terça-feira, 15 de maio de 2012

Ingerência do governo tem prejudicado a bolsa?


Valor 15/05
Por André Rocha




A bolsa brasileira tem mostrado movimento errático no ano. Após subir 20,5% até o dia 13 de março, o Ibovespa vem caindo sistematicamente desde então. Quais as razões para a queda? Alguns analistas sustentam que o aumento da interferência governamental é responsável pelo mau desempenho. Será?

O Ibovespa fechou 2011 a 56.754 pontos. Até meados de março, a bolsa apresentou forte valorização, atingindo 68.394 pontos em 13 de março. “Dia de muito, véspera de pouco”, diria o provérbio popular. Desde então, a bolsa caiu 13,1% até 11/05/2011. No ano, a bolsa ainda sobe 4,7%.

Cresce no mercado a interpretação de que a bolsa adquiriu esse comportamento após o incremento do ativismo politico. Há vários exemplos que retratariam a maior interferência governamental sobre a economia :

1) A decisão do governo de incentivar os bancos públicos a reduzir suas taxas de juros sobre o crédito de forma a pressionar os bancos privados a adotarem a mesma estratégia o que teria como consequência a queda do spread bancário;

2) Ingerência do governo sobre o mercado cambial que contribuíram para a apreciação do dólar frente ao real nos últimos meses;
3) Discussão para incremento do royalty sobre as atividades de mineração;

4) Não repasse do aumento do preço do barril de petróleo para o dos combustíveis que prejudica a geração de caixa da Petrobras;

5) Mudança no cálculo da caderneta de poupança, sinalizando queda mais acentuada dos juros;

6) Alterações, nos últimos seis meses, na direção da Embraer, que possui como sócios o fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil (BB) e o BNDES.

Comunicado de abril do conceituado fundo Verde do Credit Suisse Hedging-Griffo também vai nessa linha. Ele trata de uma teoria concebida pelo gestor americano Peter Thiel, responsável pelo hedge fund Clarium Capital. A ideia é que, tal como nos ciclos econômicos, existem também ciclos políticos onde há maior (“bull market in politics”) e menor (“bear market”) interferência governamental. A conclusão é de que, após a crise de 2008, a Europa e os EUA entraram em um período de “bull market in politics”. O Brasil teria ingressado nesse clube em agosto de 2011. E segundo a carta, “a evidência histórica mostra que os mercados acionários passam por quedas estruturais dos múltiplos em períodos de ‘bull market in politics’”.
A maior ingerência do governo na agenda econômica pode ter contribuído para a queda da bolsa, especialmente a incerteza sobre o comportamento da inflação após a redução dos juros e a depreciação do real. E aqui me alinho à corrente “anti-governo”, pois também não estou convencido de que a inflação permanecerá comportada. Contudo o desempenho do mercado acionário não é reflexo apenas de um fator. Tal como os acidentes aéreos são resultados de causas diversas. Logo não quero atrelar a queda da bolsa apenas a maior interferência governamental.

Além disso, o mercado financeiro possui uma agenda liberal, logo é natural a aversão às atividades governamentais. Mas cabe relembrar episódios recentes onde o mercado financeiro se equivocou. Logo é prudente ter um distanciamento crítico:

1) Em 1999 após a desvalorização cambial, houve corretoras americanas alardeando inflação de 80% ao ano. A realidade se mostrou bem distinta com o IPCA alcançando 8,9% naquele ano;

2) Economistas ortodoxos rejeitavam aumentos reais do salário mínimo receosos de uma explosão da inflação. Embora o ganho real empreendido no salário mínimo pelo governo petista tenha contribuído para um aumento discreto da inflação, o aumento da massa salarial tem sido importante para a manutenção da atividade econômica. O fortalecimento da classe média tornou-se um ativo cobiçado por investidores estrangeiros;

3) Após o inesperado corte da Selic em agosto, o BC foi duramente criticado. Após nove meses, boa parte do mercado fez um “mea culpa”, aplaudindo a decisão da autoridade monetária.

Acredito que a razão da queda da bolsa desde março está mais associada a dois eventos externos e a um movimento técnico:

1) O aumento das incertezas na zona do euro no último mês decorrentes da vitória do candidato socialista na França com um discurso de menor austeridade fiscal, do resultado das eleições gregas que aumentaram as chances de o país deixar a moeda europeia e da estatização do banco espanhol Bankia;

2) A atividade econômica mais fraca na China o que pode comprometer o preço de nossas commodities afetando algumas importantes companhias brasileiras como a Vale;

3) A realização de lucros após o forte rali do início do ano.

Assim um olho na Europa e na China e outro na inflação interna. Esses são os indicadores chaves para determinar o futuro desempenho da bolsa brasileira.

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