quinta-feira, 20 de dezembro de 2012
Produção de petróleo nos EUA tem a maior alta da história
Por Asjylyn Loder
Bloomberg
Os EUA tiveram este ano a maior expansão de sua produção de petróleo desde que o primeiro poço comercial americano foi aberto no país, em 1859, revertendo a crença de que o país dependeria cada vez mais de petróleo estrangeiro.
A produção cresceu 766 mil barris por dia, um recorde, para o maior nível em 15 anos, mostram dados do governo. Isso deixa o país a caminho de superar a Arábia Saudita como maior produtor do mundo em 2020. As importações líquidas de petróleo caíram mais de 38% desde o pico em 2005, e agora respondem por 41% da demanda, abaixo dos 60% de sete anos trás, aproximando os EUA de sua independência energética.
Sete anos depois de o presidente George W. Bush declarar que "os EUA são viciados em petróleo, grande parte do qual é importado de regiões instáveis do mundo", o país tem tanto petróleo que lhe foi possível assumir a mesma à posição que os europeus, barrando as exportações do Irã sem pressionar o preço de referência americano para acima de US$ 100 o barril. E a capacidade de refino contribuiu para tornar os EUA o maior fornecedores mundial de combustível. Mesmo na Venezuela, onde ativos da Exxon Mobil foram expropriados, mais e mais carros são movidos a gasolina produzida nos EUA.
"Os EUA têm uma grande dianteira, no Século XXI, no sentido de manter seu status de superpotência", disse Ed Morse, diretor mundial de pesquisas de commodities no Citigroup, em Nova York. "Não havia absolutamente nenhuma maneira de prever o nível de crescimento da oferta de petróleo."
A mais recente corrida ao petróleo nos EUA foi estimulada por uma nova tecnologia que tornou a abertura de poços mais rápida, mais barata e melhor para extrair o petróleo de formações rochosas, ainda que tenha criado preocupações ambientais sobre o risco de contaminação da água potável e de intensificar as emissões de gases que provocam o efeito estufa.
Os produtores, interessados em lucrar com os preços que estão acima de US$ 75 há mais de dois anos, instalaram mais de 1.432 plataformas de perfuração, o maior número já registrado desde 1987.
Os EUA produzirão em média de 6,41 milhões de barris por dia este ano, uma alta de 14% em relação a 2011, segundo relatório de 11 de dezembro do Departamento de Energia. É o maior crescimento anual em barris desde o início das atividades no setor, quando o poço Drake, na Pensilvânia, deflagrou a primeira corrida ao petróleo americano, em 1859. A Arábia Saudita bombeou 9,7 milhões de barris por dia em novembro, segundo dados compilados pela Bloomberg. A Agência Internacional de Energia, com sede em Paris, disse no mês passado que os EUA estão a caminho de tornar-se o maior produtor em cerca de oito anos.
"A revolução do óleo de xisto é uma coisa muito nova", disse Francisco Blanch, chefe de pesquisa de commodities no Bank of America Merrill Lynch. "Isso começou do zero no último ano e meio".
Os estoques do país cresceram 13%, um recorde, neste ano, e as refinarias nos EUA estão pagando menos pelo petróleo do que a maior parte do resto do mundo. O óleo americano, de baixas densidade e teor de enxofre, custa menos para ser processado que os de altas densidade e elevado teor de enxofre, bombeados pela Arábia Saudita e pela Venezuela. Mantida no país por restrições a exportações e limitações de transporte, a enxurrada desse óleo provocou uma queda no preço interno, para até US$ 28 por barril a menos que o tipo Brent, um mix europeu que é referencial para os preços de mais de metade do petróleo do mundo.
Esse desconto proporcionou às refinarias da costa do Golfo do México uma vantagem sobre os concorrentes e ajudou os EUA a se tornarem um exportador líquido de combustível no último ano, pela primeira vez desde 1949, ultrapassando a Rússia como maior exportador. A Venezuela quintuplicou suas importações dos EUA, neste ano, para um recorde de 196 mil barris por dia, em setembro.
A crescente produção dos EUA também ampliou a influência do país no mercado mundial, obrigando a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) a fazer uma escolha desagradável: elevar a produção para baixar os preços e manter sua participação de mercado ou manter os preços altos para sustentar os gastos dos país, subsidiando, assim, a concorrência dos produtores americanos, capazes de fornecer óleo a refinarias locais a um preço inferior.
Os avanços sem precedentes surgiram tão rapidamente que a indústria petrolífera está correndo para se reposicionar. A vazão no oleoduto Seaway, de 800 km, cujo fluxo foi invertido no ano passado e agora leva óleo americano para o sul, rumo às refinarias da costa do Golfo, em vez de levar importações para o norte, será expandida dos atuais 150 mil para 400 mil barris/dia já no início de 2013.
Produtores de combustíveis no Nordeste dos EUA, à beira da insolvência um ano atrás, começaram a substituir óleo importado trazido por petroleiros da África, Europa e Oriente Médio por óleo local mais barato trazido por via férrea.
A exportação de petróleo é limitada por regras criadas pelo Congresso após o embargo do petróleo pelos árabes em 1973. Exportar pode ser necessário para evitar que um excesso de óleo deprima o preço e desencoraje a perfuração, disse Blanch, do Bank of America. O petróleo do tipo WTI, referência nos EUA, poderá cair para até US$ 50 o barril nos próximos dois anos, a menos que a lei seja flexibilizada.
O surto petrolífero, junto com a produção recorde de gás natural, permitiu aos EUA suprir 83% de suas necessidades energéticas nos primeiros oito meses de 2012, em tendência para ser a maior desde 1991. A última vez em que houve autossuficiência foi em 1952.
BC diz que riscos para a estabilidade global permanecem elevados
Valor 20/12
O Comitê de Política Monetária (Copom) voltou a traçar no Relatório Trimestral de Inflação, divulgado nesta quarta-feira pelo Banco Central (BC), um quadro de pessimismo em relação ao cenário internacional.
Embora veja recuperação da atividade em importantes economias emergentes, o colegiado volta a prever baixo crescimento das economias maduras por período prolongado de tempo, abaixo do crescimento potencial dessas economias.
Essa situação se deve muito ao que acontece na zona do euro, região onde incertezas políticas se somam ao ambiente recessivo e ao ceticismo quanto à solidez do sistema bancário de algumas economias da região. O cenário europeu também é consequência, segundo o Copom, do nível elevado da taxa de desemprego por longo período, dos ajustes fiscais implementados e dos seus efeitos sobre a atividade, além do espaço limitado para políticas anticíclicas.
O “ainda frágil cenário internacional” se apresenta como importante fator de contenção da demanda agregada, reafirmou o Copom no documento divulgado hoje, voltando a repetir a análise feita na ata da última reunião do colegiado, na qual não voltou a se referir ao cenário internacional como “desinflacionário”.
O Relatório de Inflação ainda afirma que o cenário central do Copom contempla “dinâmica relativamente benigna” para os preços das commodities nos mercados internacionais.
Especificamente sobre a influência dos preços internacionais do petróleo sobre a inflação brasileira, o colegiado afirma no documento que essas pressões não se materializam exclusivamente por intermédio do preço da gasolina, mas também via cadeia produtiva do setor petroquímico e pelo canal de expectativas de consumidores e de empresários.
Na análise do BC, a complexidade geopolítica que envolve o setor do petróleo tende a acentuar o comportamento volátil dos preços. Essa volatilidade é também reflexo da baixa previsibilidade de alguns componentes da demanda global e do fato de o crescimento da oferta depender de projetos de investimentos de longa maturação e de elevado risco, afirma o relatório.
BC reduz para 1% a projeção para crescimento da economia em 2012
O Banco Central reduziu sua projeção de crescimento da economia brasileira em 2012, segundo informou em seu Relatório Trimestral de Inflação, divulgado nesta quinta-feira. O Produto Interno Bruto (PIB) do país crescerá este ano 1% apenas, segundo o relatório trimestral de inflação divulgado na manhã desta quinta-feira. No relatório de setembro passado, a autoridade monetária previa um aumento de 1,6%.
Essa foi a terceira revisão do desempenho projetado pelo BC em relação ao nível atividade econômica doméstica do Brasil em 2012. No fim de 2011, a expectativa era de que, no ano seguinte, a economia crescesse 3,5% em termos reais, projeção mantida no relatório trimestral de março deste ano. Em junho, o BC reduziu a projeção para 2,5% e depois para 1,6%.
A nova revisão vem após a decepção generalizada, do governo e dos agentes econômicos privados, com o PIB efetivamente apurado para o terceiro trimestre de 2012.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) informou que o crescimento em relação ao trimestre abril-junho foi de apenas 0,6%, praticamente metade do que se esperava.
A série dessazonalizada do IBC-Br, índice de atividade econômica calculado pelo BC e que serve para antecipar a tendência do PIB, por exemplo, tinha apontado aumento de 1,15% na comparação do terceiro com o segundo trimestre, quase o dobro do que efetivamente apurou o IBGE.
Avanço no futuro
A economia brasileira vai crescer 3,3% no acumulado de quatro trimestres até setembro de 2013, segundo projeção divulgada pelo BC.
O número pressupõe aceleração do nível de atividade em relação ao período de quatro trimestres encerrados em dezembro de 2012, ano em que o PIB crescerá apenas 1%.
O novo relatório não traz previsão de crescimento para o ano fechado de 2013. O BC passará a divulgar sempre projeção para quatro trimestres à frente do último número conhecido do PIB (atualmente o de setembro de 2012), disse o chefe do Departamento Econômico do BC , Tulio Maciel.
A tabela publicada hoje não traz, tampouco, projeção para o ritmo de crescimento do produto até o fim do primeiro semestre de 2013. Mas, no relatório de setembro deste ano, a autoridade monetária previa que, no acumulado de quatro trimestres até junho do próximo ano, a economia brasileira já cresceria 3,3% sobre igual período imediatamente anterior.
BC: inflação no cenário de referência para 2013 cai de 4,9% para 4,8%
O Banco Central (BC) calcula que a variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (IPCA) será de 4,8% em 2013 e de 4,9% em 2014, na hipótese de a taxa básica de juros manter-se em 7,25% ao ano. O IPCA é o indicador oficial de inflação do país e é usado para balizar as metas de inflação perseguidas pela autoridade monetária.
O governo estabeleceu como meta para 2013 e 2014 uma inflação de 4,5% ao ano, tomado como referência o IPCA, com intervalo de tolerância de dois pontos para cima ou para baixo.
