segunda-feira, 11 de junho de 2012

Os EUA estão se recuperando rápido?



Por Mohamed A El-Erian - Valor 11/06

Seis fatores internos sugerem que a economia americana está convalescendo lentamente. Para alguns observadores, esses fatores foram considerados suficientes para consistir a massa crítica necessária para imprimir uma velocidade de decolagem à economia.

Embora eu torcesse para que os fatos lhes dessem razão, recente série de dados fracos, inclusive a tímida criação líquida de apenas 69 mil postos de trabalho em maio, confirmou minhas dúvidas. Tendo em vista que esse e outros elementos de um desalentador relatório de emprego agora, repentinamente, produzem preocupações generalizadas sobre a saúde e durabilidade estruturais da recuperação americana, é importante compreender os fatores positivos e por que ainda não são suficientes.

Para começar, as grandes empresas multinacionais americanas estão perfeitamente saudáveis. O nível de recursos em caixa é extremamente elevado, as taxas de juros cobradas sobre as dívidas estão baixas e as principais obrigações têm sido honradas. Muitas dessas companhias têm tido êxito em sua operações nas economias emergentes, gerando significativa disponibilidade de recursos.

Para essas companhias, recursos em caixa são a única fonte de considerável dinheiro disponível. Famílias ricas também detêm recursos em volume significativo que poderiam ser usados para ampliar e fortalecer o consumo e os investimentos.

Os terceiro e quarto fatores positivos estão relacionados ao mercado habitacional e ao mercado de trabalho. Essas duas áreas de persistente debilidade há bastante tempo têm se constituído em importante freio ao tipo de dinâmica cíclica que tradicionalmente arrancam os EUA de suas periódicas desacelerações econômicas. Mas os dados recentes fortalecem a tese de que o setor habitacional pode estar em vias de bater no fundo do poço, embora lentamente. Por outro lado, o crescimento do emprego, embora anêmico, tem se revelado consistentemente positivo desde setembro de 2010.

Por outro lado, há a influência do Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA). Apesar dos legítimos questionamentos sobre a eficácia da política monetária pouco convencional e sempre experimental do banco central americano, o Fed parece disposto a praticar uma postura ainda mais ativista, caso ocorra um esfriamento da economia. De fato, se o Fed cometer, inadvertidamente, um erro (e a probabilidade disso acontecer é considerável, dada a situação complexa do país e das perspectivas "excepcionalmente incertas"), será mais provável que erre no sentido de manter os juros baixos por tempo excessivo, e não de apertar a política monetária prematuramente.

Finalmente, dada a proximidade das eleições em novembro e, posteriormente, de sua remoção do cenário, alguns analistas acreditam que os políticos em Washington podem finalmente estar melhor posicionados para pactuar um consenso em torno das tão necessárias concessões políticas. Além de eliminar o espectro danoso de um colapso fiscal, um obstáculo econômico potencialmente perturbador equivalente a cerca de 4% do PIB - na forma de cortes de gastos excessivamente duros e aumento generalizado de impostos -, maior eficácia política serviria para eliminar outras incertezas que inibem determinadas atividades econômicas.

Cada um desses seis fatores sugere um saneamento econômico real e potencial. Assim, não é de surpreender que tenham despertado entusiasmo em alguns círculos, sugerindo que os EUA podem estar prestes a deixar para trás o trio depressivo de crescimento anormalmente lento, desemprego persistentemente elevado e desigualdade elevada e crescente.

O problema está na improbabilidade de que esses fatores, tanto individualmente quanto reunidos, possam fazer o jogo virar - por quatro razões:

- Os ventos econômicos e financeiros contrários originados fora dos EUA são fortes e desestabilizadores, devido em grande parte ao agravamento da crise europeia, que entra agora em uma fase ainda mais perturbadora e imprevisível, à medida que os depositantes de alguns países intensificam seus saques em bancos locais. Mas isso também reflete o início de uma desaceleração do crescimento nos principais países emergentes como Brasil, China, Índia e Rússia.

- Muitos setores da economia americana não concluíram seu processo de saneamento em seu balanço de pagamentos. Isso é verdadeiro para o sistema bancário, cuja desalavancagem não foi suficiente para satisfazer tanto as agências controladoras como os mercados, limitando, assim, as possibilidades de ampliação do crédito. Isso vale também para muitas famílias. De fato, tendo a taxa média de poupança caído recentemente abaixo de 4%, muitas famílias estão em processo de esgotamento de seus colchões de reservas de dinheiro emergencial, se é que isso ainda não aconteceu.

- O incomum ativismo da política monetária nos últimos anos cria o risco de produzir danos colaterais e consequências inesperadas. Embora nenhum fator individual seja ainda, decisivo, reunidos poderão amortecer a atividade econômica e o bom funcionamento dos mercados. Recordemos que a política monetária do Fed é uma aposta em que esses "custos e riscos", para usar os termos usados por seu presidente, Ben Bernanke, seriam mais que compensados pela melhoria da situação econômica geral. Mas esse benefício generalizado não se concretizou.

- A consideração possivelmente mais importante, repetidos atrasos na eliminação dos persistentes obstáculos ao crescimento e ao emprego significam que alguns deles estão ficando enraizados na estrutura da economia americana - minando, assim, seu dinamismo e reduzindo sua capacidade de reação. Por exemplo, com um desemprego sustentado ao nível do equivalente a 5,4 milhões de postos de trabalho e com uma duração média do desemprego 2,5 vezes seu valor histórico normal, os trabalhadores têm menos condições de reconquistar empregos produtivos em curto prazo a níveis sequer próximos de suas remunerações e salários anteriores. Paralelamente, o nível alarmante de desemprego entre os jovens amplia o risco de que pessoas relativamente novas no mercado de trabalho permaneçam desempregadas.

As consequências são lamentáveis, mas devem ser reconhecidas. Embora a economia americana esteja sarando gradualmente, muita coisa mais precisa acontecer - em verdade, urgentemente - para restaurar seu vigor e vitalidade tradicionais. O mais importante é que uma recuperação robusta exige um grau de seriedade e de colaboração construtiva em Washington que hoje parece de difícil obtenção.

Até que essa cooperação se concretize e somente se concretizar, a esperança de alcançar a velocidade de decolagem econômica permanecerá apenas isso, uma esperança. E em vez de deslanchar, a economia americana, lamentável e exasperantemente, permanecerá cativa de sua atípica lentidão, ao mesmo tempo em que sua vulnerabilidade aos ventos adversos provenientes do resto do mundo só crescerá. (Tradução de Sergio Blum)



Mohamed A El-Erian é CEO e co-CIO da PIMCO, e autor de "When Markets Collide" (Quando mercados colidem). Copyright: Project Syndicate, 2012.



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