segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

ENERGIA 2010 - 2035. Profecias, Outlook ou chutes

AGÊNCIA INTERNACIONAL DE ENERGIA
Novembro/2011

A Agência Internacional de Energia (AIE) é um organismo autónomo, criado em Novembro de 1974. A sua missão principal era – e continua a ser – dupla: promover a segurança energética entre os países membros, ao propor uma resposta colectiva às rupturas de abastecimento de petróleo, e fornecer estudos e análises idóneas sobre as formas de garantir aos 28 países membros e a outros, uma energia fiável, a preços acessíveis e limpa. A AIE desenvolve um extenso programa de cooperação energética entre seus países membros, através do qual cada um tem a obrigação de manter stocks de petróleo equivalentes a 90 dias das suas importações líquidas. A agência tem por objectivos:

Assegurar o acesso dos países membros a fontes de aprovisionamento fiáveis e amplas de todas as formas de energia, em particular, através da manutenção de uma capacidade de resposta de emergência eficiente em caso de ruptura do abastecimento de petróleo.

Promover políticas energéticas sustentáveis que estimulem o crescimento económico e a protecção do meio ambiente num contexto global – em particular em matéria de redução das emissões de gases com efeito de estufa, que contribuem para a alteração climática.

Melhorar a transparência dos mercados internacionais através da colecta e análise de dados relativos à energia.

Apoiar a colaboração mundial em matéria de tecnologias energéticas de modo a assegurar os abastecimentos de energia no futuro e a diminuir o seu impacto ambiental, inclusive através de uma maior eficiência energética, do desenvolvimento e da disseminação de tecnologias de baixo carbono.

Encontrar soluções para os desafios energéticos mediante o empenho e o diálogo com os países não-membros, a indústria, as organizações internacionais e outras partes interessadas.



“Se não mudarmos rapidamente de rumo, chegaremos ao lugar para onde nos dirigimos”

Poucos sinais apontam para a efectiva mudança de rumo das tendências mundiais da energia, embora seja urgentemente necessária.

Apesar da recuperação contrastada da economia mundial desde 2009 e das perspectivas económicas ainda incertas, a procura mundial de energia primária realizou um salto notável de 5% em 2010, provocando um novo pico das emissões de CO2. Os subsídios que estimulam o consumo excessivo de combustíveis fósseis subiram para mais de 400 000 milhões de dólares. O número de pessoas sem acesso à electricidade manteve-se ao nível inaceitavelmente elevado de 1,3 mil milhões, representando cerca de 20% da população mundial. Ainda que muitos países definam como prioridade uma maior eficiência energética, a intensidade energética global deteriorou-se pelo segundo ano consecutivo. Sobre este pano de fundo pouco animador, eventos como o acidente na central nuclear de Fukushima Daiichi e as convulsões no Médio Oriente e no Norte de África (MENA) suscitaram dúvidas quanto à fiabilidade do abastecimento de energia, enquanto as preocupações sobre a integridade financeira soberana desviaram a política energética do centro das atenções dos governos e limitaram os seus meios de intervenção política, pressagiando a dificuldade de alcançar os objectivos acordados para fazer frente às alterações climáticas.

Esta edição do World Energy Outlook avalia as ameaças e oportunidades do sistema global de energia, apoiando-se numa rigorosa análise quantitativa das tendências da energia e do clima.

A análise inclui três cenários globais e vários estudos de caso. O cenário central desta edição do Outlook é o Cenário Novas Políticas, o qual assume que os recentes compromissos políticos dos governos serão implementados cautelosamente – mesmo que ainda não assentem em medidas sólidas. A comparação com os resultados do Cenário Políticas Actuais, o qual assume que não serão definidas novas políticas além daquelas que já existem em meados de 2011, ilustra o valor desses compromissos e planos. De outro ponto de vista, é igualmente instrutiva a comparação com o Cenário 450, que retoma o objectivo internacional de limitar o aumento a longo prazo da temperatura média a dois graus Celsius (2°C) acima dos níveis da época pré-industrial, de modo a traçar um caminho possível para atingir essa meta. A grande diferença nos resultados obtidos por estes três cenários sublinha o papel crítico dos governos na definição dos objectivos e na implementação das políticas necessárias para modelar o nosso futuro energético.

As incertezas a curto prazo não alteram significativamente a perspectiva a longo prazo

Apesar das incertezas quanto às perspectivas de crescimento económico a curto prazo, no Cenário Novas Políticas, a procura de energia cresce fortemente, aumentando um terço entre 2010 e 2035.