As projeções foram divulgadas na manhã desta quinta-feira, no Relatório Trimestral de Inflação, e referem-se ao cenário de referência, no qual a hipótese para a taxa de câmbio é um dólar também constante em R$ 2,05, nível em que estava em 7 de dezembro. Pelas projeções do BC, a inflação fecharia 2014, último ano do mandato da presidente Dilma Rousseff, acima do centro da meta, estipulado em 4,5% pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).
Além de projeções para o comportamento dos preços, o BC também reduziu sua projeção de crescimento da economia brasileira em 2012.
No relatório anterior, divulgado em setembro, a inflação projetada para 2013 era de 4,9%, mas os parâmetros macroeconômicos eram outros. O cenário de referência desse documento levou em consideração a meta de taxa Selic do momento, tendo como hipótese a taxa de juro básico constante em 7,5% ao ano, 0,25 ponto percentual acima do que foi considerado no novo relatório. O documento de setembro também pressupunha manutenção da taxa de câmbio em R$ 2,05, nível em que estava em 6 de setembro.
Pelas previsões divulgadas hoje, a inflação fecharia este ano em 5,7%, bem acima do teto da meta, mas inferior ao registrado no fim de 2011, de 6,5%, no limite superior do intervalo de tolerância da meta.
Para 2013, o BC projeta uma desaceleração da alta dos preços. Pelo cenário de referência, a projeção para o primeiro trimestre de 2013 continua em 5,7%, cai para 5,5% no segundo e ainda mais, para 4,9% no terceiro. No quarto trimestre, a projeção volta a cair para 4,8%.
Para 2014, a projeção aumenta para 5,1% no primeiro trimestre, patamar que se mantém no segundo trimestre. No terceiro e quarto, as estimativas são 5% e 4,9%, respectivamente.
De acordo com esse cenário, a probabilidade de que a inflação ultrapasse o teto (6,5%) em 2013 é de 12% e, em 2014, “em torno de 19%”.
As projeções do IPCA que constavam no relatório de setembro eram de 5,2% no encerramento deste ano e de 4,9% para o fim de 2013. Em 2014, a projeção era de que a inflação acumulada em 12 meses subiria 0,2 ponto percentual, ficando em 5,2% no primeiro trimestre. Em seguida, cairia para 5,1% no segundo e terceiro trimestres.
Juro mantido
O Banco Central reafirmou que a estabilidade da taxa básica de juros por “período de temposuficientemente prolongado é a estratégia mais adequada para garantir a convergência da inflação para a meta”.
A frase, no Relatório Trimestral de Inflação, reforça a sinalização de que a autoridade monetária deverá manter a taxa Selic em 7,25% ao ano ao longo de todo o ano de 2013.
Em sua última reunião, no fim de novembro, o Comitê de Política Monetária já tinha interrompido o ciclo de reduções de juros iniciado em agosto de 2011. Até outubro, a Selic caiu 5,25 pontos percentuais.
quarta-feira, 19 de dezembro de 2012
É necessário mais do que flertar com as políticas keynesianas
Por Fernando Ferrari Filho e André Moreira Cunha - Valor 19/12
Recentemente, alguns economistas têm argumentado que o tripé de política macroeconômica - regime de metas de inflação, metas de superávit fiscal e flexibilidade cambial -, em curso desde 1999, tem sido descaracterizado pelas autoridades monetárias no governo Dilma Rousseff. Argumenta-se que o Banco Central (BC) tem se preocupado mais com o crescimento do que com as metas de inflação, a política fiscal tem se tornado predominantemente contracíclica, comprometendo, assim, os superávits primários e as autoridades monetárias têm perseguido uma meta de câmbio. Nesse sentido, as críticas são direcionadas não somente para a descaracterização da referida política, mas, também, para a substituição dela por políticas intervencionista-keynesianas.
Serão consistentes tal argumentação e crítica? A recente política macroeconômica vem experimentando um período de transição, sem, contudo, romper com o arcabouço institucional herdado do período neoliberal. Ademais, não há garantias de que eventuais elementos tipicamente keynesianos introduzidos de forma ad hoc, e em momentos de crise externa, venham a se configurar em nova base filosófica e prática para a gestão econômica.
Conforme a teoria keynesiana, em um mundo incerto - em que os agentes econômicos, consumidores, firmas e instituições financeiras, tomam decisões de gastos, consumo, investimento e oferta de crédito, respectivamente - políticas macroeconômicas, fiscal, monetária e cambial, devem ser articuladas para expandir a demanda efetiva, estabilizar o nível de preços e equilibrar o balanço de pagamentos. Para tanto, o papel do Estado é fundamental, tanto para a operacionalização da política macroeconômica quanto para, por meio do que John Maynard Keynes na "Teoria Geral do Emprego, dos Juros e da Moeda", chamou de "socialização do investimento" - criar um ambiente institucional favorável às decisões de gastos dos referidos agentes.
No período recente, o governo brasileiro vem respondendo ao efeito-contágio da crise fiscal-financeira da zona do euro com um conjunto de medidas econômicas contracíclicas, cujo objetivo é mitigar os efeitos desta crise na atividade econômica. Entre as medidas implementadas, destacam-se: redução da taxa Selic para 7,25% ao ano; queda do IOF para as linhas de crédito ao consumidor; diminuição dos spreads bancários e aumento da oferta de crédito, especialmente, dos bancos públicos; redução e isenção, momentânea, de IPI e outros impostos para alguns setores econômicos, tais como automotivo, moveleiro, "linha branca" de consumo duráveis e construção civil; e adoção de mecanismos de controle de capitais - com o aumento do IOF sobre várias modalidades de transações financeiras entre não residentes e residentes - e intervenções recorrentes no mercado cambial a fim de estabelecer uma taxa de câmbio mais competitiva.
Além do mais, o governo Dilma Rousseff criou o Plano Brasil Maior - ou seja, uma nova política industrial visando promover setores econômicos estratégicos e investimentos em inovação tecnológica, pesquisa e desenvolvimento - e o Programa de Concessões e Parcerias que buscam expandir e melhorar as condições de oferta do setor industrial e de infraestrutura do país.
Apesar de reconhecermos que, desde 2011, há não somente uma inflexão pragmática da política macroeconômica, mas, também, um ajuste em seu foco - isto é, a preocupação, agora, não diz respeito apenas às questões de curto prazo e inflacionárias, mas o crescimento e o longo prazo entraram na agenda das autoridades monetárias -, sugerimos cautela em sua caracterização como keynesiana, pois: 1) assim como no segundo mandato do governo Luiz Inácio Lula da Silva, em que as políticas macroeconômicas contracíclicas foram implementadas em resposta aos desdobramentos da crise do subprime, no governo Dilma Rousseff as medidas fiscais, monetárias e cambial vieram ex-post à crise fiscal-financeira da zona do euro; 2) as autoridades monetárias não admitem, implícita e explicitamente, em seus discursos e relatórios econômicos (tanto do Ministério da Fazenda quanto das atas do Comitê de Política Monetária do BC), a substituição do tripé de política macroeconômica; e 3) a adoção de políticas macroeconômicas efetivamente keynesianas tem que ser observadas não somente em resposta às crises financeiras internacionais, mas, principalmente, em tempos normais, nas áreas fiscal, monetária e cambial.
Nesse sentido, ao contrário de austeridade fiscal, regime de metas de inflação, câmbio flexível e livre mobilidade de capitais, a política macroeconômica deve objetivar: responsabilidade fiscal, bem como não deve sacrificar todos os outros objetivos para garantir o pagamento dos rentistas; a política monetária deve ser orientada para, simultaneamente, garantir a manutenção de níveis elevados de emprego e de renda e controlar a inflação (quando essa for predominantemente de demanda); a taxa de câmbio deve ser administrada pelo BC; e mecanismos antiespeculação, com o intuito de regular os movimentos de capitais, que devem ser permanentes.
Concomitantemente, políticas estruturais devem ser aprofundadas para garantir a capacidade do Estado de redistribuir renda - para tanto, a regressividade do sistema tributário precisa ser enfrentada, com ampliação da contribuição das camadas de alta renda para o financiamento das políticas públicas - e, principalmente, ampliar os investimentos públicos para superar os gargalos de infraestrutura, imprescindíveis para dinamizar o setor produtivo.
Concluindo, o baixo e frustrante crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) no terceiro trimestre corrobora o argumento de que é necessário mais do que flertar com Keynes. Esperamos, assim, que o governo Dilma cristalize sua gestão keynesiana indo nessa direção, propiciando, assim, um ambiente institucional que melhore o estado de confiança do animal spirits dos empreendedores e, por conseguinte, haja expansão dos investimentos, condição necessária para dinamizar, sustentavelmente, o crescimento econômico.
Fernando Ferrari Filho é professor titular da Faculdade de Ciências Econômicas da UFRGS e pesquisador do CNPq.
André Moreira Cunha é professor associado da Faculdade de Ciências Econômicas da UFRGS e pesquisador do CNPq.
América Latina e Caribe em 2013
Por Hasan Tuluy - Valor 19/12
O ano de 2013 marca uma década desde que a América Latina e o Caribe mudaram dramaticamente e para melhor. Após décadas de estagnação, a região deu início a uma rápida transformação econômica e social em 2003 que retirou 73 milhões de pessoas da pobreza e aumentou em mais de 50% a classe média, com a entrada de 50 milhões de pessoas.
Segundo nossos dados, existem hoje mais latino-americanos na classe média do que vivendo na pobreza. Isso não inclui a classe vulnerável, ou a classe média baixa, que tem maior probabilidade de voltar à pobreza.
Os milhões de pessoas que melhoraram suas condições de vida podem atestar que não apenas os ricos se beneficiaram do crescimento econômico. Enquanto a desigualdade aumenta no mundo inteiro, na América Latina ela cai significativamente pela primera vez nas últimas quatro décadas.
No entanto, os latino-americanos são os primeiros a alegar que esses ganhos não são suficientes. De acordo com o Latinobarómetro, muitos acham que a sua situação é pior do que os demais. Isto pode ser uma questão de percepção já que, à medida que mais grupos são beneficiados ao mesmo tempo, nossa precepcão de melhoria relativa diminui.
Muito trabalho ainda precisa ser feito. E o momento é agora. Não se conserta o telhado quando está chovendo.
