quinta-feira, 24 de maio de 2012

Com forte saída de dólar, BC muda postura




Por Eduardo Campos e João José Oliveira - Valor 24/05
De São Paulo

A percepção de saída de recursos do país ganha números. A avaliação é de que os estrangeiros que estão saindo da Bovespa estão remetendo dinheiro para fora do país. O saldo estrangeiro na bolsa estava negativo em US$ 3,085 bilhões em maio até o dia 21. No mesmo período, o Ibovespa acumulava queda de 8,5%.

Os dados sobre o fluxo cambial divulgados ontem também mostram remessas. Agora em maio até o dia 18, a conta financeira mostra saída de US$ 5,196 bilhões. Tal resultado é o pior desde dezembro de 2008 (ver texto abaixo).

Ontem, pela primeira vez, o Banco Central explicitou preocupação com a disparada do dólar. O recado chegou pelo diretor de política econômica do Banco Central, Carlos Hamilton, o que, juntamente com a atuação do BC no mercado, contribuiu para que o dólar invertesse a tendência e fechasse em forte queda, depois de ter testado o limite de R$ 2,10 mais cedo.

Segundo o diretor executivo da NGO Corretora, Sidnei Nehme, a saída financeira de dólares é um sinal de alerta. Como a conta comercial está firme e positiva, com entrada de US$ 3,686 bilhões, o resultado líquido do fluxo cambial no mês até o dia 18 é negativo de "apenas" US$ 1,511 bilhão.

Segundo Nehme, esse aumento das exportações pode ser visto como uma "antecipação no tempo". Em função da taxa favorável há um maior número de fechamento de contratos de câmbio e mesmo ingressos relacionados ao comércio externo. No entanto, esse ingresso pode não se mostrar muito sustentável. Com isso, essa conta negativa do fluxo ficaria ainda mais negativa.
"Esses fluxos comerciais mascaram a saída financeira. Não se pode falar em fuga de dólares do país, mas esse número precisa ser acompanhado", diz Nehme.

Segundo o especialista, essa saída financeira pode ser composta por retirada de investimentos e pela não rolagem de captações externas, conforme as condições deixaram de ser favoráveis.

"Meu receio é que, se o fluxo continuar negativo, vai acabar consumido a posição comprada dos bancos. E esse problema que está localizado no mercado futuro de dólar chega ao mercado à vista. Essa saída de US$ 5 bilhões é um aviso", diz Nehme.

Com o fluxo negativo de US$ 1,511 bilhão em maio até o dia 18 é possível estimar que a posição comprada dos bancos no mercado à vista tenha caído de US$ 5,99 bilhões no fim de abril, para cerca de US$ 4,5 bilhões. Ou seja, ainda há dólares disponíveis no mercado à vista.
Ampliando a análise, Nehme aponta que a avaliação sobre o Brasil mudou, o julgamento é mais crítico com relação ao país.

Na visão do especialista, mesmo que a crise abra boas oportunidades de investimento, esses recursos esbarram na avaliação de que o país é "caro" em diversos sentidos, como tributação e falta de infraestrutura.

As posições em derivativos de bancos e fundos locais têm estoques entre os maiores já registrados. A posição vendida (pró-real) dos bancos em dólar futuro está em US$ 8,48 bilhões, a maior desde setembro do ano passado. Colocando na conta a posição em cupom cambial (DDI - juro em dólar no mercado local), o estoque vendido é de US$ 18,570 bilhões.

Na ponta oposta estão os fundos, com uma posição comprada (pró-dólar) de US$ 15,417 bilhões, são US$ 7,15 bilhões em dólar futuro e US$ 8,267 bilhões comprados em cupom cambial.

Os estrangeiros estão "pequenos", com posição líquida comprada de US$ 2,367 bilhões.

No mercado de câmbio, ontem, o leilão de swap cambial (que equivale à venda de dólares no mercado futuro) e o aceno de que o excesso de volatilidade é preocupante, dado por Carlos Hamilton, abriram espaço para a venda de dólares depois de uma arrancada de alta que levou as cotações a testar a linha de R$ 2,10.

O dólar comercial terminou o dia com baixa de 1,97%, segunda maior queda percentual do ano, a R$ 2,039 na venda. Antes disso, a moeda subiu a R$ 2,106 (+1,25%).

E uma baixa já está contrata para a abertura do pregão desta quinta-feira, já que o preço à vista descolou do futuro. Na Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F), onde os negócios encerram às 18 horas, o dólar para junho caiu 2,91%, para R$ 2,0345. Na máxima testou R$ 2,111 (+0,74%).

Pelas análises gráficas, o dólar cumpriu objetivo de alta de R$ 2,10. Agora, entra em regime de correção com primeira parada a R$ 2,0, seguida por R$ 1,97.

Os swaps e o discurso de Hamilton, primeira sinalização de atenção do BC sobre a recente disparada do dólar, tiraram os compradores da zona de conforto.

A compra de dólar ficou mais arriscada em função desse aceno de maior disposição em atuar.

No entanto, diz um operador, além de falar, o BC tem de seguir atuando. Caso contrário, o mercado vai para cima dele novamente. "O discurso é bom, mas o mercado, agora, vai esperar a atuação. De fato, a melhor comunicação do BC é pela mesa de operação dele. O mercado não entende outra coisa que não seja prejuízo", diz. Para esse especialista, boa parcela da alta recente pode ser credita ao mercado "testando" a paciência do BC e do governo com a alta do dólar.

No mercado de juros, as taxas caíram depois de três dias de firme ajuste de alta. O que determinou o movimento de venda foi a percepção de que a crise da zona do euro ganha a cada dia contornos mais preocupantes - o risco da saída da Grécia do bloco cresce, detonando uma nova onda de "flight to quality". Isso se reflete na queda dos juros americanos e estimula a venda por aqui também.


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