sexta-feira, 29 de junho de 2012

A impotência do Fed



Por Martin Feldstein - Valor 29/06

O recente anúncio do Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA) de que irá estender a sua "Operação Twist" para comprar outros US$ 267 bilhões de títulos de longo prazo do Tesouro nos próximos seis meses, totalizando um montante de US$ 667 bilhões neste ano, não teve praticamente qualquer impacto tanto sobre as taxas de juro como sobre os preços de ações. A ausência de reação do mercado foi um indicador importante de que o alívio monetário deixou de ser uma ferramenta útil para fomentar a atividade econômica.

O Fed afirmou repetidamente que irá fazer tudo o que for possível para estimular o crescimento. Isto resultou em um plano de manutenção das taxas de curto prazo próximas de zero até o fim de 2014, bem como em enorme flexibilização quantitativa, seguida pela Operação Twist, por meio da qual o Fed substitui Treasuries de curto prazo por títulos de longo prazo.

Essas políticas tiveram sucesso em reduzir os juros de longo prazo. O rendimento dos Treasuries de dez anos está, agora, em 1,6%, contra 3,4% no início de 2011. Embora seja difícil saber quanto desse declínio refletiu um crescimento da demanda por títulos do Tesouro por parte dos investidores mundiais avessos a risco, as políticas do Fed, sem dúvida, merecem parte do crédito. Taxas de juro de longo prazo mais baixas contribuíram para o pequeno aumento de 4% no índice S&P 500 de preços de ações no mesmo período.

É improvável que o Fed seja capaz de reduzir ainda mais a taxa de longo prazo. O nível dessa taxa está, agora, tão baixo, que muitos investidores temem justamente que estejamos vivendo numa bolha de preços de títulos e ações. O resultado poderá ser um substancial aumento, puxado pelo mercado, na taxas de longo prazo, que o Fed seria incapaz de impedir. Uma mudança nas preferências dos perfis das carteiras de investidores estrangeiros, levando-as a distanciar-se de títulos de longo prazo, poderia facilmente desencadear a referida alta nas taxas.

Além disso, embora as ações do Fed tenham ajudado os detentores de títulos e ações, não está claro que eles tenham estimulado atividades econômicas reais. A economia americana ainda está cambaleante, com um crescimento muito lento e elevada taxa de desemprego. Embora a economia venha crescendo há três anos, o nível do PIB cresceu apenas 1% em comparação com quase cinco anos atrás, quando a recessão começou. A taxa de crescimento do PIB foi de apenas 1,7% em 2011, e não está significativamente mais alta agora. De fato, dados recentes mostram uma queda das rendas pessoais reais, declínio no avanço do emprego e quedas nas vendas do varejo.

O principal impacto da flexibilização da política monetária é, geralmente, estimular a demanda por habitação e, assim, o volume da construção civil. Mas desta vez, apesar de os juros de financiamento habitacional estarem historicamente baixos, os preços das casas têm continuado a cair, e estão agora mais de 10% abaixo, em termos reais, do que dois anos atrás. O nível de investimento real em residências ainda é inferior à metade de seu nível antes do início da recessão. O Fed observou que os problemas estruturais no mercado habitacional prejudicaram sua capacidade de estimular a economia por meio desse canal.
O investimento das empresas também está fraco, embora as grandes companhias tenham saldos em caixa muito amplos. Com tanta liquidez interna, essas empresas não estão sensíveis a reduções nas taxas de juro de mercado. Ao mesmo tempo, muitas empresas extremamente pequenas não conseguem obter crédito, porque os bancos locais dos quais dependem estão com uma estrutura inadequada de capital, devido aos prejuízos acumulados com empréstimos para empreendimentos imobiliários comerciais. A redução dos juros não beneficia também essas pequenas empresas.

A flexibilização da política monetária do Fed contribuiu temporariamente para desvalorizar o dólar, o que impulsionou as exportações líquidas. Mais recentemente, porém, ocorreu um declínio do dólar, cuja alta anterior foi revertida pelo distanciamento mundial dos investidores em relação ao euro, em busca do segurança.

Mesmo se a economia dos EUA continuar a tropeçar nos próximos meses, é improvável que o Fed tome qualquer medida adicional antes do fim do ano. As próximas medidas de política econômica de estímulo à economia deverão vir do Congresso e do executivo americanos após a eleição de novembro.

A despeito disso, o que precisa ser feito já é evidente. O espectro de um substancial aumento nas alíquotas do imposto de renda de pessoas físicas e jurídicas, agora agendados para acontecer automaticamente no início de 2013, deverá ser eliminado. O aumento projetado para o déficit fiscal de longo prazo precisará ser revertido sustando o crescimento das transferências para os aposentados da classe média. Uma reforma tributária fundamental precisa reforçar os incentivos, reduzir as "despesas fiscais" e aumentar as receitas. Finalmente, a relação entre governo e empresas, agora bastante atritada, precisa ser melhorada.

Se essas coisas acontecerem em 2013, a economia americana poderá retornar a um curso mais normal de expansão econômica e de aumento do emprego. Nesse ponto, o Fed poderia concentrar-se em sua missão fundamental de prevenção contra um aumento da taxa de inflação. Até lá, o Fed permanecerá impotente. (Tradução de Sergio Blum).



Martin Feldstein é professor de economia em Harvard, foi presidente do conselho de assessores econômicos do presidente americano Ronald Reagan e do Gabinete Nacional de Análises Econômicas dos EUA. Copyright: Project Syndicate, 2012.



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