As hipóteses de crescimento da população mundial de 1,7 bilhões de pessoas e de 3,5% crescimento médio anual da economia mundial geram uma procura sempre crescente no domínio dos serviços de energia e de mobilidade. Uma taxa de crescimento do PIB mundial a curto prazo mais reduzida do que a assumida nesta edição do Outlook teria somente uma influência marginal nas tendências a longo prazo.

A dinâmica dos mercados da energia é cada vez mais determinada por países fora da OCDE.

Os países não membros da OCDE são responsáveis por 90% do crescimento da população, 70% do aumento da produção económica e 90% do incremento da procura de energia, entre 2010 e 2035. A China reforça ainda mais a sua posição de principal consumidor mundial de energia: em 2035, consome praticamente 70% de energia a mais do que os Estados Unidos da América, segundo consumidor mundial, embora no mesmo período, o consumo energético per capita da China represente ainda menos de metade do valor dos Estados Unidos. As taxas de crescimento do consumo de energia na Índia, na Indonésia, no Brasil e no Médio Oriente aumentam a um ritmo ainda mais rápido do que a China.

É necessário um investimento mundial nas estruturas de transporte da energia de 38 biliões de dólares (em valores de 2010) no período 2011-2035.

Praticamente dois terços do investimento total são realizados em países fora da OCDE. O petróleo e o gás representam conjuntamente cerca de 20 bilhões de dólares, tendo em conta o aumento a médio e a longo prazo das necessidades de investimento a montante e dos respectivos custos. O sector da electricidade exige a maior parte do valor remanescente, com mais de 40% destinado às redes de transmissão e distribuição.

A era dos combustíveis fósseis está longe de ter acabado, mas a sua predominância tende a declinar.

 A procura aumenta para todos os combustíveis, mas a percentagem de combustíveis fósseis no consumo global de energia primária acusa uma ligeira quebra, passando de 81% em 2010 para 75% em 2035: o gás natural é o único combustível fóssil cuja percentagem aumenta no combinado energético global, até 2035. No sector da electricidade, as tecnologias das energias renováveis, lideradas pelas energias hidroeléctrica e eólica, constituem metade da nova capacidade instalada para responder à procura crescente.

Alguns passos na boa direção, mas a janela dos 2°C está a fechar-se

Não podemos dar-nos ao luxo de protelar qualquer acção destinada a lutar contra as alterações climáticas se quisermos alcançar a um preço razoável o objectivo a longo prazo de limitar o aumento médio global da temperatura a 2°C, tal como previsto no Cenário 450. No Cenário Novas Políticas, o mundo segue uma trajectória que resulta num nível de emissões correspondente a um aumento de temperatura a longo prazo superior a 3,5°C. Sem essas novas políticas, estaremos numa rota ainda mais perigosa, que levará a um aumento de 6°C ou mais da temperatura.

Em 2035, quatro quintos das emissões admissíveis totais de CO2 relacionadas com a energia no Cenário 450 já estão “garantidos” pelo stock existente (centrais eléctricas, edifícios, fábricas, etc.). Se não forem tomadas novas medidas rigorosas até 2017, as infra-estruturas implantadas nessa altura gerarão todas as emissões de CO2 admissíveis no Cenário 450 até 2035, não deixando qualquer possibilidade de criação de novas centrais, fábricas ou outras infra-estruturas, a menos que gerem zero emissões de carbono, o que se tornaria extremamente oneroso. Adiar a ação é uma falsa economia, pois para cada dólar que não se investe no sector eléctrico antes de 2020, será necessário investir mais 4,3 dólares depois dessa data, para compensar o aumento das emissões.

As novas medidas de eficiência energética fazem a diferença, mais é preciso muito mais.

 No Cenário Novas Políticas, a eficiência energética aumenta a um ritmo que corresponde ao dobro dos últimos 25 anos, sendo estimulada por normas mais rigorosas em todos os sectores e por uma redução gradual dos subsídios aos combustíveis fósseis. No Cenário 450, o ritmo de mudança é ainda mais rápido, com melhorias de eficiência representando metade da redução adicional de emissões. A maior contribuição para atingir a segurança energética e os objectivos climáticos provém da energia que não consumimos.

Demanda e custos crescentes na área dos transportes confirmam mais uma vez o fim da era do petróleo barato

As pressões a curto prazo nos mercados do petróleo poderão ser moderadas pelo abrandamento do crescimento económico e pelo regresso esperado do petróleo líbio no mercado, mas as tendências tanto da procura como da oferta de petróleo mantêm a pressão sobre os preços.