Definir prioridades se tornou mais difícil em um mundo em constante mudança. A "batalha da produtividade" não pode esperar mais. Se a região aspira alcançar um status de desenvolvimento nas próximas décadas é imprescindível a criação de uma riqueza maior. Para isso, é essencial manter a competitividade baseada na redução dos custos logísticos, na modernização da infraestrutura e na melhoria da qualidade da educação.
Além disso, as tendências globais nas próximas duas décadas apontam para a emergência da China como uma superpotência econômica, o alcance da independência energética pelos EUA, o aumento da demanda por produtos agrícolas para alimentar uma população crescente e uma rápida inovação tecnológica que cria um mundo mais móvel e inteligente.
A manutenção do crescimento da China é uma boa notícia para os exportadores de commodities. Por outro lado, a autossuficiência energética dos EUA, especialmente quanto ao gás natural, significaria uma queda nos preços do petróleo, o que poderia afetar o México, a Venezuela e o Equador, mas que favoreceria as nações dependentes do petróleo na América Central ou os países agropecuários do Sul.
Para manter e expandir o progresso regional - neste contexto incerto - o Estado necessitará aumentar os recursos disponíveis e ser mais eficiente em sua gestão.
Felizmente, uma parte da recente transformação da América Latina se deve aos esforços concertados dos governos para orientar o gasto público na obtenção de resultados, com o benefício adicional do aumento da confiança da população na gestão governamental.
No entanto, tradicionalmente, os latino-americanos ricos, e agora a classe média, não usam os serviços públicos como educação, eletricidade, segurança pública e saúde, porque podem pagar por serviços privados. Neste momento, o Estado atende basicamente aos vulneráveis enquanto os mais abonados não veem vantagem alguma em fazer parte de um contrato social mais amplo. Essa situação precisa mudar.
Hoje, com a exceção do Brasil, a arrecadação tributária média na região é de 17% do PIB, ou seja, metade da média dos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Além disso, menos de 4% da receita do governo é proveniente do imposto de renda de pessoas físicas, comparado a 27% nas nações industrializadas. Para compensar o déficit, muitos países da América Latina e do Caribe adotaram impostos indiretos e regressivos, como o imposto sobre valor agregado (VAT), que taxa mais aqueles que têm menos.
Nos próximos anos, a região terá que enfrentar desafios difíceis, antigos e novos, desde os efeitos da rápida urbanização ou da degradação ambiental, até os choques econômicos globais, o aumento dos preços dos alimentos e a desestabilização provocada pela criminalidade e violência.
Para seguir avançando, é essencial renovar o compromisso de todos, a começar por aqueles que têm maior capacidade para fazer mais, caso contrário as sociedades se manterão fragmentadas, os governos terão recursos limitados para os investimentos necessários e os pobres e vulneráveis terão limitado o seu acesso às oportunidades.
Hasan Tuluy é vice-presidente do Banco Mundial para a América Latina e o Caribe
terça-feira, 18 de dezembro de 2012
Para onde vai o tripé?
Por Antonio Delfim Netto - Valor 18/12
Para desespero dos que acreditam que a economia monetária é uma ciência da qual são únicos portadores, ela está cada vez mais de pernas para o ar. Diante das dificuldades de colocar em marcha normal as suas economias, os bancos centrais em diversas partes do globo começam a prevaricar. Namoram medidas estranhas. Perdem, a pouco e pouco, a vergonha de reconhecer que não sabem bem o que fazer. O regime "puro" de metas inflacionárias que só existe no mundo platônico dos livros textos, mas serve para recomendar políticas universais vai assumindo cada vez mais o que ele sempre foi: uma caricatura!
Nunca houve (nem poderia haver) um banco central que ignorasse o nível de atividade, o nível de emprego e os movimentos dos ativos financeiros, em particular a taxa de câmbio. Todos tiveram implícita ou explicitamente, muitos mandatos. Puderam ignorá-los no tempo da "grande moderação", porque "as coisas caminhavam bem". Sem entender o que se passava, a atribuíam às "virtudes de suas próprias políticas monetárias" e nós acreditávamos...
As últimas semanas revelam uma perspectiva de mudança na administração da política monetária pelo Federal Reserve dos EUA, do Bank of England, e do Banco Central do Japão, estimulada pela conferência monetária em Jackson Hole. Nela o economista Michael Woodford, considerado por alguns o mais sofisticado "economista monetário do mundo" insistiu que os bancos centrais têm de usar sua credibilidade sobre as expectativas inflacionárias quando a taxa de juro nominal está próxima de zero, e flertou com uma política de meta para o PIB nominal. Isso parece estar por trás da nova política do Fed que prometeu comprar "ad libitum", US$ 85 bilhões de papéis (de todas as naturezas) por mês, até que uma de duas coisas aconteça:
1º) a taxa de inflação supere 2,5%; ou
2º) a taxa de desemprego caia a 6,5%, o que tem sido chamado de regra (2,5; 6,5).
Obviamente a nova política causou alguma ansiedade, particularmente nos mercados financeiros. Esses logo concluíram que Bernanke estava abandonando o sacrossanto dogma de inflação à taxa de 2% ao ano. Quem quiser mais informações deve ler a interessante palestra de Charles Evans, "Monetary Policy in Challenging Times", feita em Toronto no dia 27 de novembro. Bernanke afirmou que a mudança não significa que a política monetária foi transferida para o piloto-automático: foi programada para dar aos mercados e ao público em geral a informação de como o Fed está pensando e dar-lhes a oportunidade de ajustarem as suas expectativas.
É importante notar que Bernanke foi muito claro. O Fed, mesmo com as novas políticas, não tem condições de sustentar um razoável crescimento do PIB e do emprego, se o Congresso americano não chegar a um acordo capaz de superar o "abismo fiscal" implícito no vencimento das políticas pontuais tomadas no governo Bush. Isso impõe séria responsabilidade ao Partido Republicano que até agora se diverte com Obama caminhando na beira do tal abismo.
Mas as novidades não terminam por aí. O futuro presidente do Bank of England, o canadense Mark Carney, escolhido numa seleção pública universal, acaba de pregar um susto no primeiro ministro Cameron. Carney vai assumir o lugar em 1º de julho de 2013 em substituição a Mervyn King, quando deixará a presidência do Banco Central do Canadá. Nos seus recentes discursos tem revelado suas preocupações com o regime de metas inflacionárias e dito que é preciso pensar em "políticas monetárias não convencionais", o que está longe do pensamento de King. Ele também parece estar namorando uma política de metas para o PIB nominal. Cameron apressou-se a esclarecer que na Inglaterra qualquer mudança de política monetária (mesmo as de caráter estritamente técnica como seria uma eventual substituição das metas inflacionárias para metas de PIB nominal), deve ser aprovada pelo Parlamento, o que mostra o limite político que restringe a "independência" para administrar a busca dos objetivos politicamente fixados.
O que há de importante na Inglaterra é uma fadiga com a política monetária conservadora e o esforço fiscal aos quais a economia tem respondido muito mal. Alistair Darling, um chanceler do governo trabalhista, explicitou o cansaço: "As metas inflacionárias faziam sentido há 20 anos quando a inflação era nosso principal problema, mas agora todas as nações do mundo estão preocupadas com o crescimento. Não defendo o abandono da política de metas, porque a inflação pode voltar qualquer dia. Mas no futuro previsível nossa prioridade é crescer." E completou para espanto geral: "Creio que Mark Carney explicitou que os bancos centrais de todo o mundo devem ter o crescimento como sua prioridade."
Mas as surpresas não terminam. Vencedor na campanha eleitoral pelo Partido Liberal japonês, o ex-primeiro ministro Shinzo Abe (líder do partido), tem demonstrado o maior desconforto com o conservadorismo do Banco Central (o CBJ) e tem sugerido um sistema de "metas inflacionárias", obviamente para aumentar a taxa de inflação, desvalorizar o iene e recuperar a indústria japonesa que foi transferida para o exterior, particularmente para a China.
O mundo está mudando! Mas até agora ninguém ousou dizer que ele está jogando fora o religioso tripé objeto de adoração dogmática de alguns dos nossos mais brilhantes sacerdotes.
Antonio Delfim Netto é professor emérito da FEA-USP, ex-ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento.
sexta-feira, 14 de dezembro de 2012
Regras mundiais para fluxos de capital
Por Dani Rodrik - Valor 14/12
É oficial. O Fundo Monetário Internacional (FMI) colocou seu selo de aprovação aos controles de capital, legitimando, assim, o emprego de impostos e outras restrições sobre os fluxos financeiros internacionais.
Não muito tempo atrás, o FMI pressionou fortemente para que os países - ricos ou pobres - se abrissem ao financiamento externo. Agora, o Fundo reconheceu que a globalização financeira pode ser desestruturadora - induzindo crises financeiras e movimentos cambiais economicamente adversos.
Então, aqui estamos nós com mais uma guinada na saga sem fim de nossa relação de amor e ódio com os controles de capital.
Sob o clássico padrão ouro que prevaleceu até 1914, a livre mobilidade de capitais era sagrada. Mas a turbulência do período entre guerras convenceu muitos - o mais famoso foi John Maynard Keynes - de que uma conta de capital aberta é incompatível com a estabilidade macroeconômica. O novo consenso refletiu-se no acordo de Bretton Woods, em 1944, que consagrou os controles de capital nos Artigos de Acordo do FMI. Como disse Keynes, à época, "o que era uma heresia, é, agora, endossado como ortodoxia".
No final da década de 1980, porém, as autoridades ficaram novamente encantadas com a mobilidade do capital. Em 1992, a União Europeia tornou ilegais os controles de capital e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) impôs o livre fluxo financeiro a seus novos membros, abrindo o caminho para as crises financeiras no México e na Coreia do Sul em 1994 e 1997, respectivamente. O FMI aprovou a agenda e sua liderança buscou alterar os artigos para dar ao FMI poderes formais sobre as políticas referentes às contas de capital.
Enquanto os países em desenvolvimento eram abalados pelo sistema financeiro mundial, era moda culpar a vítima. O FMI e economistas ocidentais afirmavam que México, Coreia do Sul, Brasil, Turquia e outros países não tinham se adaptado às políticas -regulamentação prudencial, moderação fiscal e controles monetários - necessários para tirar proveito dos fluxos de capital e evitar crises. O problema devia-se a políticas internas e não à globalização financeira, de modo que a solução não estava em controlar os fluxos financeiros internacionais, mas em reformas internas.
