quarta-feira, 25 de julho de 2012

Ilhas de isolamento



Por Guy Sorman - Valor 25/07

Os japoneses e os britânicos podem parecer muito diferentes, mas um olhar mais atento revela algo como um destino paralelo nesses dois povos insulares. Com suas velhas ambições imperiais e indiferença generalizada pelo grandes continentes dos quais são apartados pelos mais estreitos dos mares, tanto britânicos como japoneses são vulneráveis ao canto da sereia do isolacionismo. Infelizmente, agora parecem estar sucumbindo a essa tentação perigosa.

Talvez geografia seja destino. Como ilhéus, britânicos e japoneses mantiveram relações cautelosas com - e muitas vezes um complexo de superioridade em relação a - seus grandes vizinhos continentais, Europa e China, respectivamente. Ambos, historicamente, compensaram seu isolamento com fortes governos centrais, poderosas marinhas, dinâmico empreendedorismo, vibrante cultura e ambição imperial.

Hoje, o Japão e o Reino Unido são, supostamente, sociedades abertas, e partícipes no processo de globalização. Na realidade, ambos permanecem predominantemente introspectivos e preocupados com a desintegração de sua cultura original. Ambos tentam desesperadamente manter os imigrantes a distância, quer por meio de segregação cultural no Reino Unido ou, no caso do Japão, mediante rejeição pura e simples. Quanto mais civilizações tornam-se entrelaçadas na nova ordem mundial, mais os japoneses e britânicos ficam tentados a permanecer indiferentes e distantes.

No Japão, a tentação isolacionista é expressa na nostalgia atual pelo período Edo, de 1600-1868, antes de o imperador Meiji ter aberto o Japão para o mundo. O "Retorno a Edo" tornou-se um estado de espírito dominante e tema de debates públicos, promovidos por escritores, analistas e historiadores, como Inose Naoki (também vice-prefeito de Tóquio), para os quais os japoneses eram muito mais felizes em seu mundo fechado, isolado da perseguição de sucesso material e status internacional.

Esse discurso de "Regresso a Edo" se traduz na recusa de jovens japoneses a aprender línguas estrangeiras ou viajar ao exterior. Com efeito, na Europa, América do Norte e em outros lugares, os onipresentes turistas japoneses da década de 1970 foram substituídos por chineses e coreanos. O número de japoneses que estudam no exterior está em nova baixa, exatamente no momento em que sul-coreanos e chineses estão enxameando nas universidades europeias e americanas. Até mesmo nas grandes universidades, de Harvard a Oxford, diminui a presença de estudantes japoneses.

Nesse aspecto, os ingleses estão imitando intensamente os japoneses: cada vez menos estão aprendendo línguas estrangeiras, estudando no exterior e seguindo o velho caminho de trabalhar em Hong Kong, Singapura ou Austrália. Tão prevalente é o clima de "pequena Inglaterra", que o governo do primeiro-ministro David Cameron está agora tentado a realizar um referendo para perguntar aos britânicos se desejam permanecer no seio da União Europeia, uma votação cujos riscos até mesmo a arquieurocética Margaret Thatcher nunca assumiu.

A perspectiva de um referendo reflete o clima generalizado entre os conservadores, que às vezes mencionam a Noruega - um membro não pertencente à UE cujo principal papel nos assuntos globais é a atribuição do Prêmio Nobel da Paz - como modelo para o papel do Reino Unido no mundo. Sabemos que a Noruega tem a renda per capita mais alta do mundo. Mas esse não é o padrão relevante contra o qual o Reino Unido ou outros países ocidentais deveriam comparar-se, porque a Noruega tem uma população pequena, homogênea e possui vastos - e bem administrados - recursos naturais.

Se consultados num referendo, os britânicos poderão abandonar a UE, da qual nunca gostaram. Isso teria como consequência não intencional fortalecer os federalistas no Continente, acelerando, assim, a integração dinâmica que os britânicos agora querem deter.

Com efeito, os britânicos sairiam exatamente no momento em que a Islândia, Sérvia, Turquia e Ucrânia, apesar da atual crise europeia, estão tentando entrar. E embora a zona do euro possa estar em crise, a Polônia, entre outros, continua querendo aderir em futuro próximo. Os britânicos podem torcer seu nariz diante do euro - ao qual até mesmo o supostamente independente franco suíço é atrelado - mas a moeda quase certamente continuará sendo usada por quase 300 milhões de europeus.

Isolacionismo, seja no Japão ou no Reino Unido, não é apenas uma opção míope, especialmente para o Japão, como pode também ser perigosa, dada a ascensão da vizinha China. Tanto o Japão como o Reino Unido, por mais que não queiram admiti-lo, dependem do mercado mundial. O isolacionismo deixaria seus cidadãos despreparados para enfrentar a concorrência e excluiria seus governos das decisões que impactam a economia e o comércio mundial. E o isolacionismo também não pode garantir a segurança nacional num momento de crescentes ameaças de grupos terroristas e de crescentes ambições da China e da Rússia.

A nostalgia da era Edo no Japão e a sedução do modelo norueguês no Reino Unido não são escolhas racionais. Elas simplesmente canalizam os temores nacionais num momento de competição mundial entre culturas, economias e ambições estratégicas emergentes.

Por vezes, nações, como pessoas, ficam fatigadas e anseiam por sua juventude idealizada - um fenômeno recorrente que os historiadores denominam "declinismo". Quer usemos esse rótulo ou digamos tratar-se de um desejo de "tirar férias da história", o Japão e Reino Unido hoje parecem estar optando por um caminho que somente acelerará seu declínio. (Tradução de Sergio Blum).



Guy Sorman, filósofo e economista francês, é o autor de "Economics Does Not Lie" (a economia não mente). Copyright: Project Syndicate, 2012.



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