Assumimos que o preço médio nos países membros da AIE do petróleo bruto importado permanece elevado, aproximando-se dos 120 dólares/barril (em valores de 2010) em 2035 (mais de 210 dólares/barril em valores nominais) no Cenário Novas Políticas, embora muito provavelmente, na prática, a volatilidade dos preços se mantenha.

O aumento líquido da procura de petróleo deve-se na totalidade ao sector do transporte nas economias emergentes, dado que o crescimento económico impulsiona a procura de mobilidade das pessoas e das mercadorias.

A demanda por petróleo (à exclusão dos biocombustíveis) sobe de 87 milhões de barris por dia (mb/d) em 2010 para 99 mb/d em 2035. O número total de veículos leves de passageiros duplica, atingindo praticamente 1,7 mil milhões em 2035.
As vendas nos mercados dos países não-membros da OCDE ultrapassam as dos países membros da OCDE em 2020, ao mesmo tempo que o centro de gravidade da produção automóvel passa para países fora da OCDE, antes de 2015.

O consumo de petróleo aumenta, apesar de avanços impressionantes em matéria de economias de combustível em certas regiões, nomeadamente para os veículos de passageiros na Europa e os veículos pesados  nos Estados Unidos da América. As novas tecnologias alternativas aplicadas aos veículos utilizam o petróleo de uma forma muito mais eficiente ou prescindem totalmente deste combustível, como no caso dos veículos eléctricos, mas levam tempo a tornarem-se comercialmente viáveis e a penetrar nos mercados.
Devido ao potencial limitado de substituição do petróleo como combustível na área do transporte, a concentração no uso do petróleo neste sector está menos exposto às variações de preço (sobretudo onde os produtos à base de petróleo são subsidiados).

O custo de comercialização do petróleo aumenta, à medida que as companhias são obrigadas a recorrer a fontes de mais difícil acesso e onerosas, para substituir a capacidade perdida e atender à procura crescente. A produção de petróleo bruto convencional – principal componente único no aprovisionamento de petróleo – mantém-se nos níveis actuais, antes de diminuir ligeiramente para cerca de 68 mb/d em 2035.

Para compensar o declínio do petróleo bruto nos campos existentes, serão necessários mais 47 mb/d de capacidade bruta, o dobro da produção de petróleo total actual no conjunto dos países da OPEC do Médio Oriente.

Uma parte crescente da produção provém do gás natural liquefeito (mais de 18 mb/d em 2035) e de fontes não convencionais (10 mb/d). Espera-se que o maior aumento na produção de petróleo deva-se ao Iraque, seguido da Arábia Saudita, do Brasil, do Cazaquistão e do Canadá.

O fornecimento de biocombustíveis triplica, atingindo um valor equivalente a mais de 4 mb/d, sustentado por 1,4 bilião de dólares de subsídios durante o período de projecção.

As importações de petróleo para os Estados Unidos da América, o maior importador mundial actual, diminuem à medida que os ganhos de eficiência reduzem a procura e que são desenvolvidas novas fontes de abastecimento, como o petróleo leve condensado; contudo, a dependência crescente das importações de petróleo nas outras partes do mundo aumenta as preocupações sobre o custo das importações e a segurança dos abastecimentos.

Em 2035, quatro quintos do petróleo consumido nos países Asiáticos não membros da OCDE provêm de importações, enquanto esse valor representa apenas pouco mais de metade em 2010. Globalmente, a dependência aumenta em relação a um número de produtores bastante limitado, sobretudo na região MENA, com o petróleo a transitar por vias de aprovisionamento vulneráveis.
 Em valores agregados, o aumento da produção oriunda desta região é superior a 90% do crescimento necessário na produção mundial de petróleo, elevando a quota-parte da OPEC na produção global para mais de 50% em 2035.

A insuficiência de investimentos a crescente na região MENA poderá ter um impacto muito abrangente nos mercados mundiais da energia. Essa carência poderá resultar de vários factores, incluindo a percepção de um maior risco de investimento, políticas deliberadas dos governos para desenvolver mais lentamente a capacidade de produção ou limitações dos fluxos de capital interno a crescente devido à concentração das despesas noutros tipos de programas públicos. Se, entre 2011 e 2015, o investimento na região MENA for um terço inferior aos 100 mil milhões de dólares anuais necessários no Cenário Novas Políticas, os consumidores poderão ter que enfrentar um aumento significativo do preço do petróleo a curto prazo, de 150 dólares/barril (em valores de 2010).

