segunda-feira, 28 de maio de 2012
Um novo "New Deal" mundial
Por Jomo Kwame Sundaram - Valro 28/05
Recentes acontecimentos políticos, como a derrota dos governistas na França e Grécia, indicam que a tolerância do público com políticas econômicas que não reduzem o desemprego implodiu. De fato, tendo em vista a atual situação alarmante na economia e no emprego em muitos países e a falta de perspectivas de recuperação no horizonte, há probabilidades de mais turbulências políticas à frente, a menos que as autoridades mudem de rumo de forma condizente.
A crise econômica eliminou mais de 50 milhões de empregos, na sequência de anos de aumento na desigualdade e de crescimento econômico baixo e pobre em geração de empregos nos países mais ricos. Desde 2007, os índices de emprego subiram em apenas seis entre 36 economias avançadas, enquanto o desemprego aumentou na grande maioria tanto dos países emergentes como dos já consolidados.
No curto prazo, a crise mundial deverá tornar-se pior, já que muitos governos, especialmente nas economias avançadas, priorizam a austeridade fiscal e reformas rigorosas no mercado de trabalho, mesmo que essas medidas corroam a renda, meios de vida e o tecido social.
Paralelamente, apesar da flexibilização monetária quantitativa, muitas empresas veem-se com acesso limitado ao crédito, o que contém investimentos e reduz a criação de empregos. O crédito fácil antes da crise encorajou o excesso de investimentos em setores que se imaginavam lucrativos, como o imobiliário. Não é de surpreender que o excesso de capacidade resultante agora desencoraje os investimentos privados na economia real.
Com o aumento da desigualdade e o desemprego e o encolhimento da renda e dos mercados domésticos, todos esperam recuperar-se exportando - uma solução obviamente impossível. Os países em desenvolvimento, por muito tempo encorajados e até pressionados a exportar e aderir à globalização, foram aconselhados repentinamente a mudar de direção: a produzir para o mercado doméstico e importar mais. A ironia é que esse conselho chega quando boa parte de sua antiga capacidade produtiva desapareceu.
Muitas economias de mercados emergentes, no entanto, depois de várias crises no câmbio e nas contas de capitais em tempos de maior abertura, ainda se sentem inclinadas a acumular reservas internacionais gigantescas como forma de proteção diante da maior volatilidade financeira mundial. Enquanto isso, o "espaço de políticas" nacionais para recuperar as economias encolheu desde a crise.
Investimentos públicos e proteções sociais básicas podem ajudar a mudar isso, criando milhões de empregos. Apesar das fortes evidências em contrário, no entanto, a suposição de que o investimento público tira de cena o capital privado continua a desencorajar esforços de recuperação econômica encabeçados por governos.
Na verdade, historicamente, as economias mais avançadas já viveram com déficits fiscais bem maiores do que os atuais, e não apenas em tempos de guerra. Esses déficits financiaram expansões sólidas, sustentáveis e inclusivas, não apenas para suas próprias economias, mas também para o exterior - como o Plano Marshall nos Estados Unidos, tão importante para a reconstrução e recuperação europeia do pós-guerra.
Agora, contudo, como a transferência avassaladora de recursos financeiros dos governos para salvar determinadas instituições privadas consideradas grandes demais para falir levou a um aumento drástico no endividamento soberano, as autoridades impuseram a austeridade fiscal em deferência às exigências dos mercados de bônus. Enquanto isso, os países da região do euro veem-se restringidos, não apenas por seu fetiche fiscal, mas também por sua falta de flexibilidade no câmbio.
Além disso, a cooperação multilateral em favor da recuperação mundial vem sendo decepcionante desde 2009 - o ano dos encontros do G-20 em Londres e Pittsburgh e do Pacto Mundial pelo Emprego *, que trouxe poucos progressos significativos desde então. Como resultado, os últimos três anos testemunharam poucas ações orientadas ao desenvolvimento e adoção de estratégias que tragam uma recuperação sólida, sustentável e inclusiva. Em vez disso, vimos emergir um protecionismo gradual, e não apenas no front do comércio exterior.
Como, então, o mundo pode escapar desse beco sem saída construído pelas perspectivas de curto prazo dos mercados financeiros e da política eleitoral?
Embora o multilateralismo inclusivo tenha sido abalado por vários desafios, incluindo sua aparente desordem e progresso lento, continua como a melhor opção, por vários motivos. O sistema da Organização das Nações Unidas (ONU) precisa ser mais proeminente, mas interesses poderosos também precisam permitir que desempenhe um papel maior.
Em 2009, admitindo que apenas as forças de mercado não iriam gerar os investimentos necessários para atenuar as mudanças climáticas assim como alimentos acessíveis para todos, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon propôs um "New Deal Verde Mundial", com parcerias público-privadas e entre países, especialmente para gerar energia renovável e aumentar a produção sustentável de alimentos.
Sob a recente liderança francesa, o Fundo Monetário Internacional (FMI), depois de décadas promovendo a globalização e a liberalização econômica - especialmente financeira -, tornou-se mais cuidadoso, se não cético, quanto às suas análises, prescrições e atividades prévias. Da mesma forma, iniciativas recentes da Organização Internacional do Trabalho (OIT) - como a Globalização Justa**, o Pacto Mundial pelo Emprego e o Piso de Proteção Social*** - são diretamente relevantes, todas, para lidar com a estagnação atual.
A estrutura única da OIT entre as organizações internacionais, de inclusão de trabalhadores e empregadores como parceiros sociais em sua governança tripartite lhe permite ajudar a liderar os processos, certamente complicados, necessários para assegurar um crescimento e uma recuperação sólidos, sustentáveis e inclusivos. Portanto, talvez mais do que nunca nas últimas décadas, as instituições multilaterais inclusivas agora estão na mesma página. Seus esforços precisam, agora, do apoio que merecem. (Tradução de Sabino Ahumada)
* www.ilo.org/jobspact/lang--en/index.htm
** www.ilo.org/public/english/wcsdg/docs/report.pdf
*** www.un.org/en/ga/second/64/socialprotection.pdf
Jomo Kwame Sundaram é secretário-geral assistente para Desenvolvimento Econômico na Organização das Nações Unidas (ONU) e coordenador de análises do G-24. Copyright: Project Syndicate, 2012.
www.project-syndicate.org
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