publicado em 29 de janeiro de 2013 às 13:11
É mais ou menos nosso…
Não me decifraste e estás sendo devorado
por Paulo
Metri*, no Correio da Cidadania
“Cheguei ao poder com grande apoio popular, graças ao discurso de
luta por uma vida melhor para todos, mas também a acordos com os setores mais
retrógrados da nossa sociedade. A ‘Carta aos brasileiros’, enigmática ao
cidadão comum, representou um recado bem entendido pela elite. Depois de três
tentativas frustradas para chegar à presidência, apreendi que as mudanças no
Brasil, país com a mídia dominada, têm que ser parcimoniosas. Quase como tendo
que haver consentimentos dos que dominam a sociedade.”
“Nunca fui um revolucionário por várias razões. Em primeiro lugar,
porque minha natureza é a de um negociador e nunca foi a de um guerreiro, na
acepção primeira da palavra. Em seguida, porque o povo, com o presente grau de
percepção, não quer uma revolução. Creio até que, mesmo com alto grau de
compreensão do mundo, ele também não irá querer. Finalmente, não pode ser
esquecido que muitos dos revolucionários têm morte prematura.”
“Contudo, mesmo reformista, orgulho-me em dizer que, durante meu
governo, persegui à risca meu discurso de campanha e trouxe uma vida melhor
para dezenas de milhões de irmãos. No que era básico para mim, não fraquejei em
nenhum instante. Sei que tive erros, praticados consciente ou
involuntariamente. Quando errei conscientemente, tenham certeza que estava
cedendo a alguma pressão que, se negada, poderia fazer fracassar, por exemplo,
todo o projeto de inclusão social em curso.”
“Troquei opções sem correlação alguma, mas que o momento as
transformava em moedas de troca. Sem corresponder à realidade, só para ajudar o
entendimento, me deparava com dilemas do tipo: receber apoio da bancada secreta
e poderosa dos banqueiros a uma política externa independente em troca do
atendimento aos interesses pecuniários deles. A capacidade de mobilização deles
no Congresso só é comparável à da bancada ruralista. Assim, reconheço que
existiram setores cujos desempenhos deixaram a desejar. Não avancei muito na
reforma agrária, por exemplo, o que me deixa frustrado.”
“Aprendi com muitos dos que estavam ao meu lado, mas o ministro
das Relações Exteriores do meu governo tem um crédito especial comigo.
Resumiria o que aprendi com ele, desta forma: ‘não se é grande em nível
internacional, se não se imagina grande, não se planeja para ser grande e não
se age de forma grandiosa’. Hoje, creio que abri muito a guarda na entrega do
petróleo nacional, a menos de quando retirei 41 blocos do Pré-sal da nona
rodada. Falo das rodadas de leilões do nosso petróleo. Segundo o ensinamento
aprendido, entregar petróleo sem quase nenhum usufruto para a sociedade não
corresponde a ‘agir de forma grandiosa’. Mas, só fiquei consciente deste fato
quando o término do meu governo estava próximo.”
“Têm instantes que tenho vontade de dizer à minha sucessora: ‘Não
faça isto!’ Digo isso com relação à décima primeira rodada, que foi
recentemente aprovada por ela. Ainda mais que querem agora ofertar, também
nesta rodada, além dos blocos inicialmente previstos, aqueles oriundos da
fracassada oitava rodada. O objetivo escamoteado é diminuir por asfixia
financeira a participação da Petrobras nas futuras concessões. Assim, mais
blocos serão destinados às empresas estrangeiras ainda sob a lei socialmente
incorreta no 9.478. Bem que os petroleiros sempre disseram que o Brasil não
precisa ter pressa para produzir petróleo, pois a Petrobras já garante seu
abastecimento por mais de 40 anos. Porém, não falo com minha sucessora, pois,
afinal de contas, o governo é dela.”
“Por isso, acusam, com certo grau de razão, que meu partido e eu
somos pouco conscientes com relação à questão nacional. Sem ser xenófobo, hoje,
creio que há necessidade de se privilegiar a exploração das riquezas nacionais
da forma que mais beneficia a nossa sociedade, o que ocorre em geral com
empresas genuinamente nacionais. Enfim, ninguém está completamente pronto para
ser presidente.”
“Entretanto, a recuperação dos salários, o aumento do número de
pessoas empregadas, a ampliação e o acréscimo do valor do Bolsa-Família, o
aumento do número de universidades públicas, a ampliação das vagas disponíveis
nas existentes e o Pro-Uni são algumas das realizações das quais me orgulho.
Enfim, durmo tranquilo. Fiz tudo que queria e podia fazer e, muitas vezes, tive
que criar com esforço condições para as coisas boas acontecerem.”
“Se vocês tivessem entendido tudo isso e dado mais apoio político
a mim ou a qualquer outro governante socialmente comprometido, mais poderia ter
sido conquistado. A verdade é que quem lhes devora não sou eu, contrariando o
enigma da esfinge. São os cartéis, inclusive muitos estrangeiros, que ainda não
foram enquadrados. Estão soltos porque não há reação de vocês. Contudo, sei
que, com a atual mídia controlada pelo capital, fica difícil o povo tornar-se
consciente. A menos que, aos poucos, ele migre para canais de informação mais
honestos.”
Neste ponto, acordei da minha divagação, na qual buscava
explicações racionais, ou seja, buscava decifrar.
*Conselheiro do Clube de Engenharia
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