Perspectivas muito favoráveis para o gás natural

O panorama é muito menos incerto para o gás natural: vários factores, tanto a nível da oferta como da procura, apontam para um futuro brilhante, ou mesmo uma era de ouro, para o gás natural. As perspectivas desta edição do Outlook vêm reforçar as principais conclusões de um relatório especial do WEO publicado em Junho de 2011: o consumo de gás aumenta nos três cenários, sublinhando o bom desempenho do gás num grande número de futuras orientações políticas. No Cenário Novas Políticas, a procura de gás atinge praticamente o nível do carvão, sendo 80% da procura adicional oriunda de países fora da OCDE. As políticas que promovem a diversificação das fontes de combustível sustentam a expansão considerável da utilização do gás na China, alcançada através do aumento da produção doméstica e dos desenvolvimentos do comércio do gás natural liquefeito nas importações e da rede de transporte da Eurásia. O comércio global duplica, sendo mais de um terço deste aumento destinado à China. A Rússia continua a ser o maior produtor de gás em 2035 e o país que mais contribui para o desenvolvimento do aprovisionamento mundial, seguido da China, do Qatar, dos Estados Unidos da América e da Austrália.

O gás não convencional representa actualmente metade da base dos recursos de gás natural e apresenta uma dispersão maior do que a dos recursos convencionais, o que tem um efeito positivo na segurança do gás. A quota-parte de gás não convencional passa a constituir um quinto da produção total de gás em 2035, embora o seu ritmo de crescimento varie consideravelmente entre regiões. Por sua vez, o aumento da produção será determinado pela capacidade da indústria do gás em vencer os desafios ambientais: uma era de ouro do gás requer padrões de ouro em matéria de produção. O gás natural é o combustível fóssil mais limpo, mas em si, o aumento do consumo de gás (sem captação e armazenamento de carbono) não será suficiente para nos colocar numa rota de emissões de carbono que seja compatível como a limitação do aumento da temperatura global de 2°C.

As fontes de energia renováveis assumem maior protagonismo

A percentagem de fontes de energia renováveis não hidroeléctricas na geração de electricidade sobe de 3% em 2009 para 15% em 2035, apoiadas através de subsídios anuais às fontes de energia renováveis que aumentam praticamente por um factor de cinco, num valor de 180 mil milhões de dólares. A China e a União Europeia lideram esta expansão e representam cerca de metade do crescimento. Embora se preveja uma diminuição no valor dos subsídios por unidade de produção, a maior parte das fontes de energia renováveis precisam de ser apoiadas durante todo o período de projecção, para serem competitivas nos mercados de electricidade. Apesar do custo elevado, acredita-se que os benefícios serão duradouros em matéria de segurança energética e protecção do meio ambiente. Para obter mais electricidade proveniente de fontes de energia renováveis, por vezes situadas em locais remotos, serão necessários investimentos adicionais nas redes de transmissão, representando 10% do investimento de transmissão total: na União Europeia, para atingir esse objectivo, será necessário dedicar 25% do investimento às redes de transmissão. A contribuição da energia hidroeléctrica para a produção total de energia permanece constante, à volta de 15%, representando a China, a Índia e o Brasil praticamente metade dos 680 gigawatts de capacidade adicional.

Carvão: marcar passo ou prosseguir a todo o vapor?

Na última década, o carvão atendeu a praticamente metade do aumento da procura mundial de energia. Saber se esta tendência mudará e a que velocidade, eis uma das questões mais importantes para o futuro da economia mundial da energia. Mantendo-se as políticas actuais, o peso do carvão representaria 65% em 2035, suplantando o petróleo enquanto principal combustível no combinado energético mundial. No Cenário Novas Políticas, o consumo global de carvão aumenta nos próximos dez anos mas em seguida, estagna, terminando 25% acima dos níveis de 2009. Para que o Cenário 450 se realize, o consumo de carvão tem de atingir o seu pico muito antes de 2020, começando a declinar em seguida. Em 2035, o nível da procura de carvão projectado nos três cenários é praticamente equivalente ao da procura mundial total de 2009. As consequências das opções políticas e tecnológicas no clima global são consideráveis.