Depois que os países avançados tornaram-se vítimas da globalização financeira, em 2008, tornou-se mais difícil sustentar essa linha de argumentação. Ficou claro que o problema estava na instabilidade no próprio sistema financeiro mundial: os surtos de euforia e as bolhas, seguidos por paradas súbitas e reversões agudas que são endêmicas em mercados financeiros não supervisionados e desregulamentados. É, portanto, bem-vindo, o reconhecimento, pelo FMI, de que é apropriado, aos países, tentar isolarem-se desses padrões.
Mas não devemos exagerar a extensão da mudança de posição do FMI. O Fundo ainda considera a livre mobilidade de capitais como um ideal para o qual todos os países acabarão convergindo. Isso requer apenas que os países alcancem o limiar de condições de "desenvolvimento financeiro e institucional" adequado.
O FMI trata os controles de capital como recurso derradeiro, a ser implantado sob um conjunto de circunstâncias bastante estreito - quando outras medidas macro, financeiras ou prudenciais não conseguem conter a onda de entradas de capital, quando o câmbio está sobrevalorizado, quando a economia está superaquecida e quando as reservas internacionais já são adequadas.
Isso reflete otimismo excessivo em duas frentes: primeiro, sobre quão bem a política pode ser ajustada no sentido de focar diretamente as falhas subjacentes que tornam o sistema financeiro mundial inseguro; e, em segundo lugar, sobre em que medida a convergência das regulamentações financeiras nacionais atenuarão a necessidade de administrar os fluxos internacionais.
O primeiro ponto pode ser mais bem apreciado recorrendo a uma analogia com os controles de armas. Armas, assim como os fluxos de capital, têm os seus usos legítimos, mas também podem produzir consequências catastróficas quando usadas acidentalmente ou colocadas em mãos erradas. O apoio relutante do FMI aos controles de capital se assemelha à atitude dos adversários dos controle sobre armamentos: os formuladores de políticas deveriam focar o comportamento prejudicial em vez de restringir incisivamente as liberdades individuais. Dizem os grupos de pressão defensores das armas nos EUA: "Armas não matam pessoas; pessoas matam pessoas". A implicação é que devemos punir os criminosos, em vez de restringir a posse de armas. Analogamente, os formuladores de políticas deveriam assegurar que os participantes do mercado financeiro internalizem totalmente os riscos que assumem, em vez de taxar ou restringir certos tipos de transações.
Mas, como gosta de dizer o economista Avinash Dixit, de Princeton, o mundo não é sempre o melhor dos mundos. Uma abordagem que presume-se podermos identificar e regulamentar diretamente os comportamentos problemáticos não é realista. A maioria das sociedades controla diretamente as armas porque não podemos controlar e disciplinar perfeitamente os comportamentos, e os custos sociais dessa impossibilidade são elevados. Da mesma forma, a cautela sugere a regulamentação direta dos fluxos internacionais. Em ambos os casos, regulamentar ou proibir determinadas transações é uma segunda melhor estratégia num mundo onde o ideal pode ser inatingível.
A segunda complicação é que, em vez de convergir, os modelos nacionais de regulamentação financeira estão se multiplicando, até mesmo nos países que dispõem de instituições bem desenvolvidas. Juntamente com a eficiência da regulamentação financeira, é preciso considerar as dosagens relativas de inovação e de estabilidade financeira. Quanto mais desejamos de uma, menos da outra poderemos ter. Alguns países optarão por maior estabilidade, impondo duros requisitos de capital e de liquidez a seus bancos, ao passo que outros poderão favorecer maior inovação e implementar uma abordagem regulamentar mais branda.
Nesse aspecto, a livre mobilidade de capitais cria uma grave dificuldade. Tomadores de empréstimos e credores podem recorrer a fluxos financeiros internacionais para evadir controles internos e minar a integridade de normas regulamentares domésticas. Para evitar esse tipo de exploração de diferenças regulatórias", as entidades regulamentadoras nacionais podem ser obrigadas a tomar medidas contra as transações financeiras originadas em jurisdições com regras mais desregulamentadas.
Um mundo em que diferentes Estados regulamentam o sistema financeiro de maneiras distintas exige regras de trânsito para gerenciar as interseções de diferentes políticas nacionais. A premissa de que todos os países convergirão para o ideal da livre mobilidade do capital nos desvia da árdua tarefa da formulação dessas regras. (Tradução de Sergio Blum)
Dani Rodrik, professor de Economia Política Internacional na Universidade de Harvard, é autor de "The Globalization Paradox: Democracy and the Future of the World Economy (O paradoxo da globalização: a democracia e o futuro da economia mundial).. Copyright: Project Syndicate, 2012.
quinta-feira, 13 de dezembro de 2012
Um olhar analítico sobre a política monetária brasileira
Na atualidade, é crescente a teoria de que os bancos centrais procuram conduzir a política monetária estabelecendo uma comunicação efetiva com os participantes do mercado financeiro, no intuito de reduzir a incerteza de sua atuação sobre as taxas de juros de curto prazo e fornecer informações para que o mercado avalie o caminho esperado das taxas de juros de longo prazo.
Com isso, as autoridades monetárias ao redor do mundo utilizam uma taxa de juros de curto prazo como instrumento de política monetária, com a esperança de que, ao afetar essa taxa, estarão alterando a taxa de juros de longo prazo da economia, uma vez que essa taxa é a que afeta a demanda agregada.
Por outro lado, os mercados financeiros internacionais desenvolveram alguns instrumentos de renda fixa, dentre os quais citamos os vários títulos para financiar a dívida pública, títulos comerciais lastreados em hipotecas, diversas modalidades de debêntures, dívidas subordinadas, instrumentos nos mercados futuros e de opções atrelados às taxas de juros, operações de swaps de crédito, taxas de juros, dentre outros.
Além da diversificação dos instrumentos, o mercado de renda fixa tem apresentado crescimento expressivo, particularmente no Brasil, o que traz novas análises do ponto de vista de investimento e leva a novas necessidades de entender os movimentos desses papéis.
Por outro lado, uma idiossincrasia financeira brasileira é a presença do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), cujas operações também exercem influência na cessão de créditos de médio e longo prazo e com taxas de juros para médias e grandes empresas que, em certa medida, estão abaixo do custo médio do mercado financeiro.
Nesse ambiente econômico, o Banco Central procura atuar no sentido de definir a condução da política monetária ao interferir na taxa de curto prazo (taxa Selic) para influenciar a taxa de longo prazo do mercado financeiro, mas o BNDES atua com taxas subsidiadas no longo prazo e afeta a evolução da curva de juros do mercado bancário brasileiro, haja visto que sua estratégia de atuação tem outros objetivos.
Como ingrediente adicional, a crise econômica denominada "subprime", iniciada em 2007 nos Estados Unidos, cujos reflexos na economia brasileira ocorreram a partir de 2008, ressaltou os desafios de entender os movimentos transitórios como forma de melhorar a condução da política monetária. Nota-se que certos aspectos chamam a atenção com respeito ao comportamento das taxas de juros de longo prazo dos títulos de dez anos do governo americano (taxa à vista que o mercado espera vigorar no futuro, acrescida do prêmio do termo). Nos EUA, a taxa futura de um ano para os próximos três anos, a partir de 2004, subiu 1,5%, enquanto a taxa de um ano para os próximos nove anos caiu 1,5% e a taxa para os próximos dez anos ficou inalterada.
Esses efeitos da economia americana reforçam a conclusão de que, nem sempre, uma atuação na taxa de curto prazo pode gerar o efeito com a mesma magnitude sobre toda a estrutura a termo de taxas de juros, realçando a necessidade de identificar que variáveis macroeconômicas são responsáveis pelos movimentos na estrutura a termo de juros.
Uma das questões a serem respondidas nesta tese é como as mudanças nas expectativas da condução da política monetária e fiscal podem afetar o spread do termo do mercado financeiro brasileiro, isto é, como modificam as taxas de curto e de longo prazo do mercado interbancário. Assim, será possível avaliar se esses movimentos estão em desacordo com a atuação da política monetária de curto prazo.
Outra questão relevante a ser investigada é identificar como o spread do vencimento da curva de juros brasileira afeta os parâmetros estruturais de nossa economia, em particular no que tange ao equilíbrio com convergência para o estado estacionário.
A tese pretende relacionar os conhecimentos microeconômicos do mercado financeiro contido na precificação da estrutura a termo das taxas de juros com a teoria dos novos keynesianos, que fornece valiosas conclusões sobre a condução da política econômica de forma geral. Com isso, a pesquisa fornece evidências inéditas capazes de esclarecer e evidenciar certos movimentos que podem facilitar tanto a condução da política monetária pelo Banco Central do Brasil como a percepção de risco e da trajetória de juros pelas instituições financeiras brasileiras.
Inicialmente, a tese traz uma revisão da literatura sobre estrutura a termo das taxas de juros que será útil para esclarecer a precificação dos títulos e a maneira pela qual as instituições financeiras brasileiras interpretam as variações no preço dos juros.
A partir dessa revisão, destacam-se dois modelos que seguem a hipótese de ausência de oportunidades de arbitragem livres de risco, que são: (a) o modelo de Diebold, Rudebusch e Aruoba (2006), que será usado para a extração de fatores latentes da curva de juros a partir de interações dinâmicas de variáveis da macroeconomia e (b) o modelo de Cox, Ingersoll e Ross (1985), que será utilizado para estimar o equilíbrio geral.
O impacto numa única direção
Em seguida, o modelo de Diebold, Rudebusch e Aruoba (2006) serve para investigar a hipótese de que o prêmio dos títulos de longo prazo tem comportamento anticíclico (investidores não desejam assumir riscos em momentos incertos) enquanto os rendimentos dos títulos de curto prazo são pró-cíclicos (a política monetária reduz os rendimentos de curto prazo durante a recessão para estimular a atividade econômica).
Nesse ponto, a tese procura explicar os movimentos da inclinação da estrutura a termo de taxas de juros brasileiras como função de variáveis macroeconômicas observáveis, adotando uma análise de equilíbrio parcial e o estimador de regressão de transição suave (STR), avaliando quais as principais variáveis macroeconômicas capazes de fornecer explicação para as variações no spread do termo (diferença entre a taxa de longo prazo e a de curto prazo) e identificando a variável capaz de alterar a direção da condução monetária.
