terça-feira, 10 de julho de 2012

Ceticismo ronda estratégia de BCs



Por Eduardo Campos - Valor 10/07
De São Paulo

O modelo de resposta dos bancos centrais à crise iniciada em 2008 dá cada vez mais indicações de desgaste. A crise caminha para o quarto ano e não há sinais de que o crescimento da economia sairá dos discursos e virá dar as caras no mundo real. Dentro desse ambiente, o investimento em ações perde apelo, as taxas de juros globais devem seguir em baixa e o dólar, por mais contraditório que pareça, pode reafirmar posição como "porto seguro" em função de sua elevada liquidez.

Mais um aceno de que a estratégia composta por juros baixos e impressão de dinheiro não convence mais ninguém veio na semana passada. Banco Central Europeu (BCE) e Banco da China cortaram juros e o Banco da Inglaterra (BoE) ampliou seu programa de compra de ativos. A resposta foi zero nos mercados. Nada de corrida eufórica para os ativos de risco.

Tem até banco apelando para o desconhecido, como o Banco da Dinamarca, que instituiu juro negativo para as instituições que quiserem estacionar seus depósitos junto à autoridade monetária.
"Me parece que estamos em um fim de jogo. Políticas velhas e ineficazes não estão impactando mais o psicológico dos agentes de mercado e as empresas não acreditam num ambiente econômico melhor", diz o sócio da Teórica Investimentos, Rogério Freitas.

A política do dólar fraco instituída pelo Federal Reserve (Fed), banco central americano, desde 2008 também já deixou de funcionar. Com o juro baixo e a impressora de dólares ligada, pintando o mundo de verde, o BC americano tinha três objetivos principais: afastar a deflação, dar confiança aos consumidores e ampliar as exportações do país.

A deflação seria afastada via aumento no preço das commodities, algo obtido pela perda de valor do dólar. O juro baixo e a moeda fraca também resultariam em aumento nos índices de ações, melhorando a confiança dos consumidores. E por fim, o dólar baixo impulsionaria as exportações americanas, contribuindo para reativar a atividade.

Durante um período essa política funcionou bem, o dólar perdia valor, as bolsas subiam e as commodities também. Mas, novamente, tal estratégia é colocada em xeque.

Para Freitas, os últimos dados sobre a criação de empregos nos Estados Unidos - 80 mil postos em junho ante 100 mil previstos - mostram que o setor privado não está contratando, não está investindo e não acredita num futuro mais otimista.

"As políticas com estratégia de reflacionar os preços dos ativos, criando inflação, não surtiram efeito, nem surtirão. O Fed vem insistindo em encontrar a saída do excesso de dívida através da criação de mais inflação, mas, depois de quatro anos sem resultado, a conta fiscal está chegando", diz Freitas.

A ideia de "empurrar a economia" com as medidas de liquidez e juro baixo e, assim, adiar o pagamento da conta fiscal está parando de funcionar. A conta de tal estratégia está chegando antes do resultado (crescimento) aparecer.

"O aperto fiscal que está por vir no início de 2013 é gigantesco, mas inadiável, dada a deterioração das contas do governo americano", diz Freitas.

Uma série de incentivos fiscais vai expirar no começo do próximo ano, ameaçando "roubar" alguns pontos percentuais do PIB dos EUA. O assunto ainda não atingiu o mercado em cheio, mas já está na agenda do presidente do Fed, Ben Bernanke, que vem pedindo aos políticos para lidarem com essa questão. A ideia seria em diluir o aperto fiscal para não ameaçar o já fraco desempenho da economia.

Para Freitas, o modelo de transferência de recursos do setor público para o privado via empresas parou de funcionar. As injeções de liquidez não circulam na economia. Elas estão, em última instância, retidas nos balanços das empresas, que constroem um colchão de liquidez em função de um futuro nebuloso.
Com isso, o setor privado não contrata e não investe. Dentro desse quadro perverso, o desemprego tende a aumentar e o consumo a diminuir ainda mais.

"Aquele ambiente onde as empresas ficavam imunes ao baixo crescimento, porque tinham caixa e ainda pagavam algum dividendo melhor do que os juros zero, está com os dias contados", avalia.

Para Freitas, as ações do BC visam adiar o inevitável. O doloroso caminho da desalavancagem não só nos EUA, mas no mundo todo. O sistema parece não aguentar o volume de dívidas e alavancagem oriundos da crise e mais a montanha de dívida "nova" criada para lidar com o endividamento "antigo".

Esse complexo quadro se agrava mais conforme a agenda fiscal aperta nos EUA e está em constate discussão na zona do euro.

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