O consumo de carvão por parte da China representa praticamente metade da demanda mundial. O seu plano quinquenal de 2011 a 2015, que visa reduzir a intensidade energética e do carbono na economia, será um factor determinante para os mercados mundiais do carvão. A emergência da China em 2009 como importador de carvão em termos líquidos acarretou uma subida de preços e a realização de novos investimentos nos países exportadores, incluindo a Austrália, a Indonésia, a Rússia e a Mongólia. No Cenário Novas Políticas, o mercado principal do comércio do carvão continua a transferir-se do Atlântico para o Pacífico, mas a escala e a orientação dos fluxos do comércio internacional são extremamente incertos, sobretudo após 2020. Seria apenas necessária uma pequena mudança na procura ou na oferta interna para a China se tornar novamente um exportador em termos líquidos, passando assim a competir no mercado com os países que investem actualmente para atender à sua procura. O consumo de carvão na Índia duplica no Cenário Novas Políticas, passando a ocupar a posição anterior dos Estados Unidos de segundo consumidor mundial de carvão e tornando-se o maior importador de carvão nos anos 2020.

A implantação em grande escala de centrais eléctricas a carvão mais eficientes e da tecnologia de captação e armazenamento de carbono (CAC) poderiam dar um impulso às projecções a longo prazo para o carvão; contudo, subsistem ainda obstáculos importantes. Se a eficiência média de todas as centrais eléctricas a carvão subisse para cinco pontos percentuais acima dos valores do Cenário Novas Políticas em 2035, esse rápido decréscimo das tecnologias de combustão menos eficientes acarretaria uma diminuição de 8% das emissões de CO2 no sector eléctrico e reduziria localmente a poluição do ar. A escolha de tecnologias mais eficientes para as novas centrais eléctricas a carvão exigiria investimentos suplementares relativamente modestos, enquanto o custo do melhoramento dos níveis de eficiência nas centrais existentes seria muito mais elevado. No Cenário Novas Políticas, a tecnologia de captação e armazenamento de carbono (CAC) tem alguma influência unicamente no fim do período de projecção. Não obstante, a CAC constitui uma opção fundamental para a diminuição das emissões no Cenário 450 , representando praticamente um quinto da redução de emissões suplementar exigida. Caso a CAC não esteja implementada em grande escala nos anos 2020, será extraordinariamente difícil atingir, mediante as tecnologias com baixas emissões de carbono, os níveis de emissões exigidos para cumprir os objectivos climáticos globais.

Reconsiderar a energia nuclear poderá ter consequências a longo prazo

Os acontecimentos de Fukushima Daiichi suscitaram interrogações sobre o futuro papel da energia nuclear, embora não tenham alterado as políticas de países como a China, a Índia, a Rússia e a Coreia, que determinam a expansão desta fonte de energia. No Cenário Novas Políticas, a produção de energia nuclear aumenta mais de 70% até 2035, uma percentagem apenas ligeiramente inferior à projectada no ano passado. Contudo, examinamos igualmente as possíveis implicações de um decréscimo adicional da energia nuclear, através de um Cenário Nuclear Baixo (“Low Nuclear Case”), que assume que não serão construídos novos reactores nos países da OCDE, que os países não membros da OCDE apenas constroem metade dos suplementos projectados no Cenário Novas Políticas e que a vida útil de funcionamento das centrais nucleares actuais é encurtada. Embora crie oportunidades para as energias renováveis, este futuro, com uma componente nuclear baixa, também poderá estimular a procura de combustíveis fósseis: o aumento da procura global de carvão equivale ao dobro do nível das actuais exportações de carvão-vapor da Austrália da e o aumento da procura de gás equivale a dois terços das exportações actuais de gás natural da Rússia. Esta situação acarretaria uma maior pressão nos preços da energia, preocupações acrescidas em matéria de segurança energética, dificultando e agravando o custo da luta contra as alterações climáticas. As consequências serão particularmente graves para os países com parcos recursos energéticos endógenos, que têm previsto uma dependência bastante forte da energia nuclear. Por sua vez, as economias emergentes teriam muito mais dificuldade em satisfazer a sua rapidamente crescente procura de energia.

