terça-feira, 5 de junho de 2012
Resposta para a perplexidade com PIB fraco é mais ação
Por Antonio Delfim Netto - Valor 05/06
Uma das maiores lições do exercício da política econômica é que é absolutamente inútil brigar contra os números, por mais desagradáveis que sejam. O resultado da apuração do PIB brasileiro, 0,2% no primeiro trimestre de 2012, com relação ao quarto trimestre de 2011, não pode deixar de produzir perplexidade e preocupação.
Como insistiu o ministro Mantega, ele é "passado". Não podemos e não devemos considerá-lo como uma indicação do "futuro", porque o governo não ficará indiferente a ele. Entretanto, a situação que estamos vivendo já quase no final do segundo trimestre não é alentadora. Nada parece indicar que o PIB, com relação ao primeiro trimestre, crescerá alguma coisa muito diferente de 0,5%. O primeiro semestre parece praticamente fixado. Como terminaremos 2012?
Suponhamos, apenas para argumentar, que a resposta dos agentes econômicos às medidas já tomadas (e às que certamente virão) permita que a taxa de crescimento do PIB no terceiro trimestre sobre o segundo seja de 2% e que a do quarto sobre o terceiro, seja de 1,5%. Qual seria a taxa de crescimento de 2012? Em torno de 2,1%! O fator amenizador desse fato é que entre o quarto trimestre de 2011 e o seu homólogo de 2012 a economia estaria rodando em torno de 4%, como afirmou o ministro.
Existem infinitas combinações de taxas de crescimento para os trimestres 3º/2º e 4º/3º, que produziriam um crescimento de 2,7% em 2012, que hoje parece ser o objetivo do governo.
Chamemos de m3 a taxa de crescimento do terceiro trimestre sobre o segundo, e de m4 a taxa de crescimento do quarto trimestre em relação ao terceiro. Dado o objetivo de 2,7%, elas estão ligadas por uma relação muito simples:
m4 = (0,08 - 2m3) / (1 + m3), que é apresentada no gráfico acima. No exercício, tanto m3 como m4 são números positivos (supomos que a economia vai crescer).
Isso deve necessariamente ocorrer se a soma de estímulos aos investimentos públicos e privados for significativa, se o crescimento do crédito continuar para sustentar um aumento da demanda e se a queda da taxa de juros real ajudar a manter uma taxa de câmbio em nível que melhore as exportações "líquidas", isto é, reduza o déficit em contas correntes, o que aumentará o PIB.
O gráfico mostra que nos extremos, com m3 = 0, o m4 deveria ser de 8%. Em português claro, para atingir um crescimento do PIB em 2012 com relação a 2011 de 2,7% (o mesmo de 2011/2010), o crescimento do 4º/3º trimestre, teria de ser de 8%, se o crescimento do 3º/2º for zero.
Por outro lado, com um crescimento de m3 = 4%, o m4 poderia ser nulo. Um resultado menos exótico é que o mesmo crescimento do PIB poderia ser obtido com m3 = 3% e m4 = 1,94%. Esses números mostram o tremendo esforço que precisará ser feito para o PIB de 2012 atingir os 2,7% de 2011. Se ele tiver sucesso, a economia estará rodando em torno de 5,8% ao ano quando compararmos o quarto trimestre de 2012 com seu homólogo de 2011, o que não será isento de alguns problemas.
Se o 0,5% for de fato confirmado (o que, infelizmente, só saberemos em agosto), o desafio para que o PIB cresça em 2012 o mesmo que em 2011 parece ter pouca probabilidade de sucesso. A ação por precaução, entretanto, recomenda uma imediata e importante mobilização dos investimentos públicos através de parcerias e concessões, com taxas de retorno palatáveis para cooptar o investimento nacional e estrangeiro, e um esforço simultâneo de mobilização legislativa para simplificar o sistema tributário, dar maior flexibilidade ao mercado de trabalho sem violar os direitos fundamentais do trabalhador, diminuir o aumento das despesas de custeio sem reduzir a inserção social, atacar os custos exorbitantes da energia (particularmente o gás e energia elétrica) e de alguns oligopólios protegidos por tarifas, reforçando a construção de um amigável ambiente de negócios.
Tais ações provavelmente reacenderiam o "espírito animal" dos empresários, hoje um pouco assustados com a tragédia que se abate sobre a economia mundial, e serviriam de contraponto à campanha, visivelmente organizada pelos agentes do sistema financeiro internacional, contra nossa política econômica. O Brasil já "não seria mais aquele": teria abandonado as "virtudes" da plena liberdade de movimento de capitais; concentra-se em medidas pontuais paliativas sem ir às "estruturais" e, pior, insiste no pecado de tentar reduzir a taxa de juros para estimular o consumo, o investimento e reduzir a supervalorização do real. No fundo, o desconforto do sistema financeiro internacional deriva apenas da circunstância que terá um pouco mais de trabalho para ganhar a vida honestamente...
Antonio Delfim Netto é professor emérito da FEA-USP, ex-ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento.
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