reforma ser capaz de manter os níveis de renda dos aposentados, os democratas a ela se opõem, porque reduz os tradicionais benefícios proporcionados pelo governo. Isso reforça o impasse.

As posições de linha-dura nos dois partidos adiantam qual será o embate nas próximas eleições parlamentar e presidencial em novembro de 2012. Os republicanos, na prática, exibem aos eleitores um cartaz dizendo: "Não vamos aumentar seus impostos, mas os democratas vão". O cartaz dos democratas, ao contrário, diz, "Não vamos reduzir sua pensão ou benefícios de saúde, mas os republicanos vão".

Nenhum dos campos quer nenhuma ambiguidade em sua mensagem antes da eleição, descartando, assim, a possibilidade de qualquer mudança imediata em tax ex renúncias tributária ou em futuras pensões da Seguridade Social. Mas, pela mesma razão, estou otimista quanto ao fim do impasse após a eleição. Nesse momento, tanto republicanos como democratas terão condições de aceitar reformas que têm de rejeitar agora.

Outra rota pós-eleição para redução do déficit seria baixar as taxas marginais de imposto e compensar essa perda de receita com eliminação de renúncias tributárias. Análises oficiais dizem não ser tão importante o efeito da redução das taxas marginais de imposto sobre a renda tributável, mas a experiência mostra que a renda tributável aumenta substancialmente à medida que os contribuintes reagem às taxas marginais mais baixas trabalhando mais, apropriando-se mais de sua remuneração na forma de dinheiro tributável do que em benefícios extras e reduzindo seu consumo dedutível de impostos. A redução da renúncia tributária, paralelamente à redução das taxas de imposto marginal, pode produzir receitas substanciais ao elevar o nível de renda tributável.

O impasse econômico atual é preocupante porque os mercados financeiros poderiam reagir negativamente e porque atrasos em atacar o déficit fiscal implicam aumento da dívida nacional. Posso estar otimista demais, mas acho que há boas razões para acreditar que o impasse em torno do orçamento atual reflete uma postura eleitoral, e que o sistema político americano irá revelar-se mais eficaz em fazer progressos no campo da consolidação fiscal, depois que a eleição tiver ficado para trás. (Tradução Sergio Blum)

Martin Feldstein é professor de economia em Harvard, foi presidente do Conselho de Assessores Econômicos do presidente Ronald Reagan e presidente do National Bureau for Economic Research. Copyright: Project Syndicate, 2011.

www.project-syndicate.org

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