O mundo precisa da energia russa e a Rússia precisa de consumir menos energia

Os recursos energéticos abundantes da Rússia continuarão a fazer do país uma pedra angular da economia energética mundial da nas próximas décadas. A procura potencial elevada e os preços mundiais dos combustíveis fósseis poderão parecer garantir boas perspectivas à Rússia; todavia, em muitos aspectos, os desafios à sua frente são tão impressionantes quanto a própria magnitude dos seus recursos. Os principais campos russos de petróleo e gás na Sibéria ocidental vão declinar e uma nova geração de campos com um custo mais elevado deverá ser desenvolvida, tanto nas áreas de produção tradicionais da Sibéria ocidental como nas novas fronteiras da Sibéria oriental e do Árctico. A Rússia deverá dotar-se de um sistema fiscal reactivo, capaz de incentivar suficientemente o investimento. A produção de petróleo atinge um planalto à volta de 10,5 mb/d, antes de iniciar uma ligeira descida para 9,7 mb/d em 2035; a produção de gás aumenta 35%, passando para 860 mil milhões de metros cúbicos (bcm) em 2035 e fazendo da península de Yamal o novo centro de abastecimento da Rússia.

As mudanças geográficas da produção russa de petróleo e gás acarretam uma mudança na geografia das exportações. A maior parte das exportações russas continua a ter por destino o ocidente, com os mercados tradicionais da Europa, embora se assista a um fluxo crescente em direcção aos mercados asiáticos. Consequentemente, a Rússia apresenta uma maior diversidade de rendimentos das suas exportações: a quota-parte da China no valor total das exportações russas de combustíveis fósseis sobe de 2% em 2010 para 20% em 2035, enquanto a quota-parte da União Europeia diminui de 61% para 48%.

A Rússia visa criar uma economia mais eficiente, menos dependente do petróleo e do gás, mas precisa de acompanhar o ritmo de mudança. Se a Rússia aumentasse a eficiência energética de cada um dos seus sectores aos níveis de países da OCDE comparáveis, poderia economizar praticamente um terço do seu uso anual de energia primária, valor comparável com o da energia usada num ano pelo Reino Unido. As economias potenciais, somente no domínio do gás natural, de 180 bcm, aproximam-se do valor das exportações líquidas da Rússia em 2010. As novas políticas em matéria de eficiência energética e as continuadas reformas dos preços do gás e da electricidade permitem melhorar a situação mas, na nossa análise, apenas destravam uma parte do potencial da eficiência russa. Uma implementação mais rápida das evoluções em matéria de eficiência, aliada à reforma do mercado da energia, permitirá acelerar a modernização da economia russa e logo, minorar a sua dependência dos movimentos dos preços mundiais das matérias-primas.

O acesso à energia para toda a população não teria um custo excessivo

Calculamos que, em 2009, foram investidos mundialmente cerca de 9 mil milhões de dólares para fornecer um acesso directo à energia moderna; contudo, será preciso investir mais de cinco vezes esse valor, ou seja 48 mil milhões de dólares, para permitir o acesso universal em 2030. Facultar o acesso à energia a toda a população mundial em 2030 é um objectivo fundamental anunciado pelo Secretário-Geral da ONU. Actualmente, 1,3 mil milhões de pessoas não dispõem de electricidade e 2,7 mil milhões de pessoas ainda dependem do uso tradicional da biomassa para cozinhar. O investimento necessário equivale a cerca de 3% do investimento total na energia até 2030. Sem este aumento, o panorama global de 2030 pouco evoluirá em relação à situação actual, ou mesmo, piorará na região da África subsariana. Algumas das políticas actuais destinadas a ajudar os mais pobres não atingem os seus objectivos. Em 2010, apenas 8% dos subsídios ao consumo de combustíveis fósseis beneficiaram os 20% da população mais pobre.

O acesso à energia torna-se uma preocupação crescente. As Nações Unidas declararam 2012 “Ano Internacional da Energia Sustentável para Todos” e o Rio+20 constitui uma importante ocasião para agir. Mais financiamento, de fontes variadas e sob diferentes formas, é necessário para facultar a todos o acesso a uma energia moderna, com soluções adaptadas aos desafios, riscos e retornos financeiros específicos de cada tipo de projecto. O investimento do sector privado é aquele que mais precisa de crescer, o que não acontecerá se os governos nacionais não adoptarem quadros governamentais e regulamentares rígidos e se não investirem na criação de capacidade. O sector público, incluindo os dadores, tem de usar as suas alavancas para fomentar o investimento do sector privado que, de outra forma tem um interesse comercial limitado. Em 2030, o acesso universal corresponderia a um aumento da procura mundial de combustíveis fósseis e das subsequentes emissões de CO2 inferior a 1%, um valor irrelevante comparado com a contribuição de tal evolução para o desenvolvimento e o bem-estar da humanidade.



Este relatório foi inicialmente escrito em inglês. Embora tenham sido envidados todos os esforços para assegurar a fidelidade da tradução, poderá haver ligeiras diferenças entre esta e a versão original.

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