terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Alemanha - entre os Bric s e o euro



Por Wolfgang Münchau - Valor 07/02

Angela Merkel recém-retornou de Pequim, num ano em que a China está prestes a tomar o lugar da França como maior parceira comercial da Alemanha. Quando isso acontecer, será um momento simbólico. Isso também incentivará aqueles que atualmente colocam a seguinte indagação: deveria a Alemanha se desembaraçar dos problemas na zona do euro e tornar-se um Bric - uma potência econômica mundial de porte médio, como o Brasil, a Rússia, a Índia e a China?

A primeira vez em que ouvi essa noção da Alemanha como um dos Brics foi de Ulrike Guérot, do Conselho Europeu de Relações Exteriores, que se opõe veementemente às tendências separatistas antieuropeias na Alemanha. Provavelmente, a expressão mais clara dessa ideia foi expressa recentemente por Wolfgang Reitzle. O CEO da Linde, um grupo industrial alemão, disse que a Alemanha deveria pensar em sair da zona do euro. Isso poderá produzir alguma dor no curto prazo, reconhece ele, mas aumentaria a competitividade alemã de longo prazo.
Sempre achei a obsessão da Alemanha por competitividade uma das causas profundas da crise da zona do euro. A busca ativa de grandes superávits em conta corrente contribuiu para os desequilíbrios internos na zona do euro. Para um país do tamanho da Alemanha, pode ser viável - apesar de equivocado -, formular a política econômica dessa maneira. Para uma economia grande como a zona do euro, é insustentável.

Algo aquém de um endosso imediato a uma "estratégia Bric" é a exortação a que a Grécia e outros países periféricos deixem a zona do euro. Klaus-Peter Müller, presidente do conselho de supervisão do Commerzbank, defendeu isso recentemente. Manter a zona do euro coesa claramente não é mais a prioridade das comunidades empresarial e financeira alemã. Na década de 1990, elas eram as mais fortes defensoras da união monetária.

A desilusão do establishment em relação a seus vizinhos a oeste e ao sul coincide com um aumento da sua autoestima no Leste. Recentemente, fui lembrado dessa mudança num jantar em Berlim com um grupo de jornalistas, quando um deles disse-me que os jovens berlinenses vêm Moscou como, disparada, a cidade "mais legal" na Europa, depois da própria Berlim, é claro. Varsóvia, também está alta nessa escala de atratividade, à frente de Londres, Paris ou Nova York. A velha Berlim era dividida entre ocidental e oriental. A jovem Berlim mira o leste. O empresariado alemão parece mirar ainda mais longe rumo leste.

O sentimento de uma Alemanha à deriva é sentida em outros países da zona do euro. Após o trágico tombamento de um navio ao largo da costa da Itália, um jornal italiano publicou uma charge em que o chanceler alemão aparece num bote salva-vidas remando para longe da Discórdia, ignorando apelos para que retornasse a bordo. Até mesmo eu acho isso injusto com Angela Merkel. Ela pode ter cometido erros políticos graves em sua gestão da crise, e sem dúvida cometerá outros no futuro. Ela não está se preparando para uma saída alemã da zona do euro. Mas, se os alemães querem reposicionar-se no mapa da economia mundial, o sistema político encontrará uma maneira de acomodar isso.

Estamos essencialmente discutindo uma nova variante da "questão alemã". Com a unificação, a Alemanha tornou-se grande demais para tornar-se um Estado europeu comum, mas não suficientemente grande para ser uma superpotência. O ministro das Relações Exteriores da Polônia, Radoslaw Sikorski, pediu, recentemente, mais liderança alemã na Europa. Mas nas poucas ocasiões em que a Alemanha assume a liderança, é recebida com escárnio.

No fundo, os alemães não querem liderar a Europa porque não estão dispostos a pagar o preço da liderança. É por isso que tem sido tão importante para o governo apresentar um teto claramente definido para a responsabilidade máxima da Alemanha nas operações de socorro à zona do euro. Para seus defensores, a "estratégia Bric" oferece uma maneira de sair do dilema "pequena ou grande?".

Isso não vai funcionar, é claro. A Alemanha deriva muito de sua força atual de uma taxa de câmbio real desvalorizada. Isso, por sua vez, deve-se a uma combinação de moderação salarial e queda na taxa de câmbio nominal em relação ao dólar e outras moedas - um resultado da má gestão da crise na zona do euro. Um novo D-Mark flutuante anularia os ganhos da recente década. A Alemanha também tem sido uma das principais beneficiárias do mercado único europeu.

Se a Alemanha seguisse na "trilha Bric" de Reitzle, muitas empresas, possivelmente até mesmo sua própria companhia, verificaria ser mais atraente transferir-se para o remanescente da zona do euro, que se beneficiaria de uma taxa de câmbio mais atraente. Seria o cúmulo da ironia. Os "briqueiros" focados no leste descobrirão que simplesmente não há alternativa política e econômica viável. A Alemanha é um país europeu muito antigo e muito rico, com uma população em declínio - o oposto total de um Bric. (Tradução Sergio Blum)



Wolfgang Münchau é editor do FT, especialista em União Europeia.

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