As conclusões do modelo de Diebold, Rudebusch e Aruoba (2006) no Brasil indicam que a política monetária tem efeito significante sobre o diferencial entre as taxas de juros de curto e longo prazo. Em particular, verificou-se que o coeficiente do IPCA é positivo na parte linear da estimação, mostrando que o efeito da taxa de curto prazo é superior ao efeito na taxa de longo prazo. Com isso, ao controlar a inflação via política monetária, o Banco Central estará controlando a expectativa do mercado financeiro quanto às taxas de juros de curto prazo.
O resultado primário é relevante nos momentos de instabilidade econômica (parte não linear da estimação), em que o efeito negativo dos coeficientes significantes é indicativo de que o superávit primário é importante para gerar a credibilidade de que o montante de recursos obtidos pelo governo será suficiente para controlar a dívida líquida e, com isso, menor será a percepção de risco do mercado financeiro, o qual é evidenciado pela redução do spread do termo das taxas de juros.
Um dos resultados mais relevantes foi encontrar a variável macroeconômica capaz de explicar as alterações na estrutura a termo de taxas de juros da economia brasileira (inclinação e curvatura). Em particular, destaca-se sua relevância para explicar os momentos de crise. Na economia brasileira e na amostra estudada, essa variável é o Risco Brasil medido pelo EMBI+Brasil.
Ao verificar a relevância das variáveis macroeconômicas influenciando o spread dos juros, percebeu-se, também, a necessidade de avaliar o impacto das variáveis macroeconômicas num modelo de equilíbrio geral, de forma que a causalidade ocorra nas duas direções (macroeconomia Ö curva de juros), para possibilitar análises das trajetórias de equilíbrio da economia e de seus efeitos sobre a estrutura a termo de taxas de juros.
Casualidade nas duas direções
Com o intuito de avaliar o impacto das variáveis macroeconômicas sobre a convergência das taxas do mercado financeiro para o estado estacionário, substituímos o estimador não linear pelo estimador linear do método dos momentos generalizados e passamos para uma análise de equilíbrio geral dinâmico estocástico, deduzindo o modelo Cox, Ingersoll e Ross (CIR) dentro do modelo novo keynesiano padrão.
Nessa análise, estima-se o modelo de equilíbrio geral dinâmico estocástico (Dynamic Stochastic General Equilibrium - DSGE), pelo estimador do método dos momentos generalizados, para avaliar o impacto das variáveis macroeconômicas sobre o equilíbrio estacionário das taxas praticadas no mercado financeiro.
Essa análise segue o modelo estrutural de Bekaert, Cho e Moreno (2010), o qual é composto pela curva IS, pela curva de Phillips, por uma Regra de Política Monetária, pelo Produto Natural Endógeno e pela Meta de Inflação.
Dentre os parâmetros estruturais estimados na curva IS, o impacto do produto futuro foi menor que o impacto do produto do período anterior, o que mostra a relevância do produto passado na formação do produto corrente.
Na curva de Phillips, o componente "forward-looking" foi inferior ao componente "backward-looking", resultado oposto ao verificado por Bekaert, Cho e Moreno nos EUA. Isso ocorre, provavelmente, porque a economia brasileira ainda mantém certa memória inflacionária decorrente do longo período de indexação vivido nos anos anteriores ao Plano Real.
Na estimação da regra de política monetária, a diferença entre a inflação esperada e a meta de inflação medida pelo parâmetro foi 20% superior ao índice verificado na economia americana.
Após a estimação dos parâmetros estruturais, a análise de decomposição da variância mostra a contribuição de cada choque macroeconômico na mudança das variáveis, em diferentes horizontes temporais.
Nessa análise, percebe-se que a variância da inflação é explicada pelo choque da curva de Phillips (AS) nos horizontes de curto prazo. Entretanto, nos demais horizontes, a inflação é determinada pelo choque da meta de inflação.
O produto natural somente não é explicado, no horizonte de curto prazo, pelo choque da curva de Phillips e pelo choque de produtividade. Nos demais horizontes, o impacto do choque da curva IS reduz sua importância e os choques da curva de Phillips e de produtividade aumentam.
A dinâmica da taxa Selic é dominada pelo choque de política monetária para horizonte curto e nos prazos mais longos pelo choque da meta de inflação.
Após a decomposição da variância, é usual avaliar como se propagam e quais são os efeitos dos choques. Para tanto, utilizam-se as funções de impulso e resposta. A ideia da função impulso/ resposta é mostrar o que ocorre com a variável de interesse em resposta a um choque exógeno da economia, este condicionado à premissa de que a economia está em equilíbrio antes do choque.
A primeira dessas análises foi avaliar a resposta dos fatores nível, inclinação e curvatura diante do impulso da curva IS, da curva de Phillips, da taxa de juros de política monetária, do choque de produtividade e do choque na meta de inflação.
O choque na curva de Phillips, inicialmente, faz aumentar o nível das taxas de juros. Mas, depois, possivelmente relacionada a uma forte resposta do Banco Central para conter a inflação, ocorre uma queda das taxas de juros.
O choque na meta de inflação tem efeito positivo permanente sobre o nível da curva de juros. A inclinação e a curvatura inicialmente aumentam, depois caem abaixo do estado estacionário e oscilam até sua convergência.
Para verificar o impulso da curva IS, da curva de Phillips, da taxa de juros de política monetária, do choque de produtividade e do choque na meta de inflação, também foi analisada a resposta nas taxas de juros de um dia, um ano, cinco anos e dez anos de um impulso dado pelos cinco choques macroeconômicos.
O choque da curva de Phillips faz aumentar de imediato as taxas de juros, que vão oscilando em torno do estado estacionário, até convergir após 40 trimestres. Outro aspecto relevante é o impacto maior nas taxas de curto prazo.
O choque da curva IS tem como resposta um aumento nas taxas de juros em todos os termos, com efeito semelhante na taxa para um dia e um ano. Nos termos de cinco anos e dez anos, o efeito desse aumento vai reduzindo.
O choque de política monetária mostra um aumento relevante na taxa de juros de um dia, que vai oscilando até convergir no estado estacionário. A resposta da taxa de um ano é um suave aumento e posterior oscilação até a convergência. Nas taxas para cinco e dez anos o efeito é uma redução nas taxas com impacto maior de queda na taxa a 20 trimestres.
Os choques nas metas de inflação aumentam todos os termos de juros no horizonte de curto prazo, mas os efeitos são maiores sobre os prazos mais curtos (um dia e um ano), comparativamente ao longo prazo (cinco e dez anos).
Conclusão
Este trabalho avalia a relação entre o mercado financeiro e o equilíbrio geral da economia brasileira, quantificando o efeito das taxas de juros bancárias sobre o PIB, a variação do IPCA e o regime de metas de inflação.
Na análise de equilíbrio parcial, demonstra-se a importância do superávit primário para a credibilidade do governo em momentos de instabilidade e identifica o EMBI+Brasil como variável que explica a mudança na inclinação da estrutura a termo das taxas de juros.
Na análise de equilíbrio geral, as conclusões indicam que o choque na meta de inflação no Brasil domina a variação nos fatores "nível e inclinação", enquanto o choque de política monetária domina a variação do fator "curvatura" no horizonte de curto prazo.
Por outro lado, o choque na meta de inflação a ser perseguida pelo Banco Central leva ao aumento de todos os termos dos juros, com efeito maior sobre os termos de curto prazo, se comparados aos de longo prazo.
De forma geral, percebe-se que a política monetária tem um efeito na taxa de curto prazo superior ao efeito no longo prazo. Assim, ao controlar a inflação via política monetária, o Banco Central possivelmente estará controlando a expectativa do mercado financeiro quanto à trajetória das taxas de juros brasileiras.
O autor é gerente de validação da gestão do capital (Icaap) e dos modelos AMA de risco operacional do Banco do Brasil S.A. As opiniões expressas ou possíveis erros e omissões são de responsabilidade do autor e não da instituição. E-mail: davila@bb.com.br
Fed surpreende com nova linguagem
Valor 13/12
A decisão do Fomc, o Comitê de política monetária do banco central dos Estados Unidos, foi uma surpresa. Não pela manutenção dos juros ou pelo anúncio de compras de treasuries de longo prazo em substituição ao volume negociado na operação "Twist", mas pela mudança na política de comunicação do Fed. É algo inédito.
Em substituição à meta temporal até então vigente (meados de 2015), o banco central americano anunciou, ontem, que manterá a taxa de juros em níveis "excepcionalmente" baixos enquanto a taxa de desemprego permanecer acima de 6,5% e se a inflação projetada para os próximos um ou dois anos não exceder 2,5%. Além disso, as expectativas de longo prazo devem se manter ancoradas.
A maior parte das instituições estrangeiras consultadas pelo Valor antes da reunião esperava que essa mudança ocorresse apenas no encontro de março, dado que a ata da reunião de outubro indicou que muitos problemas práticos relacionados a essa medida ainda tinham de ser debatidos pelos membros do Fed.
Então, por que agora?
O presidente do Fed, Ben Bernanke, respondeu a essa pergunta na conferência de imprensa dizendo que a mudança na linguagem já era um consenso entre os membros do comitê que julgam mais informativo e transparente atrelar as taxas de juros ao cenário econômico do que ao calendário. O dissenso, portanto, era quanto aos patamares das variáveis desemprego e inflação, o que foi, pelo visto, resolvido muito mais rapidamente do que a totalidade dos analistas previa.
Segundo Bernanke, atingir uma das "metas" não é sinônimo de mudança na política monetária, o que, nesses tempos, significa elevar os juros iniciando a estratégia de saída. Mas as metas devem ser interpretadas como "orientações" e não como "gatilhos", ou seja, atingi-las não significa uma mudança automática nos juros.
Boa parte do mercado tinha, até então, essa crença. Essa pontuação muda muito a percepção de como do Fed vai agir. Bernanke esclareceu que, quando uma das metas for atingida, o Fomc avaliará um conjunto de indicadores para tomar uma decisão.
De fato, no comunicado o Fed deixa margens de manobra ao afirmar que olha além da taxa de desemprego e da inflação. No caso do mercado de trabalho, serão observados também a variação do "payroll" (postos de trabalho), a taxa de participação (razão entre a população economicamente ativa e a população total) e as horas trabalhadas, segundo Bernanke.
Isso, claro, é necessário porque não fica claro como o Fed agiria em uma situação em que houvesse uma alta forte da inflação - por um choque de commodities, por exemplo -, sendo o ambiente de elevada taxa de desemprego. Do modo como foi pensada a estratégia, criam-se espaços para uma justificativa plausível e livra-se o banco central de amarras.
