quarta-feira, 24 de agosto de 2011

A nova política cambial da China


Por Martin Feldstein
O governo da China pode estar prestes a permitir, nos próximos meses, uma valorização mais rápida do yuan em relação ao dólar do que durante o ano passado. O câmbio permaneceu efetivamente congelado durante a crise financeira, mas o governo chinês permitiu que a moeda valorizasse desde o verão de 2010. Nos últimos 12 meses, o yuan valorizou-se 6% em relação ao dólar, sua moeda de referência.

Um incremento mais rápido da relação cambial yuan/dólar provocaria uma diminuição das exportações chinesas e incrementaria suas importações. Isso também permitiria que outros países asiáticos deixassem suas moedas se valorizar ou expandir suas exportações à custa dos produtores chineses. Isso poderia deixar satisfeitos os vizinhos da China, mas não seria atraente para os produtores chineses. Por que, então, poderiam as autoridades chinesas deliberadamente permitir que o yuan se valorizasse mais rapidamente? Existem duas razões fundamentais: reduzir o seu risco de portfólio e conter sua inflação doméstica.

Consideremos, inicialmente, a preocupação das autoridades com os riscos implícitos em seu portfólio de títulos estrangeiros. A atual carteira chinesa de US$ 3 trilhões em títulos denominados em dólar e em outros títulos estrangeiros a expõe a dois riscos distintos: inflação nos EUA e na Europa e uma rápida desvalorização do dólar em relação ao euro e outras moedas.

Inflação nos EUA ou na Europa reduziria o poder de compra dos títulos denominados em dólar ou das obrigações europeias. Os chineses continuariam possuindo o mesmo montante de dólares ou euros, mas esses dólares e euros comprariam menos bens no mercado mundial.

A única maneira de a China reduzir esses riscos é diminuir o montante de títulos em moeda estrangeira em seu portfólio. Mas a China não pode fazer isso enquanto está registrando um grande superávit em conta corrente. Durante os últimos 12 meses, o país manteve um superávit em conta corrente próximo de US$ 300 bilhões que precisa ser somado à carteira chinesa de títulos denominados em dólares, euros e outras moedas.

A segunda razão pela qual os líderes políticos da China poderiam preferir um yuan mais forte seria para reduzir a taxa de inflação doméstica na própria China. Um yuan mais forte reduziria, para os consumidores e para as empresas chinesas, os custos de produtos importados expressos em yuans. Um barril de petróleo poderia continuar custando US$ 90, mas um aumento de 10% no câmbio yuan/dólar reduziria em 10% seu preço em yuans.

Reduzir o custo das importações é significativo, porque a China importa muitos bens de consumo, equipamentos e matérias-primas. Com efeito, o total de importações anuais pela China totaliza aproximadamente US$ 1,4 trilhão, ou cerca de 40% do PIB.

Uma meta principal do recém apresentado 12º Plano Quinquenal é aumentar a renda familiar e os gastos dos consumidores a um ritmo mais rápido do que o do crescimento do PIB.

A combinação de crescimento mais rápido dos gastos domésticos e o nível atual das exportações poderia criar gargalos e tensões na capacidade de produção, provocando um rápido aumento dos preços dos bens produzidos internamente. Com o objetivo de abrir espaço para um crescimento dos gastos dos consumidores é necessário permitir uma valorização da moeda para reduzir o nível das exportações.

No que diz respeito ao que ocorreu no ano passado, o aumento de 6% na taxa do câmbio yuan/dólar poderia subestimar o aumento do custo relativo dos produtos chineses para os compradores americanos devido a diferenças nas taxas de inflação domésticas. Os preços para o consumidor chinês cresceram cerca de 6,5% no decorrer do ano passado, ao passo que os preços ao consumidor americano subiram apenas cerca de 3,5%. A diferença de três pontos percentuais implica que a taxa de câmbio yuan-dólar "real" ajustada pela inflação cresceu 9% em relação ao ano passado (ou seja, 6% de apreciação nominal acrescidos da diferença de 3% entre as inflações).

Embora essa seja a forma como governos calculam variações em taxas de câmbio reais, esse cálculo, sem dúvida, exagera a variação relativa nos preços dos bens que os americanos compram da China, porque grande parte da inflação chinesa foi causada pela alta nos preços das casas, verduras locais e outros itens não comercializáveis. É possível que os preços, em yuans, dos produtos manufaturados na China e exportados para os EUA não tenham sofrido nenhum aumento.

Embora o yuan tenha se valorizado em relação ao dólar, o dólar se desvalorizou em relação a outras importantes moedas. O declínio de 10% do dólar em relação ao euro nos últimos 12 meses implica que o yuan está efetivamente cerca de 4% mais desvalorizado em relação ao euro. O franco suíço valorizou-se mais de 40% em relação ao dólar - e, portanto, mais de 30% em relação ao yuan. Levar em conta todo o leque de países com os quais a China mantém relações comerciais implica que o valor geral do yuan provavelmente declinou nos últimos 12 meses.

O dólar provavelmente continuará caindo em relação ao euro e a outras moedas, ao longo dos próximos anos. Em consequência, os chineses poderão permitir que o yuan valorize substancialmente em relação ao dólar, caso queiram incrementar seu valor geral para diminuir o risco de portfólio da China e controlar pressões inflacionárias.

Martin Feldstein, professor de Economia em Harvard, foi presidente do Conselho de Assessores Econômicos do presidente Ronald Reagan. Copyright: Project Syndicate, 2011.

www.project-syndicate.org

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