terça-feira, 12 de junho de 2012

Crescimento: centro da agenda



Por Yoshiaki Nakano - Valor 12/06

Mesmo que o crescimento econômico seja muito menor do que o esperado, a presidente Dilma Rousseff já prestou um grande serviço à nação: conseguiu efetivamente trazer de volta a aceleração do crescimento econômico para o centro do debate nacional.

No governo Fernando Henrique, a prioridade absoluta era a inflação, chegando seu ministro da Fazenda a afirmar que crescimento era assunto de economista desocupado. O governo Lula foi beneficiado por choques exógenos que permitiram colher sem ter semeado, acelerou o crescimento, particularmente em relação ao medíocre desempenho anterior. Mas a primazia da aceleração do crescimento foi ofuscada pelo político. As metas de crescimento nunca foram explicitadas, apesar de terem sido tomadas diversas medidas favoráveis ao crescimento.

Com a presidente Dilma Rousseff, a meta de crescimento chegou a ser estabelecida informalmente e timidamente, mas ficou claro para todos o seu firme compromisso com o crescimento econômico, geração de emprego e eliminação da pobreza. O seu compromisso traduziu-se também em ações concretas que significam rupturas claras com o passado. O Banco Central do Brasil manteve a sua independência operacional, mas as metas, como em qualquer outra democracia, passaram a expressar a vontade do cidadão, passaram a incorporar, ao lado da inflação, o crescimento e a geração de emprego.
Um passo fundamental foi dado com a remoção da trava à queda na taxa Selic, representada pela fixação da taxa de juros da caderneta de poupança. Isso representa uma grande reforma estrutural - removeu um dos maiores obstáculos ao investimento produtivo no país. Removeu-se também alguns mitos, entre eles o de que o controle do fluxo de capitais e que qualquer ação do Estado para estimular a recuperação econômica são ineficazes.

Mais importante é que conseguiu mudar a agenda do debate nacional e mesmo a ótica daqueles que eram os mais ferrenhos defensores da política econômica liberalizante. Hoje, há uma concordância generalizada de que a apreciação da taxa de câmbio é mortal. A desindustrialização deixou de ser fantasia de alguns economistas, todos admitem o problema, mesmo que alguns falem eufemisticamente em perda de competitividade. Discute-se o problema da produtividade e quando se debruça sobre os dados, não podem deixar de relacionar com investimentos produtivos, ainda que com causalidade invertida. Ou ver o óbvio, de que priorização da expansão dos bens não comercializáveis, particularmente serviços, pela apreciação da taxa de câmbio, em detrimento dos "tradables" (indústria de transformação), faz a produtividade média da economia cair.

Mais recentemente, a presidente expressou, de forma sintética e clara, de que são três conjuntos de questões que amarram o crescimento da economia brasileira: a carga tributária e a taxa de juros excessivamente elevadas e a taxa de câmbio apreciada e instável. São três questões extremamente complexas, cada uma envolvendo inúmeras variáveis e, que também estão interrelacionadas entre si, e portanto, a suas soluções não são simples e imediatas. Todas elas requerem um conjunto grande de mudanças. Mais do isso, a questão da taxa de juros e da carga tributária está profundamente enraizada na economia brasileira de tal forma que podemos falar que se adquiriu caráter estrutural. A elevada taxa de juros Selic, com o Banco Central aprisionando grande parte da poupança nacional no open market, não permitiu o desenvolvimento da verdadeira função do mercado financeiro, ou seja de financiar a longo prazo os investimentos produtivos com taxas de juros internacionalmente competitivas.

Por trás da elevada carga tributária temos tanto um modelo burocrático apropriador, extremamente ineficiente, mas também um pacto político e um pacto federativo, fatores estes que se traduzem numa estrutura de gastos, vinculações e extrema ineficiência dos serviços públicos. Portanto, são questões urgentes para desamarrar a economia brasileira, mas cuja natureza é institucional/estrutural e que envolvem reformas de envergadura que não se fazem do dia para noite.

Se a presidente declara que estas três são as amarras da economia brasileira, esperamos que venha logo atacar de frente, embora saibamos da extrema complexidade e de seu enraizamento na estrutura da economia e sociedade brasileiras. Tivemos uma boa amostra na questão da taxa de juros da caderneta de poupança, o que deixa o país esperançoso.

É importante lembrar que sem remover as três amarras, a economia brasileira não crescerá a taxas mais elevadas. Com certeza, a equipe econômica sabe disso. Se a presidente tem o diagnóstico correto, tudo leva a crer que as medidas recentemente tomadas estimulando o consumo são medidas de impacto imediato e efêmeras, que permitirão alguma recuperação no segundo semestre.

No entanto, não pretendem reverter as expectativas de longo prazo e ativar o "espírito animal" dos empresários, elevando a taxa de investimento para 25% do PIB, e lançar a economia brasileira numa nova trajetória de crescimento acelerado de longo prazo. Para isso, é preciso muito mais.



Yoshiaki Nakano, ex-secretário da Fazenda do governo Mário Covas (SP), é professor e diretor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas - FGV/EESP

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