O atingimento dos parâmetros também não se relaciona com o fim dos afrouxamentos quantitativos. Bernanke foi claro ao afirmar que o QE e a mudança de linguagem têm objetivos diferentes. O primeiro visa estimular a economia momentaneamente e o segundo, elevar a transparência do Fed.
O patamar de 6,5% para a taxa de desemprego não significa que esse nível seja o almejado pelo Fed, não é a taxa natural ou o pleno emprego. O Fed tem como objetivo de longo prazo um intervalo de 5,2% a 6,0% para o desemprego, com a inflação em 2%, que é meta. Em relação às projeções de curto prazo, o banco central reduziu a expectativa central (média do intervalo) para o desemprego em 2013 de 7,75% para 7,55%. A inflação também caiu de 1,80% para 1,65%.
Se havia o tal consenso de opiniões, foram poucos os membros do Fed que citaram explicitamente os parâmetros "ideais". Um deles foi o presidente do Fed de Chicago Charles Evans, que defendeu em novembro que o Fed deveria manter a política monetária extremamente acomodatícia até que a taxa de desemprego caísse abaixo de 6,5%, contanto que a inflação não ultrapassasse 2,5%.
O curioso é que ele, após a reunião do Fomc de setembro, havia feito o primeiro discurso nessa linha defendendo patamares maiores das variáveis, 7% para o desemprego e 3% para a inflação. Causou certo espanto números tão elevados e, no caso da inflação, muito acima da meta do Fed. Sua mudança de opinião quanto ao nível parece ter sido influenciada pela decisão que o Fomc viria a tomar ontem.
No que diz respeito ao tamanho da injeção de liquidez, pode-se arguir que o montante cresceu, já que na operação "Twist" as compras eram esterilizadas. Não é o caso das compras dos treasuries, que aumentam o balanço do Fed. O volume mensal será de US$ 85 bilhões, sendo US$ 40 bilhões em títulos lastreados em hipotecas (MBS, na sigla em inglês) e US$ 45 bilhões em títulos de longo prazo. As aquisições permanecem no formato "open-ended", isto é, sua continuidade está atrelada à performance da economia.
Apesar de ter havido, de fato, uma substituição da orientação da política (forward guidance), Bernanke ressaltou que o horizonte de 2015 "não morreu", pois é condizente com o prazo para que os patamares das variáveis sejam alcançados, como mostraram as novas projeções. Portanto, deve ser por aí que a economia estará aquecida o suficiente para o Fed começar a subir os juros. A política não convencional, que vem sendo feita à mancheia nos últimos quatro anos, pode acabar antes.
quarta-feira, 12 de dezembro de 2012
Dólar fecha em leve alta após discurso de Tombini
Valor 12/12
A leve alta do dólar ontem, em dia recheado de declarações de integrantes do Banco Central e que fechou com o anúncio de novo leilão conjugado de venda e compra da moeda, indica que ao BC está sendo bem sucedido em seus esforços para controlar a volatilidade do câmbio.
Para o mercado, isso reforça também a crença que o patamar de R$ 2,08 seria o novo ponto de equilíbrio para o dólar.
"Nas vezes recentes em que o dólar caiu abaixo de R$ 2,08, o mercado virou. Esse parece ser o ponto de equilíbrio atual do câmbio", disse Reginaldo Galhardo, gerente de câmbio da Treviso Corretora. "Sempre que o mercado rompe esse nível, ele fica um pouco mais comprador."
Em apresentação na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado ontem, o presidente do BC, Alexandre Tombini, disse que o câmbio flutuante no Brasil não pode ser visto como "incentivo para apostas que exacerbam a sua volatilidade". Mais tarde, em evento em São Paulo, o diretor de política econômica da autarquia, Carlos Hamilton Araújo, disse que as recentes intervenções da autarquia no câmbio foram eventuais e tiveram "excelentes resultados". Para ele, o câmbio deverá ser menos volátil do que já foi no passado.
"Eles [o BC] estão bem preocupados em segurar o câmbio, sabendo do risco que uma desvalorização maior do real pode trazer a um quadro já delicado de inflação", disse Newton Rosa, economista-chefe da SulAmérica Investimentos. "O mercado está procurando um ponto de equilíbrio, um ponto em que a moeda fique por um tempo mais longo. Acho que isso está mais próximo de R$ 2,08 que de R$ 2,05."
No mercado, a eficácia dos esforços do BC se mostram na pouca disposição dos agentes de forçar altas e baixas mais expressivas. Entre mínima e máxima ontem, a variação foi de menos de um centavo e a cotação de fechamento, apenas R$ 0,001 acima daquela do dia anterior.
As declarações do presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, e do diretor política econômica da instituição, Carlos Hamilton Araújo também levaram a uma revisão nas apostas em novo corte de juros ano que vem. As taxas negociadas na BM&F subiram pela terceira sessão seguida, depois que os integrantes do Copom destacaram o foco na inflação e reafirmaram que a recuperação econômica será mais vigorosa ano que vem.
O contrato com vencimento em janeiro de 2014 foi a 7,09% de 7,05% na véspera após ajustes. O volume de negócios refletiu a rodada de ajustes, uma vez que o giro nesta terça-feira superou em cerca de 30% a movimentação de ontem.
Enquanto Tombini optou por falar que a inflação no curto prazo "inspira atenção", Hamilton disse que "a política monetária continuará sendo conduzida com foco exclusivo na estabilidade de preços".
O economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, avalia que os cenários doméstico e externo permitem projetar inflação oscilando na casa de 5,5% até 2014, o que permite a manutenção da taxa básica de juros nos atuais patamares. "[A inflação] não vai abaixo de 5% nem acima de 6%. Em qualquer modelo, um corte de mais de 5 pontos básicos na taxa básica de juros deveria fazer o investimento explodir, e não aconteceu", afirmou.
O Pibinho desacelerou o investimento?
Por Francisco Lafaiete Lopes - Valor 12/12
Com a publicação do Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre, consolidou-se a sensação de que o país vive numa espécie de "armadilha do pibinho". O modelo de crescimento está esgotado e o investimento não deslancha, a despeito de todos os incentivos monetários e fiscais colocados em ação pelo governo. Um observador arguto como Delfim Netto concluiu que a verdadeira tragédia é que o investimento permanece em queda nos últimos dois anos. Não faltam agora especialistas e curiosos para explicar que o problema é o excesso de intervencionismo do governo, que está aumentando a incerteza e inibindo os espíritos animais do empresariado.
Economistas vivem num mundo de modelos teóricos que muitas vezes têm relação tênue com a realidade. Em geral, o contato dos modelos com o mundo real é intermediado por bases de dados produzidas por diversas instituições públicas ou privadas, mas nem sempre há a preocupação em entender exatamente o que está sendo medido. Pouco adianta ter boa metodologia se informações brutas adequadas não estão disponíveis.
No Brasil, um problema particularmente grave é a quase total inexistência de informações sobre a evolução dos estoques. O IBGE simplesmente não calcula a componente de variação de estoques nos números do PIB trimestral. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) publica uma sondagem sobre estoques industriais, mas somente a partir de 2011, tendo infelizmente descontinuado suas séries mais antigas.
Apesar da carência de dados, nosso acompanhamento da conjuntura nos convenceu de que a economia brasileira passou por oscilações inusitadamente intensas nos estoques industriais nos últimos anos. Primeiro, ao longo de 2008, consolidou-se a percepção de que a crise americana seria realmente séria e que poderia sim nos contaminar, inclusive com restrições de crédito e problemas de liquidez. A partir do final do ano, empresas e cadeias de distribuição produziram forte queda na produção de modo a reduzir ao máximo os níveis de estoque. Esse movimento começou a ser revertido em meados de 2009 e, como consequência, a reposição de estoques produziu rápido crescimento da indústria no primeiro semestre de 2010. Por exemplo, nos quatro trimestres terminados em março de 2010, o crescimento da indústria de transformação foi de 18%. No junho seguinte foi de 14% e essas taxas excepcionais constituem a principal explicação para o Pibão de 2010, com crescimento médio anual de 10% para a indústria de transformação e de 7,5% para o PIB total.
O problema é que a partir de 2010 os gestores e planejadores das empresas, assim como o distinto público dentro e fora do país, resolveram acreditar que o Brasil se transformara em tigre asiático. A crença foi estimulada pela forte expansão do crédito. O resultado foi que o aumento planejado na produção se mostrou excessivo, particularmente tendo em vista que em meados de 2011 já estava claro que o ritmo de crescimento sustentável seria muito menor. Isto iniciou uma nova fase de correção para baixo nos estoques, que perdura até agora. Como a correção agora está sendo mais gradual, também é mais alongada no tempo.
Alguma evidência para essa interpretação da evolução recente da economia pode ser obtida se compararmos os dados de produção industrial do IBGE com os dados de faturamento real da CNI. Esses dados mostram que nos últimos sete trimestres desde o início de 2011 o faturamento real da indústria de transformação aumentou 8,3%, enquanto que a produção caiu 4,9%. Essa diferença de 13 pontos percentuais sugere uma redução continuada nos estoques: a indústria contraiu a produção, mas seguiu aumentando as vendas, o que só é possível quando o volume de estoques está caindo.
Esses movimentos fortes e inusitados nos estoques, que em última análise são ainda reflexo da crise de 2008, podem explicar boa parte da aparente armadilha do pibinho. Explicam também porque os dados de produção mostram dois anos de queda enquanto as vendas, em todos os níveis de comercialização, continuam evoluindo muito bem, obrigado. Por exemplo, na pesquisa mensal do comércio do IBGE, a taxa de variação em 12 meses do volume de vendas no varejo foi de 6% em dezembro de 2011 e de 9% em setembro de 2012.
Na realidade, os números de faturamento real da CNI mostram outro resultado muito importante. Enquanto nos sete trimestres a partir do início de 2011 a produção medida pelo IBGE para a indústria de máquinas e equipamentos caiu 8%, o faturamento real dessa mesma indústria, medido pelo CNI, aumentou 25%. Isto significa um crescimento médio anual do faturamento da ordem de 13%, contra uma queda média anual da produção de menos 4%. Aqui também tudo indica que há um processo de ajustamento para baixo nos estoques. Números semelhantes resultam quando usamos dados da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) ou da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg).
É verdade que essa diferença poderia resultar de a indústria estar vendendo e faturando máquinas e equipamentos importados, sem impacto, portanto, sobre a produção nacional. Isto, porém, não combina com o dado da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex) que mostra que o quantum da importação de bens de capital caiu cerca 3% no período. Também não vale o argumento de que a diferença resultou de algum movimento no preço médio das máquinas, já que no período esse preço caiu tanto em relação ao Índice de Preços por Atacado (IPA) da indústria de transformação como em relação ao Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).
