sexta-feira, 18 de maio de 2012

Dólar alto ajuda indústria, mas pressiona os custos


Editorial Valor 18/05


Deve-se tomar cuidado com aquilo que se deseja. A forte elevação do dólar nos últimos meses, festejada pelo governo como impulso para a indústria por encarecer os produtos importados, tem um outro lado. Está também elevando os custos de insumos importantes para a própria indústria, que nem sempre consegue repassar o aumento para o consumidor.

Desde o início do ano, o dólar subiu 7%; e desde março, quando começou a arrancada recente, a alta é de 13,5%. A cotação do dólar saiu de R$ 1,70 no fim de fevereiro para cerca de R$ 2,00 atualmente. A alta foi patrocinada principalmente pelo Banco Central (BC), que entrou 16 vezes no mercado de câmbio só em abril, comprando dólar muitas vezes quando a cotação já estava em alta, em um total de US$ 7,2 bilhões, sinalizando claramente ao mercado o desejo de aumentar o patamar de negociação da moeda americana. Mais recentemente, o BC ganhou ajuda do aumento da turbulência na zona do euro, que valorizou o dólar no mercado mundial.

Reportagens recentes do Valor mostram que a alta do dólar já tem impacto ainda que pequeno na redução da importação de bens industriais. Dois levantamentos mostram isso. Os produtos importados atenderam 22,6% da demanda de bens industrializados no primeiro trimestre deste ano, menos do que os 24% registrados nos últimos três meses de 2011, de acordo com cálculos da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp). Em 20 dos 33 setores analisados houve queda das importações nesse período, com destaque para aeronaves, material eletrônico, aparelhos de comunicação e artefatos de couro. Nas contas feitas pela consultoria LCA, a redução da participação dos importados no consumo de bens industriais foi menor, de 22,8% para 22,5% no mesmo período, mas também ocorreu.

A penetração dos produtos industriais importados no mercado doméstico também diminuiu com a redução da demanda causada pelo enfraquecimento da economia. A comemoração ficou pela metade porque a produção da indústria diminuiu 2,9% no primeiro trimestre.

Mas o encarecimento dos produtos importados também prejudica a própria indústria, que, nos últimos anos, passou a comprar cada vez mais insumos e semielaborados no exterior para reduzir seus custos. De acordo com o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic), 43,8% das importações de janeiro a abril são matérias-primas e bens intermediários, totalizando US$ 31,2 bilhões. Em alguns casos, houve outras pressões no preço, além do dólar. As resinas plásticas, por exemplo, que representam cerca de 60% do preço de um produto plástico, subiram com o dólar e com o petróleo, o que provocou a queda de 6% da venda de transformados plásticos. O aço subiu 5% nos últimos 30 dias, puxado pelo dólar e pelo minério de ferro; e o preço do papelão, 8% por causa da celulose e também do câmbio. Entre os insumos industriais, as maiores altas em abril foram da borracha (7%), barrilha (4%), placa de aço (4,1%), resina plástica (4%) e papel kraft (1,5%).

O aumento desses produtos repercute no IGP-DI, índice que acompanha de perto os preços no atacado. No IGP-DI de abril, o subgrupo materiais para manufatura avançou 3% após o aumento de 0,74% em março. Pode ser uma mudança de padrão.

Não é certo que esse aumento de custos chegue ao varejo. Algumas indústrias estão conseguindo segurar os preços porque fizeram encomendas quando o dólar estava mais baixo. Além disso, fraca demanda inibe reajustes vigorosos de preços. Há ainda a expectativa de que o dólar não se mantenha no patamar atual. A expectativa do mercado financeiro para a cotação do dólar no fim do ano, apurada na pesquisa Focus desta semana, subiu pouco, apesar da escalada recente da moeda. A previsão agora é que o dólar vai fechar o ano em R$ 1,85; há um mês era de R$ 1,80.

Após a aceleração expressiva do IPCA, de 0,21% em março para 0,64% em abril, não se espera muita alteração na trajetória de baixa do índice acumulado em 12 meses, até porque estão saindo da conta números muito altos de 2011. Há ainda o impacto positivo da sinalização de queda dos juros dada pelo governo, agora sem o freio da remuneração da caderneta de poupança. Convergir a inflação para o centro da meta como insiste o BC em toda ata do Copom, porém, é cada vez mais difícil. Apesar de tudo, as previsões do mercado são de uma inflação razoavelmente abaixo do teto da meta neste ano e no próximo.

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