O que não se pode ignorar é que nos últimos dois anos as vendas reais de máquinas e equipamentos cresceram fortemente, acima de 10% ao ano. Simplesmente não há como conciliar isso com a noção de que o espírito animal dos empresários está deprimido e que a economia perdeu sua capacidade de investir. Afinal se os vendedores estão entregando mais máquinas, os compradores só podem estar comprando essas máquinas para aumentar sua capacidade de produção, isto é, para investimento. A falta de um entendimento correto dessa fase conjuntural do pibinho, que é em grande parte explicada por violentas oscilações nos estoques industriais, parece estar levando a uma avaliação totalmente equivocada do que se passa na economia brasileira.
Francisco Lafaiete Lopes é Ph.D. em economia pela Universidade de Harvard e ex-presidente do Banco Central.
terça-feira, 11 de dezembro de 2012
BC vê dólar acima de patamar ideal
Valor 11/12
O dólar encontra-se um pouco mais valorizado do que deveria estar em relação ao real, avaliou o diretor de política monetária do Banco Central (BC), Aldo Mendes, segundo o qual, o tripé de política econômica baseado em câmbio flutuante, meta de inflação e superávit primário continua em vigor. Ontem, a moeda americana caiu 0,67%, encerrando o dia cotada a R$ 2,077.
"Acho que ainda tem um pouco de gordura na nossa taxa com o modelo que utilizamos [para calcular o patamar adequado do dólar ante o real]. Talvez tenha um pouco de gordura, talvez esteja um pouco acima do que o nosso modelo indicaria", afirmou ele, sem citar a taxa cambial ideal para o BC, ontem, durante o evento "Reavaliação do Risco Brasil 2012", organizado pelo Valor no Rio.
Mendes negou que o tripé da política econômica brasileira não esteja em vigor. Questionado pelo ex-presidente do BC Carlos Langoni, Mendes disse que nada mudou. "Não vejo motivo para falar em fim do tripé de política econômica. Não mudou nada. O regime de metas [de inflação] continua como sempre esteve, a ata do Copom [Comitê de Política Monetária] continua válida, todo o trabalho de perseguir o centro da meta vai ser levado adiante", declarou o diretor do BC, no seminário promovido em parceria com o Comitê de Cooperação Empresarial da Fundação Getúlio Vargas, Standard & Poor's, Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan) e Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (Ibef-RJ).
O diretor do BC reiterou que a autoridade monetária nunca teve meta para o câmbio, mas irá garantir que não falte dólar. "O mercado flutua, o câmbio tem flutuado. É evidente que fim de ano é sempre de baixa liquidez, e o BC vai fornecer a liquidez que o mercado precisar. Não faltará dólar", enfatizou Mendes, citando os US$ 380 bilhões de reservas internacionais.
Mendes também defendeu as medidas adotadas pelo governo na semana passada para melhorar o fluxo de dólares para o país: a redução de dois para um ano do prazo dos créditos externos sujeitos à cobrança de 6% de IOF; e a ampliação de um para cinco anos do prazo para antecipação de receitas de exportação. "Certamente, a medida vai facilitar o financiamento de empresas exportadoras e não exportadoras. O objetivo foi baratear fontes de capital de financiamento de médio e longo prazos", disse ele.
Segundo Mendes, a taxa básica de juros (Selic) atual, de 7,25% ao ano, será suficiente para fazer convergir a inflação à meta de forma não linear. O centro da meta para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) é de 4,5% ao ano, podendo variar dois pontos percentuais para cima ou para baixo. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), até novembro, o IPCA sobe 5,01% no ano.
Na avaliação do diretor do BC, a atividade econômica brasileira deverá se intensificar neste trimestre, ao passo que o cenário externo continuará "complexo". "O cenário internacional continua complexo e com perspectiva de baixo crescimento. Mas o ritmo da atividade econômica no Brasil deve se intensificar no último trimestre de 2012 e no próximo ano."
Inadimplência cresce 0,58% em novembro
Valor 11/12
A expansão do crédito, a queda da taxa de desemprego e o aumento do nível de renda ao longo deste ano, conjugados com a falta de educação financeira, elevaram tanto a inadimplência quanto as vendas em novembro, na comparação com o mesmo mês de 2011. Essa é a avaliação da economista do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) Brasil, Ana Paula Bastos.
Segundo levantamento divulgado pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) ontem, a inadimplência aumentou 0,58% na comparação de novembro deste ano o mesmo mês do ano passado. Ana Paula destacou, porém, que o crescimento é pequeno se comparado com a alta de 5,63% nas vendas no mesmo período.
A projeção do SPC é de que a inadimplência caia em dezembro e volte a subir no início de 2013, com um pico de 12%. O movimento é sazonal, explicou Ana Paula, já que no começo do ano aparecem gastos como material escolar e tributos recolhidos entre janeiro e março.
A economista do SPC Brasil também afirmou que "a economia brasileira vem se sustentando pelo aumento do consumo familiar". De acordo com Ana Paula, o resultado negativo da produção industrial "contaminou" o resultado total, e o setor de serviços absorveu a mão de obra excedente.
Para Ana Paula, a recuperação só virá na conjugação entre as medidas de curto e longo prazo. "Os empresários estão receosos em investir", disse. O aumento da inadimplência na comparação entre novembro de 2011 e o mesmo mês de 2012 se deve, de acordo com a CNDL, ao "cenário econômico favorável ao consumo aliado à falta de planejamento das famílias".
O criticado ativismo
Por Antonio Delfim Netto - Valor 11/12
Os mercados financeiros são mesmo internacionais. Alguns estudos empíricos bem conduzidos mostraram que o aumento da liquidez nos EUA teve um efeito não desprezível sobre as moedas dos emergentes e, mais, que a introdução pelo Brasil de mecanismos que dificultam o livre movimento de capitais transferiu rapidamente recursos para outros países como o México, por exemplo.
Demorou muito pouco para os nossos ativos, sofisticados e ousados fundos nacionais, começarem a se "internacionalizar" procurando alternativas para a redução de rendimento que está ocorrendo no Brasil com a queda da cotação na Bovespa, combinada com a depreciação cambial e a queda da taxa de juros real. Para entender esse movimento basta atentar para o fato que de dezembro de 2011 a novembro de 2012, a bolsa mexicana aumentou 15% em moeda local e 23% em dólares; a colombiana 14% e 22%; a chilena 1% e 9% e a peruana 4% e 9%, respectivamente, enquanto a Bovespa aumentou 1,6% em reais e caiu 10% em dólares. Isso explica muito do "por que" do Brasil ter deixado de ser o queridinho que foi do mercado financeiro quando, graças à soma do crescimento da Bovespa e à valorização do câmbio, ela rendia mais do que 30% ao ano em dólares!
O investidor no setor de bens e serviços não financeiros dá menos valor a esse fato porque olha o mercado com "olhos mais longos" e vê um país com 200 milhões de habitantes, com uma renda per capita de US$ 12 mil, que no período de 2006/2011 cresceu à taxa de 3,2%, com uma inflação média de 5,0% (ante uma meta de 4,5%) e foi recentemente classificado pela consultoria internacional Boston Consulting Group (BGC) entre 150 países, como o que melhor utilizou o crescimento econômico dos últimos seis anos para elevar o padrão de vida e o bem-estar da população. O estudo sugere que tais ganhos são equivalentes aos que se verificariam com uma expansão anual de 13%, o que explica a inserção no mercado de uma ampla classe média, que vai diversificar o seu consumo e exigir cada vez mais qualidade dos bens e serviços no futuro.
Mas por que, então, empresários nacionais e estrangeiros têm relutado em aumentar os investimentos? O indicador é dramático: ao longo dos últimos cinco trimestres eles têm se reduzido com relação ao PIB, andando às voltas de 18% no terceiro trimestre de 2012, ante 22% no segundo de 2008, pouco antes da crise do Lehman Brothers. A explicação menos plausível é a de que houve no governo Dilma uma deterioração genérica do "ambiente dos negócios". O Brasil ocupa a 130ª posição no ranking de 185 países do "Doing Bussiness de 2013" do Banco Mundial. O problema é que no período 2006/2011, já frequentávamos o 8º decil daquela classificação. Uma explicação mais convincente pode ser obtida analisando o ranking completo do Banco Mundial, que se vê no quadro abaixo.
É preciso reconhecer que o tão criticado "ativismo" do governo Dilma atacou com algum sucesso o item 2 (regularizar e agilizar as autorizações para iniciar investimento) e o item 5 (facilidade de crédito). Tenta atacar o problema de redução do custo da energia (o acesso à eletricidade é o nosso melhor rank) ligado ao item 3 e o custo dos portos, ligado ao item 8. As medidas do governo estão na direção correta, mas têm enfrentado enormes problemas de execução, tanto pela dúvida sobre a qualidade e competência da intervenção regulatória, quanto da compreensível resistência dos setores atingidos.
Não houve quebra de contrato no caso da energia ou de outros setores. Não é correto calcular-se a indenização das usinas pelo seu valor residual contábil como pretendem alguns Estados porque ele incorpora todos os tropeços (que foram muitos!) na construção de cada uma delas. Por outro lado, não foi correto ter desrespeitado as relações impostas pela federação ignorando, sistematicamente, os pedidos de renovação dos Estados que aconteceram no passado.
A excelente Lei dos Portos de 1993 só não funcionou melhor porque o Estado não cumpriu o seu papel. As alterações propostas, apesar de avanços competitivos, avaliam muito mal o possível desenvolvimento futuro do setor e, talvez, será mais um motivo de judicialização de um problema administrativo. É ilusão pensar que nesses dois casos não haverá postergação dos investimentos.
Espera-se a convocação no segundo semestre de 2013 dos prometidos leilões para formidáveis obras de infraestrutura, capazes de elevar a produtividade da economia brasileira. Mas elas só serão executadas com sucesso se entendermos que a teoria dos "leilões" é sofisticada demais para continuar na mão dos amadores que produziram os últimos.
O Brasil precisa desesperadamente de um aumento dos investimentos para voltar a crescer a 5% ao ano, mas eles só voltarão se tratados com justiça. E se, com regras de jogo claras e definitivas, protegermos os investidores nacionais e estrangeiros, garantindo-lhes que se continuará como até aqui, respeitando rigorosamente a estabilidade dos contratos. A falta disso aumentará a erosão da confiança entre o Estado e o investidor privado, que é o pior dos mundos. Nele só navegam com tranquilidade os pescadores de águas turvas...
Antonio Delfim Netto é professor emérito da FEA-USP, ex-ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento.
segunda-feira, 10 de dezembro de 2012
Contração fiscal expansionista?
Por Luiz Fernando de Paula e Manoel Carlos C. Pires - Valor 10/12
O interesse dos economistas sobre o impacto da política fiscal no crescimento econômico foi renovado após a crise financeira internacional. Inicialmente, a discussão sobre a eficácia dos estímulos fiscais resultou em um debate que acabou por levar a uma polarização de posições a favor ou contra tais políticas. Em um segundo momento alguns países iniciaram um processo de consolidação fiscal, resultando em outra controvérsia: alguns defendiam a ideia de que a retirada de estímulos era prematura e que a economia desaceleraria; outros defendiam que a retirada era necessária para não ensejar uma trajetória de insustentabilidade da dívida pública.
A breve recuperação econômica mundial iniciada em 2010 deu vida curta ao primeiro debate, na medida em que a maioria dos países desenvolvidos iniciou um processo de consolidação fiscal. De acordo com as novas evidências, não por coincidência, a atividade econômica voltou a desacelerar, trazendo à tona a inconveniência desse processo.
A ideia de que as contrações fiscais podem ser expansionistas obteve respaldo empírico a partir de uma série de estudos que justificavam esses efeitos a partir da ideia de que uma contração fiscal seria capaz de aumentar a confiança do setor privado e estimular novas decisões de consumo e investimento por meio de um efeito "crowding in" sobre o gasto privado.
Essa linha de pesquisa foi liderada pelo economista Alberto Alesina com outros colaboradores, que identificaram em vários países os momentos de grande consolidação fiscal e correlacionaram esses eventos com a dinâmica do Produto Interno Bruto (PIB) no momento seguinte ao do ajuste fiscal. Os autores encontraram evidências de que os países que praticaram consolidações fiscais expressivas obtiveram melhor desempenho econômico.
O impacto que essa literatura teve na política econômica foi notável. Por exemplo, o novo governo britânico conservador, que tomou posse em 2010, colocou a redução do déficit público como objetivo central da sua política econômica, entendida como fundamental para assegurar a recuperação econômica do país, ao estimular a confiança do setor privado.
Na realidade, o respaldo empírico que essa literatura deu foi bastante frágil. Em primeiro lugar, essa literatura nunca foi além de identificar padrões de correlação ao invés de causalidade. É claramente factível que o crescimento econômico tenha sido responsável pela melhoria dos resultados fiscais. Quando esse tipo de controle é feito, os resultados não respaldam a conclusão da contração fiscal expansionista.
Em segundo lugar, está o problema de omissão de variável relevante: tanto o resultado fiscal quanto o comportamento do PIB podem ter sido influenciados por uma terceira variável omitida. Em matéria de política fiscal esses exemplos são abundantes, como a elevação do preço das commodities, a evolução mais favorável da taxa de câmbio em países exportadores, o relaxamento da política monetária, etc. Quando esses efeitos são considerados, os resultados se alteram, passando as contrações fiscais a produzirem efeitos contracionistas.
A partir desses novos resultados, a literatura tem dado maior atenção aos potenciais efeitos expansionistas da política fiscal, buscando entender em quais situações esse efeito pode ser maximizado.
Existem várias metodologias atualmente que procuram estimar o impacto da política fiscal sobre a atividade econômica. Uma tentativa que tem resultado em multiplicadores elevados é a que busca identificar, a partir de registros históricos, o momento e a magnitude exata de uma expansão fiscal. Ramey, no artigo "Identifying government spending shocks: it's all in the timing", mostra que é importante separar o componente da política fiscal que é antecipado pelos agentes daquele que não é.
Essa distinção ajuda a entender as diferenças entre resultados neoclássicos (próximos a resultados antecipados) e keynesianos (próximos de resultados não antecipados). Assim, buscando identificar os efeitos dos choques de gastos governamentais, realiza sua análise para um período mais longo da economia americana entre 1939 e 2008 e conclui que os multiplicadores situam-se entre 0,6 e 1.
Uma abordagem alternativa é a que utiliza modelos não lineares para identificar o impacto da política fiscal, que passa a variar conforme o estágio do ciclo econômico ou mesmo conforme a regra de política monetária - nesse último caso, se a mesma compensa ou chancela a política fiscal. Auerbach e Gorodnichenko, no artigo "Measuring the output responses to fiscal policy", analisam essa questão para a economia norte-americana no período 1947 e 2009 por meio de um modelo que relaciona o tamanho do multiplicador conforme o ciclo econômico e concluem que o multiplicador fiscal pode variar entre -0,3 e 3,6, sendo maior em períodos de recessão econômica.
Concluindo, as evidências são amplamente favoráveis à adoção de políticas fiscais expansionistas para combater recessões e períodos de baixo crescimento econômico. No entanto, alguns países - como o Reino Unido a partir de 2010 e EUA a partir de 2011 - adotaram a consolidação fiscal com o argumento de que era necessário controlar suas dívidas. Na prática, esses países não tinham graves problemas de financiamento, tendo a contração fiscal sido de fato prematura, o que dificultou a recuperação econômica. Por conta dessas evidências, a situação econômica internacional deverá ser agravada caso a política fiscal americana seja revisada no próximo ano, a fim de provocar a forte contração fiscal que ficou conhecida como "abismo fiscal".
Luiz Fernando de Paula é professor titular da Faculdades de Ciências Econômicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (FCE/UERJ). E-mail: luizfpaula@terra.com.br.
Manoel Carlos de Castro Pires é pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), cedido para a Secretaria Executiva do Ministério da Fazenda. E-mail: manoel.pires@ipea.gov.br.
BC sinaliza mais intervenções no câmbio
Valor 10/12
O mercado começa a segunda-feira à espera de novas intervenções do Banco Central no câmbio. Isso porque a autoridade monetária contactou os bancos "dealer" para realizar pesquisa de demanda por contratos de swap cambial tradicional (que têm o efeito de uma venda de dólar futuro) e contratos de linha de dólares (no qual o BC vende moeda com compromisso de recompra no futuro) no fim do pregão da sexta-feira.
A sinalização ocorreu nos minutos finais da sessão, quando a moeda acelerou a leve alta que marcava para fechar com ganho de 0,58%, a R$ 2,091. A valorização pôs fim à maior sequência de baixas da moeda americana desde o início de agosto, mas não foi suficiente para reverter a desvalorização acumulada na semana, de 1,88%, determinada pelas medidas do governo.
Parte da alta veio de investidores buscando recuperar as perdas da semana, além de outros que tentaram assumir posições mais defensivas antes do fim de semana. "Na sexta-feira o pessoal não gosta de se expor muito, e volta a comprar", disse Reginaldo Siaca, superintendente de câmbio da Advanced Corretora.
Após todas as intervenções da semana passada, a dúvida que paira sobre o mercado é relativa a qual o nível que o governo considera ideal para o dólar. "Que [o câmbio] é administrado, já está dado. A questão é em que nível. Agora, talvez R$ 2,07, R$ 2,08, seja um ponto desejado, mas no ano que vem pode ser mais para os R$ 2,10", disse um operador.
As taxas de juros negociadas na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F) também passaram por ajustes na sexta-feira. Depois de cair entre os pregões de segunda a quinta-feira, em movimento intensificado pela ata do Copom, os contratos recompuseram na última sessão parte do forte recuo que sofreram até a véspera, quando a movimentação foi recorde.
Parte da correção se deveu ao Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), principal referência do Banco Central para conduzir a política de juros, que avançou 0,60% em novembro, acima do teto das estimativas colhidas pelo Valor Data, de 0,52%.
O estrategista para América Latina do BofA Merrill Lynch, David Beker, disse que apesar de incertezas sobre o horizonte inflacionário, não se pode descartar um novo corte dos juros. "Se eventualmente os próximos movimentos de atividade continuarem surpreendendo ou a recuperação não se acentuar, então pode haver um corte. Mas, com as informações que se tem hoje, o mercado parece ter exagerado", diz.
Há gordura no câmbio’, aponta diretor do Banco Central
da Agência Estado
RIO - Há gordura no câmbio, porque o dólar está cotado acima do modelo do Banco Central, de acordo com o diretor de Política Monetária do BC, Aldo Mendes. Embora tenha negado que o governo trabalhe com uma meta cambial, ele declarou que a autoridade monetária e o mercado como um todo trabalham com modelos de referência para a moeda. "Dólar sempre gera um debate muito grande. São muitas as variáveis para explicar o câmbio."
Para garantir liquidez, o BC estaria disposto a atuar por meio do mercado à vista e de derivativos, informou Mendes. "O BC está pronto para garantir a liquidez necessária. Iremos oferecer a moeda que a economia demandar."
Sobre o valor do real diante do dólar, Mendes refutou a ideia de que o BC trabalha para manter as cotações dentro de uma determinada faixa de flutuação, chamada pelo mercado de banda cambial. "A taxa flutua."
Segundo ele, a estratégia é oferecer liquidez para o fim do ano, época em que faltam dólares, por motivos "sazonais", nas palavras do diretor do BC. "Fim de ano é sempre período de baixa liquidez e o BC está preparado para oferecer liquidez. Não faltará dólar", completou.
Na avaliação dele, as reservas internacionais dão segurança para atuar no mercado à vista enquanto uma posição "leve" no mercado de derivativos facilita.
Metas de inflação
O regime de metas de inflação não mudou, "em absoluto". "O regime de metas continua. A ata (da reunião do Comitê de Política Monetária) continua válida. Todo o trabalho de perseguir o centro da meta continua como antes", afirmou Mendes nesta segunda-feira no seminário Reavaliação do Risco Brasil, promovido pelo Centro de Economia Mundial da Fundação Getulio Vargas (FGV), no Rio.
Segundo Mendes, o nível atual da taxa básica de juros, a Selic, é adequado para a convergência da inflação ao centro da meta. O diretor do BC voltou a repetir a ideia de que essa convergência, no entanto, pode se dar de forma "não linear".
Após participar do seminário, afirmou ainda a jornalistas que o governo atua para melhorar as condições de financiamento das empresas. Ele não quis, entretanto, antecipar qualquer nova medida nesse sentido.
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